digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.
segunda-feira, janeiro 31, 2011
domingo, janeiro 23, 2011
Há demasiados mortos nesta vida
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Esta notícia faz-me lembrar o azul profundo duma solidão. O momento preciso do desprendimento. O espírito desagarrado do corpo. A morte, se assim se quiser.
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Não há tempo para palavras tristes. Não é preciso ter-se um coração para que este se sinta apertado e minguado. Rezando para que os pés não doam demasiado pelo caminho.
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Se a tristeza não se vai, que nos apartemos nós dela. Abandoná-la onde faz sofrer. Poça de sangue que mais ninguém vê.
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Quando estocas e feres, é o teu sangue que se derrama. Quando matas, morres. Morres-te devagar, aos bocadinhos, com o peso de toda a memória. Ainda que a consciência te alivie. Delinquente inocente.
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Os homens grandes não precisam de monumentos. A verdade é toda e toda exige que se o diga: todos os homens nascem iguais. Preciso de palavras de circunstância no meu velório.
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Os homens grandes não precisam de monumentos. Desejo, em ânsia, os aplausos, as intimidades gloriosas e um tocante discurso de abalada.
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No fim de tudo, só o amor primeiro e o amor maior. Todos os outros não são bem coisa alguma. Inspiração e desejo. O que fica?
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Cuidava que os poetas podiam matar as musas e renasciam fortalecidos no desgosto de não falecerem por elas. Que viviam felizes ou infelizes. Que viviam.
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Cuidava que a musa nunca mataria. Com o feitiço suficiente para o cantor se cortar, desperdiçando-se em letras rubras de odor férreo. Por suicídio ou surpresa por se saber morrer, com um sopro da musa.
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Desamando, ela, com um pranto. Pode viver-se sem um coração, mas não com uma consciência leve. Não com um manto de veludo negro na memória.
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Baixada a cortina sobre o amor prometido em sacrifício de viver infeliz. Tragédia sanguinária em que todos morrem. Quendera uma cova para repousar o corpo. Todos os amores acabam mal, está na lei moderna. Até os que nunca começaram. Está na lei suprema.
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A notícia faz-me lembrar o azul profundo duma solidão. A vida recomeça adiante.
terça-feira, janeiro 18, 2011
segunda-feira, janeiro 17, 2011
A musa ressuscitada
Vejo-te, flor. Sinto-te menina e sei-te mulher. Vejo-te imaginando, nua num canapé com uma cidade por trás. As janelas são para se abrirem. Pela tua entra a música das ruas e a luz que o céu permite. Por ela saem os meus olhos, envergonhados por, tão descaradamente, gozarem a tua beleza.
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Vivo-te doentiamente. Invisível a teus olhos. Invisível também para me dissimular no teu quarto para me deliciar quando te despes. Sofro por te ver amada e amante. Vejo-te tão ignorante de mim.
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Não fosse invisível veria as minhas mãos nos teus quadris. Nos teus seios e no teu rosto. Afastando os cabelos suados enquanto mordisco e mordiscas alternadamente com o soar das almas a sair das bocas.
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Em que cidade vives? Nunca saio. Talvez por isso não me leves a sério. Nem me vejas. Ou, pior, não me leves a sério.
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Sou tonto. Acredito no acreditável, menos crível que os zombies baterem à porta doutro defunto. Defunto, sou eu, que escondi o coração em Edimburgo. Eu, que nem vivo, nem sou credível. Tão tonto como inacreditável.
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Se é Lisboa, a janela abre-se às ruas populares. Qualquer outra é desilusão e sofrimento. O meu coração abandonado sente, lá longe em Edimburgo, uma saudade do que não deve, não pode, porque não sabe.
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Sim, flor-menina-mulher… sei-te triste comigo e não por ser invisível ou apaixonado, ainda que inacreditável. Noto-te na voz o cansaço da minha tristeza e pelo ridículo de todos os disparates que digo e escrevo.
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Ainda assim vivo escondido no espelho do teu espelho, donde te vejo desnuda e amante doutro amante. Ciúmes? Não. Tristeza por não me veres. Por não me mostrar e apenas soar.
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Coragem só na voz. No corpo a morte, vagarosa, como poeta, um desespero incontável e ignorância.
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As musas não matam os poetas. Os poetas é que morrem tristes frente às musas.
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Escondido num espelho desconheces-me sabendo-me. Dentro do espelho escondido vejo o reflexo da luz do esconderijo, plano insensível, impronunciável e morto diante da tua beleza e nudez.
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No escuro sei-te. Amante e amada. Desfaleço sem ciúme, mas desesperançado. Os poetas não matam as musas. Deixam-nas cair, quebrando-se. A minha partiu-se e, estupidamente, tento cola-la. Do lado dela a mesma insensibilidade. A mesma falta de crença. Que nunca perca o sorriso que me ata. Que nunca perca de vista a flor-menina-mulher.
sexta-feira, janeiro 14, 2011
A mão além do corpo aquém
A mão além, do corpo aquém. Respiração visível, como plasma. Não vapor no frio, mas como plasma. Como um fantasma.
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Não tenho dúvidas que flutuo sobre o corpo deitado. Vestido sobre a cama. Olhos abertos de pálpebras em descanso.
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Há um espaço entre as orelhas e os sons da rua. Uma parede de ar.
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Dentro, dia. Fora, noite. Minutos depois, o inverso. Difícil sincronia.
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O corpo ergue-se. Como que se a alma estivesse fora do corpo. Por cima, observa. Visão em três linhas, horizontais e paralelas. Entre cada uma, um espaço sem concreto. Todas límpidas e claras, precisas, bem definidas e inconfundíveis. E sobre o corpo, a observação.
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Três horizontes. Indiferente à temperatura, a mão além projecta-se fora da janela. A dúvida. Entre a vida e a morte. A certeza da vida, a dúvida da vida.
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Por momentos, os olhos outra vez fechados crêem poder alcançar qualquer coisa. A mão além vai, ainda que os olhos se tenham fechado, por insuportável trivisão. Além da observação sobrevoada, consciente do que é e donde está. Acima duma realidade tangível.
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A mão além tenta despertar o corpo que se voltou a deitar. A angústia.
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Afinal quase tudo é angústia. No sono. No sono depois do sono. No sono que se força. No sonho no sono. Do sonho entre sonos. O tempo em que não se dorme. Sempre a angústia.
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É um peso. A mão estrafoga, a angústia. A mão, além, tenta fugir. De matar, e do local do seu crime. A mão além, na dúvida. A alma vigia o corpo deitado.
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Cobardias da mão e da alma. O corpo em angústia, entre viver e o contrário, em dúvida. Triste.
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A mão além recolhe-se num receio. A visão que flutuava escondeu-se atrás da consciência. A respiração desplasmou-se. Os olhos despertaram. O corpo levantou-se. A mesma angústia e a dúvida, de viver e de não viver.
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Até um dia. Um dia novo de certezas. A angústia vai dormir. Enquanto se não dorme, a angústia pausa-se. Tocaram a campainha e a porta abre-se. A angústia foi dormir. A angústia voltará.
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Não tenho dúvidas que flutuo sobre o corpo deitado. Vestido sobre a cama. Olhos abertos de pálpebras em descanso.
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Há um espaço entre as orelhas e os sons da rua. Uma parede de ar.
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Dentro, dia. Fora, noite. Minutos depois, o inverso. Difícil sincronia.
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O corpo ergue-se. Como que se a alma estivesse fora do corpo. Por cima, observa. Visão em três linhas, horizontais e paralelas. Entre cada uma, um espaço sem concreto. Todas límpidas e claras, precisas, bem definidas e inconfundíveis. E sobre o corpo, a observação.
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Três horizontes. Indiferente à temperatura, a mão além projecta-se fora da janela. A dúvida. Entre a vida e a morte. A certeza da vida, a dúvida da vida.
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Por momentos, os olhos outra vez fechados crêem poder alcançar qualquer coisa. A mão além vai, ainda que os olhos se tenham fechado, por insuportável trivisão. Além da observação sobrevoada, consciente do que é e donde está. Acima duma realidade tangível.
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A mão além tenta despertar o corpo que se voltou a deitar. A angústia.
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Afinal quase tudo é angústia. No sono. No sono depois do sono. No sono que se força. No sonho no sono. Do sonho entre sonos. O tempo em que não se dorme. Sempre a angústia.
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É um peso. A mão estrafoga, a angústia. A mão, além, tenta fugir. De matar, e do local do seu crime. A mão além, na dúvida. A alma vigia o corpo deitado.
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Cobardias da mão e da alma. O corpo em angústia, entre viver e o contrário, em dúvida. Triste.
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A mão além recolhe-se num receio. A visão que flutuava escondeu-se atrás da consciência. A respiração desplasmou-se. Os olhos despertaram. O corpo levantou-se. A mesma angústia e a dúvida, de viver e de não viver.
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Até um dia. Um dia novo de certezas. A angústia vai dormir. Enquanto se não dorme, a angústia pausa-se. Tocaram a campainha e a porta abre-se. A angústia foi dormir. A angústia voltará.
terça-feira, janeiro 11, 2011
O fim a chegar
Não tenho dedos para te dar tanta ternura. Mereces que te trate como viola e te dedilhe até cantares prazeres.
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Deitados em lençóis amassados, lado a lado. Deitados e em palavras, em voz densa, mergulhados. Mergulhados num lago de intimidade e afecto.
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Não há horas para tantas palavras. Não há horas para tudo o que se deve fazer na cama. As noites são breves, o resto das horas são sono.
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Não há tempo para as perdas, que os dias correm e amanhecem muito cedo uns anos à frente.
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Mesmo sem o corpo entrar no corpo, o braço estendido sobre o outro afunda-se. Mesmo sem loucura, os cabelos entrançam-se nos dedos da parelha.
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A densa respiração engana. Não é a profundidade do desejo que exala, mas a do sono.
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Horas perdidas. Tempo que se desperdiça e sem pensar.
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Eu sem dedos para te dedilhar. Porque adormecendo. Tu e eles. Só as preocupações despertam. A monotonia é o que resta dum dia, semana, mês de trabalho.
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O fim não tarda.
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Deitados em lençóis amassados, lado a lado. Deitados e em palavras, em voz densa, mergulhados. Mergulhados num lago de intimidade e afecto.
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Não há horas para tantas palavras. Não há horas para tudo o que se deve fazer na cama. As noites são breves, o resto das horas são sono.
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Não há tempo para as perdas, que os dias correm e amanhecem muito cedo uns anos à frente.
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Mesmo sem o corpo entrar no corpo, o braço estendido sobre o outro afunda-se. Mesmo sem loucura, os cabelos entrançam-se nos dedos da parelha.
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A densa respiração engana. Não é a profundidade do desejo que exala, mas a do sono.
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Horas perdidas. Tempo que se desperdiça e sem pensar.
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Eu sem dedos para te dedilhar. Porque adormecendo. Tu e eles. Só as preocupações despertam. A monotonia é o que resta dum dia, semana, mês de trabalho.
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O fim não tarda.
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