digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

sábado, junho 30, 2018

Só alguns amores são eternos


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Há amores tão grandes que nenhuma inveja alcança. Um frio e um quente dos abraços indizíveis e dos beijos, que de tão inesquecíveis, se esquecem, dando às suas bocas o jeito de repetir até ao adormecer e ao acordar.
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A felicidade é um lugar. Aí, tenho-a e perco-a para a conquistar.
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– Quantas mulheres pode amar um homem?
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– Ao mesmo tempo? Numa só vida?
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– O meu amor é tudo. Não são as duas a mesma coisa? Se o tempo é infinito e o universo não pára de crescer.
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– Cada amor novo não é o último e o maior?
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– Se assim fosse, que tristeza.
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– Não. Há o amor-todo, sem hora nem segundos.
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– Eterno?
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– Não sei. Ainda não fui eterno. Sendo todos eternos, negando a morte.
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– Amas assim?
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– Amo. Não há outra forma de amar, se a felicidade se junta à alegria e todas as lágrimas são de contentamento.
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– Quantas mulheres pode amar um homem?
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– Quando se ama assim, como eu, só uma. Nem conceito se alevanta.

Essa onda só tua


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Amo e amarei a mulher certa. Como um maremoto, sinto a altura e o sal, daí cair e mergulhar, respirando no beijo mais longo que as bocas deixam.
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Nem sereia nem ninfa. O amor e o pagão, um lago de tudo o que dois amantes e mais.
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Se um diz amo-te e o outro adoro-te, apenas palavras da dimensão do tal maremoto.
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Amarei até. Menos o que isso não consigo.

domingo, junho 03, 2018

Olhos verdes. Olhos castanhos. Vêem-se


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Disse-te, depois da revelação do teu esplendor:
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– Como é possível a bonança? Não houve guerra nem tempestade.
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Disse-te um segredo. Palavras-engrenagem da macieza do sono depois de fazer amor. O que te disse, eu?
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– Como é possível a tormenta? Se não houve trovoada nem mar alevantado, engolindo todas as palavras de dizer no instante certo.
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Abracei-te como se dissesse alguma coisa acertada. Ouviste-me dizendo qualquer coisa acertada. Falaste:
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– …
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Juntámos os lençóis, ajeitámos as almofadas e encaixámos os corpos. Cada beijo, cada gota dos suores misturados, cada nascente tua, cada erupção minha… todas de ternuras tremendas.
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Castigaste-me com o prazer – aquele sabido e que se esqueceu, sem nunca se ter esquecido. Castiguei-te com o prazer do prazer.
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Passaram-se dez anos. Menos que isso. Passaram-se vinte anos. Passaram-se todos os anos da saudade.
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– Como é possível esquecer? Como – graciosa dádiva – não esquecemos? Ficámos épocas de minutos no desejo que se deseja desejando. Esperámo-nos com todos orgasmos adiados.
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Disseste-me de todos tempos, das horas e dos anos, em que fui um fantasma agarrado ao desconsolo. A minha memória indigesta e o meu desconsolo quase-infinito. A sua memória amarga e o seu desconsolo, quase-infinito, enquanto se perdida numa festa e num choro. E eu estendido prestes-morto.
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Na verdade, não mo disseste. Não precisaste de me dizer amor. Sempre mo deste. Sempre te li os olhos – tanto amor, afago e a paciência de quem espera.
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Os teus olhos espelhando o Sol. O luzir finalmente regressado. Tantos beijos que as bocas contiveram. Deslumbrámo-nos na Lua dos quereres, dos reencontros e dos êxtases.
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– Ainda bem que voltaste.
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– Ainda bem que voltei. Ainda bem que voltaste.
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– Andei bem que voltei.
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– Ainda bem nos viemos.
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Qual a cor do amor? Qual a do desejo? A do bem-querer? A do retardar? Azul? Escarlate?...
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Não importa. As línguas oferecendo-se escondem-se. Os beijos são de.
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Orgasmos de.
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Calámo-nos.
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Assim de tormenta e bonança. Bem-aventurança. 

sexta-feira, junho 01, 2018

Sobreviver


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O meu segredo maior digo-o nas praças das cidades, na imensidão das vistas bravias, no conforto da amizade e ao teu ouvido.
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O luzir ao me teres vale a minha vida. Se tivesse dois corações, amar-te-iam incondicionais.
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És vontade e viagem. És chegada e estada.
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És dois passados e o único futuro. Ave que migra e retorna.
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És romã. Laranja. Pêra. Maçã. És o fruto da paixão.
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És a exaltação da tranquilidade, o amor perene.
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Agora, quase Verão, és mulher-deusa, bacante da minha cama.
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Irás, sei-o, de sensualidade da infracção, para seres a espada que me mata dolorido.
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Mercúrio te levará – pagão e medonho. Tenho medo. Sem uma fé de esperança.
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Rezo a São Cristóvão para que voltes. A Santo António peço milagre.
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És-me tudo. Generosamente de gratidão te agradeço, oferecendo-me no martírio da paixão e no êxtase de calma. No fogo do Inferno.
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O meu sangue, de sacrifício e verdade, alimenta-te. O teu retorno é o regresso do amor.
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Tenho a dizer dos teus lábios. Tenho-te todo o corpo.
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Sem incertezas – és uma verdade, que se colhe e se sabe partirá – do delito.
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Nessa angústia, tenho-te certa. Ainda que no intervalo de dança te perca. Beba tanta dor.
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Só há uma verdade. Depois, os pontos de vista e os equívocos. Silenciam-se nas omissões, criam-se enganos.
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Não há mentira sem verdade – toda ela ilumina tudo.
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Não há só flores. Não és só flor. És a dioneia e a dedaleira-roxa.
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Morro e sobrevives, para te poder morrer novamente.
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Em ti morro, por ti vivo. Se me pudesse ilimitado.
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Sou-te pleno. Não menos espero – iludido na verdade.
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Se eu fosse todo o mar e indivisível, sabes só teu.
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Fosses o meu barco, único de verdade e eternidade e também as ondas.
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Livre e aberta, fechas-me numa tristeza.
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És da natureza, garantes-me. Sou-te a terra e o ar. Bebes nas águas que libertas, desaguando em mares alheios. Incendeias-te ao longe, queimando-me.
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És o folhear, dos castanhos, pelo vento. És o céu barroco do Inverno. És fervor fulgurante da Primavera.
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Choro no Verão. Em todas as horas sobrantes. Quando a minha escuridão é o holofote rompendo-me o sono, devorando a fé e suicidando-me.
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É sempre, sei-o. Assim o será.
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Sempre significa sempre.
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Vives também no longe e morro por te saber vivendo uma vida estrangeira, nos dias doutros lugares, onde a dança que me proíbe – o meu segredo revelando o teu segredo – é me abstenho, libertando-te desapegado, ciente que me faltrás.
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Quando és outra e eu o mesmo.
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Se te peço para não me faltares é porque sei que me faltarás, consumida por outras chamas e saciada e molhada te dás.
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A Terra rodopia. Tonto vou caindo e levantando-me, morrendo e sobrevivendo.
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Na certeza – desejando eu o desacerto da intuição – essa da transgressão.
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Cá estarei calado, esperando da tua boca um beijo e o teu corpo sobrado.
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Que silêncio me cale para não falares o que não quero ouvir, mas sei.
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Não te exaures nem esmoreces, das danças e do repouso que te cansa as vigílias, dos dias sempre seguintes até ao despertar.
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És minha, sabendo que não o és, noutros lugares.
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Dizes-te liberal, mas não te sei se eu o fosse e me desse também.

O amor e o sexo


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Há o medo de perder o que não se tem nem se pode ter – o amor.
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O cerco e a reclusão não prendem, nem a liberdade garante.
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Há medo do segredo. Não da luz. De perceber a penumbra e a sombra – uma estufa de sal e orgasmo, do ímpeto pueril.
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Não há palavra de promessa nem de arrependimento – quem não acredita, não respeita e fala duma substância de condição e estrutura.
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Há palavras guardadas, duma claridade quase transparente, de olhos, beijos e abraços.
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Há quem não saiba mentir, apenas calar.
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Assim mente-se, para que não chegue a verdade, da voz do amor enganador.
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Assim se resguarda em mudo e choro, dos dias e das vésperas, do antes ao amanhecer, das tardes longas e das noites infinitas – melancolia e desânimo.
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Há episódios simples, repetidos e pronunciados vazios. Numa lonjura, o mar tapa a areia – dois corpos entregando-se no sexo. Mas à luz, o oceano se acalma e falando de amor se deixa na praia
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A paz da guerra é falso repouso. Nem há breu absoluto nem eterno.
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Quem vai descansa crente da sua invisibilidade. Quem resta sente o embate atrevido do ciúme.
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Não antes, agora. Um bicho irrequieto, acordando e perfurando num qualquer momento, indiferente à vontade do perdedor.
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O ciúme é um rio que, de adormecido na represa do silêncio castigador, se larga, atropelando a memória e crença.
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O ciúme é impronunciável. O rio que sobe as margens, se estende secretamente fora do seu leito, mesmo na bonança é o sossego atropelando o sossego.
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Perdendo-se se prisioneiro. Perdendo-se ausente. Perdendo livre duma corrente. Perdido de confiança
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A fidelidade icorrespondida não será morta, porque é morta e morrida – matando sempre e sempre.
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Não há presente sem passado e a água repete-se nos leito. A sua jura é chuva certa sem tempo de chegar.
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Perdida a crença, não haverá outra barragem de silêncio, todas as pedras caídas serão seixos, ficando correndo-ficando. A fonte será outro rio e o curso a torrente para outra terra.
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Se a natureza dos rios é desaguar, não há muralha nem confiança alterando a sua índole. Quem quer escoar, correrá – um delito de desobediência, indiferente à beira-rio.
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O conhecimento é duma dor. Se pronunciada – sua vergonha, pesar e inutilidade – é o momento de chorar ao brilhar das águas e da multidão despercebida.
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Dói e dolorosamente mata. Confia-se até quando se finge acreditar.
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Os rios desaguam, mesmo dizendo correr apenas por não haver sexo no seu leito – e do amor ser outra coisa.
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A palavra carência, sua distância, é a mentira de quem trai o padecente – se foi, será sempre. Uma qualquer palavra fenecida.
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Nem a detenção nem a soltura – mesmo a promessa uma sem regresso – fidelizam calmaria mansa.
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Assim se cai. Caindo, fica o desperdício, do pretérito e tempo vindouro.
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Nenhuma jura se ressuscita. Caindo se cai.
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O que é a dança? A liberdade e a transgressão. Qualquer ritmo tem os seus corpos. O seu odor não diverge do da cópula.
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A fidelidade afiançada é morta na próxima sensualidade.
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Quem sabe e se cala do corpo infiel – do dizer da cabeça sem traição do batoteiro – não se perde em ilusão, embaraça-se na desilusão.
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Há flores que se abrem repetidamente à Primavera, da volúpia estrangeira – aquela dita vazia.
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Há heras eternas, presas até ao fim da cama do amor. Morrem morrendo na certeza e do ciúme.
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A Hera – da boda – desponta, um dia morrerá estéril pela cama molhada pelos beijos dos forasteiros, duma língua presa noutra língua, da cor dum qualquer país e da sua fala.
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Do amor onde subiu soltar-se-á. O vento será para onde a flor desabrochada numa cama – do suor da lascívia, da fruição e da falsificação – não a encontrará.
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A dor do engano é calada, mesmo oculta, mas grita rasgando o sangue e o espírito – tudo o que se esconde se revela.
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Assim se diz do amor e do sexo.