Anteontem fui à cave e trouxe uma das minhas melhores garrafas. Vou abri-la hoje depois de a ter feito repousar de pé. O tempo que se passa deitado também cansa. Vou abrir hoje uma das minhas melhores garrafas com alguns dos melhores amigos, porque assim tem mais sabor. Assim é que o vinho tem sabor. Só assim.
Na mesa vou pôr uma toalha de linho muito alva, sem mácula ou pecado, como se quer da amizade. Mas como manda a moda e o gosto de agora, a minha toalha de linho branco é de algodão roxo. É sem nódoa ou enxovalho. Nela espalharei pratos, as alfaias, os copos justos e guardanapos impolutos.
Depois vem a festa dos sabores e dos aromas, sem espalhafatos, para que nada roube a ribalta ao vinho, que já tem idade. Carninha estufada em vinho tinto com cebolinhas e alho, escoltada de batata cozida. Para falar com franqueza não sei o que primeiro hei-de trazer à tábua: nada de queijos, nada de muita fruta ou exuberância, nada que na sua juventude passe rasteiras ao velho tinto ou chame amigo tinto mais jovem que leve as emoções para longe do velho amigo. Não sei com que vá entrar. Para saída estou capaz de uma patifaria doce suave que se arrime bem a um colheita tardia que se passeia lá por casa e já anda resprescado.
Anteontem fui à cave e trouxe uma das minhas melhores garrafas. É pequena para tanta gente, a garrafa, mas é generosa a sua vontade. Se pudesse servia-a a todos os amigos. Não posso, não chega. Nem mesmo toda a minha adega é suficiente para a sede de todos eles. Não que tenham muitas securas... Felizmente tenho tantos companheiros. Uns são mais chegados do que outros e se pudesse matava a sede a todos com a minha melhor garrafa.
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