
Há uns anos, há bastantes, tive uma namorada que teimava que não gostava de vinho. Bem tentava agradar-lhe, escolhendo sempre com cuidado e diferenciado para acertar-lhe no gosto. Nada feito. A miúda jurava que jamais iria apreciar. Eu desesperava, descrente que alguém pudesse ter tal vontade.
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Esta rapariga é o que se pode chamar do amor da minha vida. Não porque agora suspire por ela, mas porque foi a primeira com quem desejei casar e fiz todas as descobertas e dei os grandes passos da minha vida adulta. Foi uma relação impossível de esquecer.
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Nessa altura eu morava numa casinha simpática com duas nesgas de Tejo a entrarem-me pelas portas da minúscula varanda de paredes inclinadas, a ameaçar tornar-se numa água-furtada.
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A casa não era grande coisa, mas eu gostava dela e, talvez mais, da luta pela sobrevivência: eram tantas as despesas e o dinheiro tão pouco. Embora os pais ajudassem, aquela luta era minha. Lá fiz muitas descobertas, até de vinho.
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Um dia num jantar, não me recordo bem se foi nesse meu pequeno palácio ou se num restaurante intimista, que consegui dobrar a vontade da namorada. Escolhi pelo lado direito, como fazia sempre nessa altura, e mandei vir um vinho honesto e sem manias de grandeza. Foi um Pasmados, vinho regional das Terras do Sado. É fácil e insinua-se, mas mais do que tudo representou uma vitória
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A namorada, hoje distante amiga, tomou o gosto ao Pasmados e durante uns tempos foi o vinho ritual, sempre que havia um jantar lá se bebia este tinto. É claro que, com o tempo, não ficámos cristalizados, todavia foi um marco: passei a ter companhia animada, sentia-me, e sinto-me, um evangelizador.
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Foi em Setembro que tudo acabou. Um dia a relação minguou e foi-se. Parece que tudo na vida chega ao fim. Ainda que não se queira, os grandes amores, mesmo pretéritos, regressam de tempos a tempos, sobretudo nas datas grandes. Foi em Setembro que escrevi esta crónica e, é claro, lembrei-me do Pasmados.
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Piu-piu.
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Periquita não é bem uma piriquita. Não, não se trata dum erro ortográfico. Os piriquitos são passarinhos cantadores e Periquita é nome de vinho. Bem sei que Periquita é grafia antiga para designar as pequenas aves, mas hoje uma e outra coisa são diferentes.
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O termo Periquita aliado ao vinho vem do século XIX, da Quinta da Periquita, em Azeitão, onde José Maria da Fonseca se estabeleceu como lavrador. Hoje é uma plantação de edifícios. É o que consta, pelo menos.
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A fama dos vinhos da Periquita ganharam reputação e a casta castelão, para ali levada pelo senhor Fonseca, tomou o nome da quinta, termo adoptado em muito do Sul do país. Mas o Periquita que hoje vem para ser lido é branco, aproveitamento comercial do irmão. E qual é o mal? Nenhum.
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O Periquita Branco é um vinho se pretensões, uma escolha para o dia-a-dia. Mesmo para estes que fazem paredes meias com o Verão, até porque os dias ainda andam quentes e porque não há lei nenhuma que proíba beber brancos no Outono ou mesmo no Inverno.
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Ouro verde
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Outro dia perguntei-me por que nunca tinha escrito sobre azeite. Na verdade, não há qualquer razão para não o fazer. O vinho ainda não me cansa, mas o óleo da azeitona também merece umas linhas e umas palavrinhas.
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Por cá, o vinho é, sobretudo, bebido às refeições. Os bons vinhos casam-se bem com a boa comida e fazem uma festa à mesa. Se não há boa gastronomia sem bons ingredientes, deve-se atender à escolha e não negligenciar qualquer produto. Por tudo isto, vem o azeite à baila.
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Em Vila Velha de Ródão há uma quinta, a Tapada da Tojeira, onde se situa também um centro de artes – dança, plásticas e educação. Com idêntico cuidado estético e atenção aos gestos se fazem azeite e pastas de azeitonas galega (preta) e cordovil (castanho esverdeado).
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A produção é toda biológica. As oliveiras não são tratadas com produtos químicos de síntese. Dizem os entendidos que são melhores os bens alimentares assim criados. Eu acredito, porque sinto lógica. Mas só isso não garante a qualidade final, pelo que o esmagamento dos frutos é feito a frio, para que melhor se conservem os aromas e os paladares. É provar os três alimentos, numa refeição com calmas e apetites.
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