digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quinta-feira, fevereiro 25, 2016

Milagre pascal

.
Loura com uma melena branca sobre a testa, o cabelo era comprido.
.
Descia a Rua da Verónica. Descia a Rua da Verónica. Virava na Rua Leite de Vasconcelos. Virava na Rua Leite de Vasconcelos.
.
Ficava na paragem do autocarro 12. Descia e lamentava a incoragem de ficar e seguir no mesmo carro. Fantasiava uma conversa, um local e um beijo.
.
Vestia-se de preto e branco, às vezes de castanho-claro. Vestia-me de preto e branco, às vezes de castanho-claro
.
Desejava que me olhavasse discretamente. Procurava-lhe os olhos, sabia que não seria capaz de os fixar nela.
.
Pensava que me olhava discretamente, com desejo parecido com o meu. Não o fazia.
.
Veio a Páscoa e na luz-escuridão da discoteca para adolescentes encontrámo-nos. Olhei-a e desejei que me encarasse e tivesse um desejo parecido com o meu.
.
Falou-me e eu. Nem um beijo, tanto que lhos desejava. Ingénuos e tímidos dançámos, sem lábios. Quase manhã, apanhámos o 42 – e o 12 era o que me servia.
.
Olhava-me discretamente e desejava idêntica – que surpresa.
.
Segurou-me na mão e despiu-se, ficou a camisa por pudor, aberta para que a sentisse. A minha primeira.
.
Dias e acontecemos tão insaciáveis.
.
A Páscoa foi a 19 de Abril. O milagre não sei.
.
Passou a Páscoa e tudo.

Sem comentários: