digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

sexta-feira, outubro 28, 2011

Verbo esperar














Espero que me esperes, como a primeira vez. Coroada de flores, como virgem, e de olhos brilhantes. Espero a esperança suficiente até esse dia.
.
Quero-te emergindo dum lago, orlada de flores e dos pássaros pirosos que há no Paraíso. Quero esquecer a árvore do conhecimento e deitar-me contigo à sombra da dos prazeres.
.
Quero cumprir promessas de vidas. Quero meter-te a Lua no ventre, para que te faças Sol.
.
Dias soalheiros de amena luz. Mergulhos tépidos em mar de transparência e ondas de brincar. As frutas do mundo e o vinho de Deus.
.
A solidão feliz de dois amantes, alimentados de boca-a-boca e mão-a-mão e corpo-a-corpo e jura-a-jura. A feliz solidão sem tempo nem horizonte.
.
Amar além das vidas. Entre elas, o caminho do Paraíso para lugar nenhum, um abismo de perda de tempo.

segunda-feira, outubro 24, 2011

quarta-feira, outubro 19, 2011

Espreguiça-te



Espreguiça-te em mim. Antes de cair no sono caímos no desejo, até à satisfação plena. Espreguiça-te em mim. Grande como uma sequóia e tu frágil, enrolas-me como as lianas. O teu respirar dá-me vida e o calor tira-me água. Abraçados toda a noite, atiro-te pedrinhas ao sono, com promessas de amor, que não te abrem as vidraças em delícia nem ouves atrás do sonho. Acordamos em beijos e conto-te o que disse ensonado. Ris e faço-te cócegas, como as que te fiz antes de deitar. Despejo-te água, como o fiz antes que adormecêssemos. Só a fome nos tira da cama. O dia fica para depois.

domingo, outubro 16, 2011

Síndrome e transparência















Não são páginas em branco, mas de insuportável transparência. As letras escorregam ou desfazem-se em intersecções desajeitadas… quase suicidárias, se tivessem vista, meditação e coragem e vontade.
.
A transparência das páginas não fixa ideias. Mais concreta do que a ideia e fugaz na escrita.
.
As palavras são, por natureza, negras. As de tinta são negras e no ecrã vêem-se negras. Esqueçamos as de outras cores, subprodutos alfabéticos. As palavras, as letras, a pontuação são negras. Como desmaiam na transparência das folhas!...
.
Como uma vidraça… límpida, baça ou translúcida… folhas sem espessura, sem dimensão, sem cor. É mais doloroso escrever assim: sem ver, forçando a vista, de incerteza crescente, de tempo prolongado no travo que de intenso passa a enjoativo e a vómito… a dúvida chega e volta ao princípio. Folha transparente.
.
As ideias são livres e agora… Um descalabro, uma incerteza, angústia, desilusão e loucura.
.
Que fazer com esta ausência? Que poderei escrever? Deito-me esperando estar já a sonhar. Que esteja a sonhar com o pesadelo e que amanhã acorde com a síndrome da folha em branco. Espaço suficiente para algumas palavras. Negras, certamente.

sexta-feira, outubro 07, 2011

Lápide da imortalidade



















Depois do seu sonhado sucesso, coisa de amador de poucas ambições, coisa menos que a mínima que uma mãe quer ver, regressa à insignificância.
.
Memória deixa pouca e é apenas um tracejado ténue junto dos próximos. Nem os gozos de quem o vê palerma durarão mais do que as vidas que o conhecem e desprezam.
.
Ainda sem a noção de que as palavras se escreveram com letras quase invisíveis. Caído e estatelado, na dormência da dor nem descobre que morreu, de corpo ainda respirando.
.
Estar quase não é chegar. É perder o que não se chega a ter. O ridículo duma vida é tê-la vivido enganado.
.
A beleza está no apanhar da fruta e nas árvores de grande porte e considerável cabeleira. Não há como a natureza. A terra come o resto e dá o que recebe. Do respirar, nem bafo nem vento.
.
Uma vida virá que valha a pena.