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Querido diário,
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hoje escrevo porque acordei triste, emocionalmente cansado e
com o sentimento da derrota que sentiria um cavaleiro andante derrubado do
cavalo. Por isso, sinto-me também envergonhado.
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O meu coração é – hoje é e não está – papel de jornal amarrotado,
que o roçar do maltrato fez esborratar a tinta. Nem tento endireitá-lo, porque
hoje é, e não está, tristíssimo.
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Um jornal faz-se de notícias, de cachas, de bombas, mas
também de imprecisões, gralhas, crises internas, loucura, festas de Natal e
muitas emoções. Um encerramento é sempre doloroso e trágico, emocional, de
frases poderosas, lamentos em surdina, lágrimas, risos, euforia ansiosa,
perdição – isto é válido para qualquer empresa, hoje e aqui é o Diário
Económico.
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O título está legível e nele leio os nomes de quem o tem
feito desde Outubro de 1989. Encontro o meu… os de amigos, conhecidos, de quem
gosto e até dos potencialmente desagradáveis. Este enunciado é total, do
estafeta até ao director de produção, da telefonista ao colunista, do director
ao estagiário, de quem tem a responsabilidade do economato até ao centro de
documentação.
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Comecei no Diário Económico em Janeiro de 1990 – onde guardo
boa recordação do mestre Goulart Machado. É injusto só citar um nome e se mais
juntasse continuaria curto. Voltei em 1995, com Nicolau Santos – conheci mais
dois mestres, Luís de Barros e João Paulo Guerra.
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Quase 16 anos depois de sair definitivamente, ainda hoje
sonho, a dormir, que faço uma chamada e digo que sou jornalista do Diário
Económico.
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Estive na Rua de Santa Marta e na Almirante Reis.
Frequentei, pelos amigos, as instalações no Carmo. Não sei quem teve a péssima
ideia de sentar o jornal em Alcântara.
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Tanto se pode escrever e dizer acerca de tudo o que correu
mal e que lançou para a insolvência o Diário Económico. Contudo, não vale a
pena. É passado, sem retórica.
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Presente é o meu abraço – com a certeza de que tantos outros
camaradas o fazem, como os seus imensos leitores, a todos os que actualmente
ali trabalham – acompanhado pelo desejo da esperança e de solução sem dor ou com
poucas lágrimas.
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Não é um obituário!
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Não é um obituário!
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Ao escrever esta minha crónica, Carlos do Carmo cantou-me mentalmente
o «Cacilheiro», com música de Paulo de Carvalho e poema de José Carlos Ary dos
Santos. Peço ao leitor que entenda o barco. Escrevo a pungência:
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«Se um dia o cacilheiro for embora,
Fica mais triste o coração da água,
E o povo de Lisboa dirá, como quem chora,
Pouco Tejo, pouco Tejo e muita mágoa».
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Nota: referi os meus mestres no Diário Económico, mas quero
deixar o nome de outros dois, que não citei por não visarem o caso. Trata-se de
Mário Rosendo (O Jornal) e Maurício de Carvalho, que me explicou o que é fazer
televisão.
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