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Depois de dois anos a estudar artes, no secundário, mudei-me para humanidades. Fora das aulas escrevia, desenhava e fotografava. Comecei no Diário Económico, em Janeiro de 1990, e jornalismo tornou-se a árvore que sorve toda a água da floresta.
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Cansado do quase ócio na escrita profissional – embora não duvide do meu talento criativo e estilístico nem da competência – pensei que voltar ao estirador pode ser uma opção profissional complementar séria e desanuviador da mente. Nas palavras sou João Barbosa, nas artes João 25.
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Em 2022 soube do concurso Luxembourg Art Prize e concorri. Recuperar totalmente a mão direita, a outra não tem remendo porque foi sempre nula, levou algum tempo. Por isso, a quantidade de obras foi pequena e não me senti confiante nos trabalhos mais recentes.
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Senti uma coisa, uma sensação muito íntima, distante há mais de trinta anos: o prazer de pensar, conceber e fazer. Daí para cá, tenho o sentimento juvenil, do tempo um pouco antes da primeira namorada até à entrada no jornalismo. Uma felicidade de libertação.
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Na minha primeira candidatura ao Louxembourg Art Prize apresentei três desenhos e duas pinturas, a mais antiga de 1987 e a mais recente de 2008. Prometi-me, consciente que cumpriria, repetir no ano seguinte. Decisão reforçada por me ter sido concedido reconhecimento de mérito artístico.
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No ano seguinte, ainda com algumas inseguranças, concorri ao Louxembourg Art Prize com nove desenhos e quarenta e três fotografias. Os rabiscos datam de 2023, mas as fotos foram antigas, a mais velha reportando a 1987. Novamente, recebi a distinção de mérito artístico.
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Pensei em apostar mais na fotografia, quase jurei. Comprei rolos para as duas Canon e para a Rolleiflex, mas não correu como desejava. Foram muito poucas e, mais dum ano depois, ainda não as mandei revelar. Juntei um conjunto de inseguranças – confusões técnicas, dioptrias, receio em riscar os óculos e sensação de que uma das câmaras está com problemas.
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A segurança viria, teoricamente, com uma câmara digital. Porém, não tenho dinheiro, nem disponibilidade mental, para comprar. A isso acresce a incerteza de que quero realmente fotografar e de ter tempo, porque continuo a escrever, não deixei o jornalismo. A liberdade juvenil passou, estou na meia-idade e vejo o mundo diferentemente.
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Voltei claramente aos desenhos, ainda que tenha pintado alguma coisa. O número de obras de traço chegou às dezenas e preenchi dois cadernos. Esses livros permitiram-me ocupar a cabeça, estimular o pensamento e exercitar a mão direita.
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No momento em que escrevo, apresentei a concurso Luxembourg Art Prize uma pintura e oitenta e três desenhos. Hesito em entregar mais ou poupar alguma coisa para o ano. Entalada na indecisão está uma obra digital que publiquei aqui. https://infotocopiavel.blogspot.com/2024/01/pergunta.html
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O processo de candidatura é monótono e trabalhoso, mas vale-me a empolgação. Sem câmara digital de qualidade, sem scanner e receoso de que a digitalização em loja possa amolgar o papel, fotografei os trabalhos com o telemóvel.
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A qualidade dos registos fotográficos é fraca: não consegui rectângulos perfeitos – é o problema maior porque distorce –, a focagem é incerta e a luz pode atrapalhar. Por isso, repeti imensamente. Além dessa trabalheira houve o aborrecimento da escolha dos trabalhos. Finalmente introduzir os dados… ano, título, género, técnica, dimensões e descrição.
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Já que fotografei todos os trabalhos, resolvi fazer o mesmo com os cadernos de desenho. Esses livrinhos, através da datação, atestam os anos em que andei distante do estirador e do cavalete.
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O meu pai dizia que desenho como respiro. É verdade: um papel e um lápis ou caneta obrigam-me a rabiscar compulsivamente, uma espécie de vício. Sempre foi assim. Porém, uma coisa são uns bonecos e outra é trabalhar com objectivo.
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Antes dos dois cadernos recentemente preenchidos, tive um primeiro álbum em 1991 e que só o terminei em 2016. O segundo foi preenchido em 2023, tinha apenas um desenho feito em 1993. Comecei o terceiro no ano passado e terminei-o há poucos meses. O quarto está fazendo-se.
Há um outro elemento que traduz o meu afastamento das artes visuais: o género. Gosto muito de heráldica e teimosamente desenho brasões, parafernália acompanhante e mais umas coisinhas. Sinceramente, não me dá grande trabalho… é rápido e graficamente simples de colorir sem tinta.
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Comecei um armorial. Todos os meus amigos e pessoas por quem tenho estima receberam um brasão particular. Há uma regra de ouro: não pode existir qualquer relação com armas familiares existentes.
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Esse primeiro caderno está ocupado sobretudo com heráldica. Muito do que lá está nem foi criado por mim, há igualmente desenhos de registo, como, por exemplo, do «emblema» da Baviera – faço recolha de heráldica de domínio e a tarefa é trabalhosa, basta dizer que o Sacro Império Romano-Germânico era formado, em 1806, por mais de quatrocentos «países».
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Os meus desenhos heráldicos iniciais eram conservadores, embora com liberdades. Fartei-me da ortodoxia despreocupada e criei um formato único. Reconheço que o escudo e o ordenamento são muito feios e demasiadamente-extremamente-inacreditavelmente heterodoxos. Um dia terei paciência para redesenhar em papel, por agora estou quieto nesse assunto, ocupo-me com o trabalho profissional.
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A minha imaginação e a necessidade de matar o tédio foram maiores do que o número de amigos. Assim, os mais chegados receberam vários novos desenhos, formando armas complexas.
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Destravado, continuei criando e cheguei a um momento em que tive de trazer ao mundo dos vivos uns países imaginários. Vim a descobrir que não sou o único biruta e aprendi a palavra geoficção.
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E, basicamente, é isto que quis partilhar.
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