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Há a sombra do tempo, os espectros no espelho, quase tantos,
mais óbvios e sem mudez nos olhos.
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Não são os retratos das pessoas antigas e a sua formalidade
austera. Nem as naturezas-mortas, recordações das dádivas, no caminho para a
copa.
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É esta casa, em permanente desmedição, o jardim-floresta,
longínquo como uma fronteira, sem porta e de quase vidro, e sou eu.
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Sou tudo eu, acompanhamento e ausência, dor empática e
mentira.
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Tenho a fantasia exaustiva do poder e do fascínio. A derrota
vem e fica, como uma religiosa doença perpétua, e nego-a e enjeito-a, porque
vivo a traição de Deus e confio no final, do fulgor, da verdade e do ciúme.
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Nada, só a casa e o todo que se lhe agarra. O linho
delicado, a sopa quase fria, a água e a carne. O aroma da prata cortando a
conversa quando se bebe o vinho.
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Após sou em qualquer esfera, só na solidão, sem frio nem
luar que importe.
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As floreiras de jasmim e violeta, o musgo, nos caminhos dos
cisnes e dos gansos, e tanta gente que não veio. Digo um credo, vento estreito que
os levou, falo de feitiço e pela verdade choro.
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A resposta está nos livros, se houvesse sabedoria e nela se
acreditasse, fiável como o cotão.
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Creio no descomedimento e na deferência, presunção imodesta
de quem se sentencia a Lua.
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Sem fé e acreditando na justiça que Deus me deve. Confio no
papel irrasgável e no cristal impartível.
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Contudo, existo e desapareço sem óbito.
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Se nem a morte existe, por que não consentir viver.
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