Tens os olhos mais doces. Ainda que escondidos ao dormir,
vêem-se doces do outro lado das pálpebras. À minha volta, tuas mãos despem-me e
despimo-nos o desejo e beijamos as juras que sabemos. Dou-te a minha almofada e
roubas-me o lençol, aqueces-te em mim. Só não tenho frio por causa dos teus
olhos doces. Num beijo partilhas a cama toda, adormeço.
digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.
quarta-feira, janeiro 30, 2013
A odalisca calada, pela calada
Quando te vejo sonho em que nunca ninguém me quis tanto
dizendo não querer com a boca e querendo com os olhos. Ainda que os lábios não
digam palavras, o teu peito chama por mim. Vou onde me mandares e estarei
enquanto não adormeceres.
Odalisca acordando
Acorda. Estou há tempo demais a contemplar a beleza
descuidada. Temo que sofras por me veres. Sei que é falso pudor, porque há
muito despertaste. E despertando assim despertas-me a vontade de a teu lado
dormir.
sábado, janeiro 26, 2013
quinta-feira, janeiro 24, 2013
Que não se lembre
Não tenho como ver o que não quero ver. Sei que não sei se
deva ter o que não sei se há. Por retórica olho para baixo para ver o céu e
espero que Deus não me veja. Espero que Deus não se lembre. Julgo que Deus se
esqueceu. Quer sair e que se me virem pensem que não os vi. Quero ser autista
se não puder estar morto.
Atrás dos tempos vêm tempos e nada de bom há-de vir
Nos locais deslumbre, as conversas importantes. As linhas
impressas, as salas do fumo. O vinho e o uísque. Frente à secretária, ao
telefone. Pensando que não partiria. Que se partisse não voltava. Uma bicicleta
só de subir e o amor. Muito amor que era sexo e um amor que era cego. Tudo o
que poderia ter sido.
.
Já me ri de fumar. Já me arrependi. Já dei graças a Deus. Já
me esqueci de dar. O que julgava saber e o que não sabia que não sabia. Depois de
adivinhar o futuro nas mãos li a vida nas cartas. Nunca me cheguei a
arrepender. Nem o medo. Tudo o que fui.
.
Andei à chuva em dias de sol. Abriguei-me em solidão junto
ao mar, e não fui. Sepultei-me e ressuscitei morto. Chorei de amor e chorei de
mim. Desejei ser canalha. Quis uma vida banal. Renasci sonhos grandes. Bati com
os dentes na realidade. Deitei-me atrasado. Dormi adiantado e eterno. Desejei apenas
dormir. Tudo o que tenho sido.
.
Se o amor não falta, sobra a dor rija. Não levo a vida para
frente. Não volto atrás. Peço que a parede não me esmague devagar. Volto aos
locais antigos. Como nunca soubesse que haveria de voltar. Ainda não sei se
quero. Recordo as músicas e evoco as noites. Evoco caras. Choro as esperanças e
angustio-me nas desilusões. Batem-me na memória frases dolorosas e coisas de
que me envergonho. Tudo o que sou.
.
Atrás dos tempos vêm tempos. Da tristeza à esperança. Da
desesperança nada sobra para andar. De joelhos inconformado, impotente, quase
morto. O que tenho de ser.
quarta-feira, janeiro 23, 2013
O Chuqui e elas
O refilão cá de casa… o que se julga grande, mas só pesa
sete quilos, que se atira a pastores-alemães… esse que ladra a todos, com o
rabo a dar, para brincar… que adivinha quando vão tocar à campainha na porta da
rua… o saco das pulgas… hoje olhava vivaço para a Lioz, mais alta dois palmos. Ela
recolheu as orelhas, como um caça supersónico. Ele baixou-se das pernas, fez um
ar infeliz e soltou um leve e envergonhado ganido, partindo-se dali. Ele manda
em casa, mas já percebeu que um gato é um gato.
Abracadabra
Abracadabra. Abre as pernas, minha cabra. Nada como dizer
buceta, que todos acorrem à procura de ninfeta. E se escrever cona, não se
espera que seja matrona. Certo é sabido que cona e buceta abrem mais portas que
abracadabra.
Vem cá, vem
Quero-te a vida toda. Não disse: quero-te para a
vida toda. Se for drácula, é o mesmo… ora, chega aqui o pescoço, se fazes favor.
Fogo-preso
Tens aí um beijo preste a cair e não me pedes para o
apanhar. Prestes a despenhar-se e eu sem o poder salvar.
.
Tiro-te a roupa como quem dá um beijo. Mãos quentes em pele
fria de corpo em brasa. O peito erguido, a colina do ventre, o vale das pernas
e o cofre do tesouro, onde aromas férreos, de caramelo e sal, sobressaltam como
uma fonte.
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Sim, as mãos. Que pegam e quase saciam. A boca que fica
perto do clímax. As mãos que se dão nas mãos, o ventre com ventre. O homem
dentro da mulher.
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Sonho com a tua almofada e com silêncios de palavras de
arrependimento e fúria de cair novamente no abismo do prazer.
.
Não partilho a cama, partilho o corpo. Quero-me em ti e que
me dês a tua humidade. Dou-te calor e dás-me sussurros.
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Quero-te já. Com mãos, boca e revelação. Dentro de ti. Adormecer,
ir e voltar.
domingo, janeiro 20, 2013
Tu, que estás lá no alto, divindade
Deita-me o abraço, porque é escada para a tua altura. Beija-me,
porque é foguetão para a tua alma. Vem-te, porque é luz no meu coração. Dou-te
tudo, porque te dás. Deitas-te a meu lado e dizes boa noite. É até já, porque acordados
ou longe, juntos ou dormindo, estamos e estando, estamos mais. E por tudo,
beijos e promessas. Certezas.
Gostava
Gostava de te ver nua. Que as minhas palavras escritas te
despissem. Que os teus dedos te amassem. Que a tua boca me chamasse. Que as
minhas palavras ditas te abrissem. Que a tua boca me amasse e a minha também
beijasse.
.
Gostava de te descobrir e a ti
voltar e não me perder. Que te não perdesses, mas quisesses. Que desses de
beber às minhas frases. Que as minhas mãos te lavrassem. Que a tua árvore me
desse a maçã de Eva e Adão. Que o teu suor se juntasse ao meu.
.
Gostava de me explodir em ti. E tu te iluminasses comigo.
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Gostava que fosse já. Gostava que fosse proibido para nos transgredirmos.
Que uma noite fosse a primeira e outra a última. Que fosse sempre despedida. Que
estivesses sempre despida. E eu amante capaz.
.
Gostava de tremer as mãos. Que as tuas seguras me tremessem.
Que as línguas conversassem pelos corpos. Que me acolhesses. Para explodir em
ti e te dares comigo.
sábado, janeiro 19, 2013
Ascendente no décimo terceiro signo do zodíaco
Quero agora. Porque agora o zodíaco está com alguma coisa no
apogeu e um planeta em retrógrado. Agora, porque vejo no céu a mulher. Talvez a
que sempre quis, nua e em mentira distraída.
.
Agora que a luz abafa as estrelas. Nem assim o zodíaco diz
outra coisa.
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Quendera ter a sorte q‘uma escada que me ascendesse. Que um
ufo me subisse. Que ela lá estivesse e me esperasse. Que quisesse o meu desejo.
.
Corpo concentrado. Essência de abraço e suor destilado. À frente
de todos, escondidos nas nebulosas. Eu e a deusa da fantasia e do desejo.
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Depois, espreguiçados na Via Láctea, imprudentes deixando
verter o lençol, sugerindo ao mundo o que se passou.
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Envergonhada, dissipada. Abandonado e sem transporte.
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Está escrito nas estrelas que um dia.
Como se fosse um filme
Acordei com vontade que algo acontecesse. Que o vento
trouxesse a mulher invisível que também transpusesse o vidro e, numa operação
relâmpago, tomasse conta do meu corpo e abusasse da minha boca.
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Acordei. Finalmente e com uma saudade prenhe de qualquer coisa
que não quero dizer com todas as letras. Suspiro profundo e quente.
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Por mim, o frio está bem. O que mais quero é a noite e a
cama e não a manhã. O segredo de coisas importantes sem espessura.
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Conhecer a pele e a boca. Segredar coisas sem importância e
não ficar até ser luz.
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Luz-penumbra que não revela toda a beleza. Brevidade de amor
que, não sendo a amor, lhe toma a vez. Por minutos de intenso calor e loucura.
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Mais do que lençóis amarfanhados, uma noite incerta. Memorável
pela incerteza dum regresso.
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Acordei e sonhei. Agora não consigo tirar da cabeça quem não
entra no corpo. Saudade de qualquer coisa que não sei.
sexta-feira, janeiro 18, 2013
O pinot noir de João Barbosa
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Entrevistei (profissionalmente) o meu homónimo dos vinhos
Ninfa e Lapa dos Gaivões. Estava marcado nas estrelas que «João» e «Barbosa»
quando se juntam dão pessoas fantásticas. Ele e eu (!!!) somos pessoas
fantásticas… eu, principalmente sou belo e gracioso, apesar dos cento e alguns
quilos. Além do mais, sou do Belenenses!
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Contei-lhe que um dia hei-de fazer um vinho: lote de baga,
ramisco e touriga franca. Ainda lhe disse que ia ter um problema com ele, por
causa da marca, mas João Barbosa continuou simpático. Bolas!
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Brincadeira à parte, o senhor é uma simpatia e atenciosidade
(existe?) que cativam. Como escrevi e disse (é feio fazer autocitações, mas eu
posso) muitas vezes, a paixão, trabalho e empenho traduzem-se no final. O amor
que damos reverte. É a lei do retorno…
quem faz com pouco gosto nunca fará bem feito. É por isso que a comida
das mães é sempre a melhor do mundo…
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Ora, seis vezes três: dezoito… vinho do Tejo? Pois, não é o que
se pensa quando se fala em grandes vinhos, ainda que se saiba que a qualidade
cresceu muito de há uns (poucos) anos a esta parte.
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Grandes vinhos? João Barbosa tem vinhos de qualidade
inquestionável, mas tem um que é absolutamente fora de série… fora do sério. Vim
do Alto da Serra (Rio Maior) excitadíssimo para escrever este texto. Há muito
tempo que não me comovia assim e poucas foram as vezes em que me empolguei desta maneira.
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O vinho ainda não está engarrafado e só será descoberto
daqui por uns meses. Entretanto, João Barbosa deu-mo a provar. Fantástico! Ou fazendo
um trocadilho com as línguas portuguesa e inglesa: funtástico!
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Trata-se dum pinot noir como haverá poucos, quiçá nenhum, em
Portugal. Tem cor de pinot noir e é elegante como um bom Borgonha. Suave e
macio; não é veludo, é seda. Seda, mesmo. Uma acidez de ressuscitar. Um ataque
de coração pelo melhor. Emoção, vida, personalidade e carácter. Um vinho único,
que um enófilo tem de provar.
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A colheita é de 2011 e, como só acontece com os grandes vinhos,
tem séculos pela frente. E irá em crescendo. Dez anos? Espero voltar a ele
dentro de dez, vinte e trinta anos. Um colosso!
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Desculpem-me tantos elogios, mas estou nervoso de contente. Ganda
pinta de vinho!
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Tenho, no livrinho do coração, alguns vinhos portugueses que
me conquistam ano após ano, os meus Grand Cru, que não dispenso e que ponho as
mãos no fogo pela sua qualidade. Quero bebê-los até morrer e a eles voltar na
próxima encarnação: Quinta do Vale Meão, Quinta de Foz de Arouce Vinhas Velhas
de Santa Maria e Cavalo Maluco, nos tintos, e Maritávora Grande
Reserva Branco.
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O meu pensar do que quem faz por gosto, ou quem acarinha o
que é seu, sangra amor e deleite é válido para Francisco Olazabal, conde de Foz
de Arouce, José Mota Capitão e Manuel Gomes Mota… além dos respectivos enólogos
(Francisco Olazabal, João Portugal Ramos, Paulo Laureano/Mota Capitão e Jorge
Serôdio Borges), penso eu (de que, como terá dito aqueloutro senhor do Porto).
Isso mesmo se pode dizer de João Barbosa e do alquimista júnior, que já não é
nenhuma promessa, Pedro Pereira Gonçalves… o tal que, quando estava em Vale d’Algares,
me prometeu uma prova cega de tintos…
.
Bem, dessas minhas referências portuguesas de eleição
nenhuma leva nota abaixo de nove… sendo que (já me cansa escrever isto tantas
vezes) a classificação não é nem óbvia nem proporcional… o três é positivo e
não é nem metade, nem um terço nem um quarto de quatro… é três. E o dez é uma
nota aberta, que vai do dez até ao infinito antes de onze.
.
Este pinot noir de 2011, que João Barbosa irá um dia mostrar
ao mundo, terá, pelo menos, um nove. E tenho quase a certeza que assim será
para sempre. Como o amor.
terça-feira, janeiro 15, 2013
Da janela
O cinzento-lilás do céu e o verde-clorofila da placa
luminosa do hotel. A janela sobre a rua de carros e o frio que nela embate.
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Sim, o coração salta e o tédio anseia o que não quer para
amanhã; acordar cedo para trabalhar. Pudesse o tédio ser ócio e a vida só
abundância.
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Habituado a uma rua de bairro, vivo junto ao movimento
constante acelerado, numa rua quase suburbana e no centro. O que gostava mais
na outra casa era o bairro. Neste bairro gosto mais da casa.
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Neste Inverno: Madeira doce. Tão desejável que não me
imagino a beber outra coisa no Verão. Figo seco, amêndoa, noz, caramelizado,
finíssima canela e um fio quase invisível de pimenta preta. Digo: Há algo mais
maravilhoso do que um Madeira doce?
.
As gatas, feridas no mimo, e o cão, que às vezes se julga
gato, tem ciúmes das irmãs felinas. Já lhes ladra menos, mas elas sopram-lhe. Hão
de se dar bem. Que assim seja! Que Deus o queira! E que haja sempre Madeira
doce.
.
Por baixo do quarto há um vizinho que ressona fragante. O que
diriam os de cima se dormissem sobre o meu quarto. Esses, doutores em
palermice, acordam e deitam-se e nada mais fazem do que existir, entre a
imbecilidade, a mediocridade e a imbecilidade.
.
Quero ver o céu no Verão. Se ainda aqui estiver e com o
coração apertado de afecto e descoberta. Se não estiver, que tenha o peito como
agora.
.
Por agora contemplo o céu cinzento-lilás e acalmo-me e
contenho-me, para que tome um outro cálice de Madeira doce.
quarta-feira, janeiro 02, 2013
terça-feira, janeiro 01, 2013
(suspiro)
Partilho-te o sonho e durmo-te. Ainda hoje acordo ensonhado
para te ver ao lado, para acreditar. Ainda mais: o abraço e o beijo. Tu,
delicada, com turquês, tenaz e ferro em brasa arrancas-me a dor de burro do
coração, cauterizas e deixas viver.
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Quando me afogo, são os teus beijos que me acordam. A pele
das tuas mãos que me sacia a carne. A fina película da boca que me injecta luz.
.
Não te posso falhar.
Promessa
Não posso falhar. No primeiro dia da vida. Ainda que só a
queda me alegre o pensamento e me dê alma à alma.
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