digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

sexta-feira, março 09, 2007

A carta do dia seguinte

Lisboa, 9 de Março de 2007

Querido(a) leitor(a) escrevo hoje a carta do dia seguinte, porque me pediram para escrevê-la. Pediram-me para escrever sobre a mulher. Pediram-me para escrever sobre a mulher no seu dia. Por que não o fiz no seu próprio dia? Estou assim a responder a uma encomenda? Dirá de sua justiça no final, como é hábito seu. Digo desde já que sou tão irracional e obtuso quanto não sou indomável, que sei dar a mão à palmatória quando o julgo ser necessário tanto quanto sigo os meus princípios.
Não escrevi nem uma linha sobre as mulheres no seu dia, porque não há nada a escrever sobre as mulheres. Escrevo-as quase todos os dias: as reais e as ficcionais, as que amo, as que amei, as que desejo amar, as que amarei e as que julgo odiar.
Não há nada a escrever sobre a mulher no seu dia, porque se o fizesse estaria a considerá-la um só ser. A mulher não é uma flor. A mulher não é um objecto. A mulher ter um dia é assumi-la como um ser inferior ou ter a data como marco comercial como o Dia de São Valentim ou o Dia do Pai ou Dia da Mãe ou o Dia das Bruxas.
A mulher não é um bichinho muito parecido com o homem com o qual se tem sexo e se deixa viver lá em casa. Por que raio há-de ter um dia no calendário? Serve para simbolicamente se criar uma feliz e justa igualdade no recenseamento militar, coisa criticada com aleivosia militante de feminista sindical. Para que raio serve o Dia da Mulher? Serve para uns sindicatos de preguiçosos sairem à rua com as mesmas palavras-de-ordem de todos os outros dias de anhanço laboral a protestar contra todas as políticas de todos os Governos. O Dia da Mulher serve para umas tantas mulheres reivindicarem vitória gloriosa do «sim» no referendo do aborto, esquecendo-se que muitas outras mulheres votaram no «não» e que certamente metade dos 56 por cento de abstencionistas é formado por mulheres.
A mulher não é objecto! A mulher não é adorno! A mulher não é para cuidar do lar sozinha! A mulher pode cuidar sozinha dos filhos! É ridículo andar a oferecer rosas no Dia da Mulher! A menos que se queira oferecer uma rosa apenas por querer oferecer uma rosa... É idiota andar a oferecer gerberas no Dia da Mulher! A menos que se queira oferecer uma gerbera apenas por ser um simples 8 de Março...
Ora, para escrever flores bordadas a palavras não contem comigo a 8 de Março, porque tenho demasiado respeito pelas mulheres. Para fazer claque de feminismo sindical fora de prazo também não. Sou homem e tenho na mulher alguém da mesma espécie com os mesmos direitos e os mesmos deveres que eu... certamente muitos muitos desejos iguais aos meus. É por isso que me marimbo para o Dia da Mulher!

Nota: Esta carta é dedicada à Gisela Amieira que deixou um comentário a queixar-se de que não havia um texto sobre as mulheres no dia 8 de Março. Com todo o respeito que a minha amiga me merece, aqui fica a resposta. O texto é dedicado ainda a quem sentiu igual falta.

5 comentários:

João Barbosa disse...

Só chamo de preguiçosos aos sindicatos que passam o tempo ou em greves ou em manifestações de rua. Refiro-me, em concreto, à CGTP.

Anónimo disse...

O que uma pessoa faz, para ter um texto dedicado...:)
João adorei, a sério!!!
Apesar de não parecer, concordo contigo em muitas das coisas que aqui escreveste e mais; reconheço que uma das coisas que tu mais fazes quase diáriamente nos teus textos é realmente elogiar as Mulheres, sejam elas como tu dizes reais ou ficcionais...Aplausos: chlap, chlap, chlap...

perdida em Faro disse...

Boa boa! Gostei muito do texto, concordo com tudo e até nem senti falta...agora o próximo dia é só para o ano e pergunto porque é que aquando do 8 de Março não se fala nas mulheres e homens que lutaram peos direitos de voto e de garantias de consideração de valores de cidadania e de constituição de igualdade da mulher na sociedade? Foram só as mulheres que lutaram por isso?
Aproveito ainda para dizer que o strip masculino e as flores e as bebedeiras que se vêm nesse dia são tristes e em nada se adequam ao que me parece querer ser "comemorado". Tenho pena se ser mulher é ser assim e apenas um dia por ano!

João Barbosa disse...

Gi: :-)
Tânia: Pois!

Ana Fonseca disse...

Ora aí está o João Barbosa no seu melhor! Sabes, eu não sou tão radical como tu... Concordo com todos os aspectos do texto, mas não vejo o dia da mulher assim tão obtuso... É um dia de comemorar metas alcançadas, de recordar lutas... de lembrar! E não sou tão radical a ponto de dizer que sou contra a celebração deste dia por ser apenas um dia e não um ano inteiro. É uma marca. Apenas isso!
Mas tu já deves ter lido o meu texto, por isso, n vale a pena dizer mais nada! Está lá tudo!
Beijinhos para ti, Joãozinho!
Ah! E as mulheres agradecem todos os teus textos de todos os dias do ano! :)