digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quinta-feira, agosto 28, 2014

José de Sousa Tinto Velho 1940 e o seu tempo

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Provei, aliás bebi o José de Sousa 1940. É um vinho mítico! Por alguma razão, umas dezenas de garrafas jaziam sob uma pilha de carvão. Foi em 1986 que se descobriram, quando a empresa José Maria da Fonseca comprou e tomou a posse da Casa Agrícola José de Sousa Rosado Fernandes, situada em Reguengos de Monsaraz.
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Rendido a agradecido a Deus e a quem mo deu a beber!
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Provei, aliás bebi o Moscatel de Setúbal Trilogia, um lote de vinhos das colheitas de 1900, 1934 e 1965. Embora lançado há 15 anos, não deixou de ser um vinho raro e especial.
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Rendido e agradecido a Deus e a quem mo deu a beber.
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O primeiro vinho marcou-me pela estória e o outro mostrou-me história. Gosto é de contar estórias e para tal recorro muitas vezes à ciência em que me formei, História. Que se dê um mergulho ao tempo do Tinto Velho. Vinho e história e estórias casam-se bem.
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O Tinto Velho fazia-se na tradição alentejana, em grandes ânforas de barro – as talhas. Hoje completamente em desuso, restam poucos produtores que a usem. A empresa José Maria da Fonseca utiliza as que tem, contribuindo para o lote do herdeiro Tinto Velho, o José de Sousa. O sistema foi introduzido pelos romanos e até à década de 50 do século XX ainda se faziam, há documentação fotográfica que o atesta (não consegui encontrar). Porém, o ofício perdeu os seus oficiais e ninguém hoje sabe fabricar uma talha. A funcionar há potes do século XVII.
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Sem história e/ou sem estórias o vinho não é tão grande – penso. O mote é a colheita de 1940 do José de Sousa Tinto Velho, mas porque as sociedades não se mudam num dia, nem num só ano, a realidade de Portugal e do seu vinho vai do antes ao depois desse ano de começo de década, e bissexto de formato. O conflito armado na Europa não permitiu que fossem atribuídos Prémios Nobel – a Suécia sobressaltou-se com a invasão da Finlândia pelos soviéticos e a Noruega foi ocupada pelas tropas do III Reich .
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Distamos 74 anos em tempo, mas anos-luz nos dias que correm. O mundo, sobretudo a Europa, conhecia ditaduras ferozes e de sinal contrário. Ditaduras em nome do operariado de esquerda e âmbito internacionalista – as comunistas – e ditaduras em nome do operariado de direita e nacionalistas – fascistas. Em Portugal vivia-se numa ditadura compósita, formada por militares conservadores que combateram na Primeira Grande Guerra, juntava militaristas, monárquicos conservadores, activistas católicos e fascistas – obviamente houve gente que se encaixou em mais do que uma destas gavetas.
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A Guerra Civil Espanhola (17 de Julho de 1936 a 1 de Abril de 1939) foi o ensaio geral da Segunda Guerra Mundial – há historiadores que defendem, mesmo, que terá sido em Espanha o começo do mais violento conflito da História da Humanidade.
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Em 1938, a Alemanha entra sem resistência na Áustria – esta anexação fica na história com o termo alemão de anschluss – invade a Checoslováquia para resgatar os alemães dos Sudetas (Silésia) e, um ano mais tarde, toma conta do país.
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As potências vencedoras da guerra de 1914-1918 assistiam impávidas, ladrando sem arreganhar os dentes, ao passeio militar da Alemanha. A 23 de Agosto de 1939 acontece o inesperado, os ditadores Adolf Hitler e Josef Stalin, por via dos seus chefes de diplomacias – Joachim von Ribbentrop e Vyacheslav Molotov – assinam um pacto de não agressão... estenderam um mapa na mesa e negociaram que países iriam engolir, sendo que a Polónia se serviu toda no repasto.
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A 1 de Setembro de 1939 a Alemanha invade a Polónia. A 17 de Setembro a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas invade a Polónia. O acordo entre vermelhos e castanhos deixou esquecidos, por Stalin, muitos combatentes da Guerra Civil Espanhola (espanhóis e elementos das Brigadas Internacionais, republicanos, comunistas, socialistas e anarquistas) em campos de refugiados em França e que acabaram em campos de concentração nazis.
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Saltando para 1940... A 17 de Maio, Portugal assina a Concordata com a Santa Sé, que reforçou o poder da Igreja Católica e sua ascendência política.
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A 20 de Maio começou a funcionar o Campo de Concentração de Auschwitz 1, na Polónia.
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A 24 de Maio, tropas britânicas e francesas livres conhecem um desaire, ficando encurraladas, à espera de transporte, na praia de Dunquerque, na Flandres francesa.
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A 13 de Junho, Paris declara-se cidade aberta. No dia seguinte as tropas vencedoras marcham pela capital francesa e é hasteada a bandeira da suástica.
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A 17 de Junho, o general Pétain assume-se como presidente de França e capitula perante o invasor.
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O romance dos dois mais sanguinários ditadores da história durou pouco, a 22 de Junho de 1941, Adolf Hitler dá ordem para a realização da Operação Barbarossa – que estava em preparação desde 1940.
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O terror nazi, nomeadamente contra os judeus, começara alguns anos antes, e em 1940 estavam imparáveis.
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Portugal participou na Guerra Civil Espanhola, de modo pouco discreto por parte do regime, ao lado dos falangistas de Francisco Franco, e mais escondido por partisãs apoiantes da causa republicana. Já quanto à Grande Guerra, Portugal declarou-se neutral, embora fosse evidente a simpatia para com o III Reich. Uma neutralidade que, apesar de tudo, era diferente de não beligerância, posição em que Espanha se colocou.
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Há quem diga que a ditadura do Estado Novo não era fascista. Tal e qual como se estabelece o limite do que é e não é, não se pode ignorar que se fazia a saudação romana. Ao mesmo tempo, existia uma organização de juventude lúdica e política  primeiramente não obrigatória – a Mocidade Portuguesa, inspirada em congéneres de Itália e Alemanha. No primeiro evento em que participou não havia ainda fardamento, os alemães deram as suas calças castanhas e os italianos as suas camisas verdes. Assim se criou a fardamenta.
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Todo o cuidado era pouco e o ditador português sabia que Franco e Hitler não eram de se fiar. Por isso, a chancelaria de Lisboa estremeceu de medo com o cônsul de Bordéus, que se empenhava e desunhava a assinar vistos a refugiados políticos, e religiosos – se preferirem também étnicos. Aristides de Sousa Mendes caiu em desgraça e António de Oliveira Salazar tomou muita atenção aos castigos aplicados ao diplomata. Não se sabem números, constam que terão sido mais de 34.000 vistos, dos quais cerca de 10.000 a judeus – tem por isso uma árvore dedicada no «Jardim dos Justos entre as Nações», em Jerusalém Contudo, não foi o único diplomata português a desrespeitar as ordens de Lisboa, Carlos Sampaio Garrido, embaixador na Hungria, salvou o mais que conseguiu, tendo também uma árvore no «Jardim dos Justos entre as Nações».
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O embaixador português em Madrid, Pedro Teotónio Pereira, visitou o Consulado de Bordéus e afligiu-se com a apresentação e modos, enlouquecidos – dirá – de Sousa Mendes. Não dormia, ou quase, para realizar o que designava por acto de consciência. Nos últimos tempos, Sousa Mendes passava vistos em qualquer papel que tivesse espaço em branco e falsificou documentos, com a ajuda dos familiares e do rabino de Antuérpia.
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A 17 de Junho de 1940, Aristides de Sousa Mendes afirmou-se inspirado por Deus na sua missão:
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– A partir de agora darei vistos a toda a gente, já não há nacionalidades, raça ou religião.
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De Lisboa somavam-se telegramas. Sousa Mendes ignorava-os.
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– Se há que desobedecer, prefiro que seja a uma ordem dos homens do que a uma ordem de Deus.
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Salazar sabia que Franco e Hitler sabiam. Portugal ia do Minho a Timor, com as ricas colónias de Angola e Moçambique. O ditador sabia que o país seria incapaz de se defrontar com Espanha ou Alemanha.
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Apenas cinco dias depois de Sousa Mendes revelar a inspiração divina, França e Alemanha assinam um armistício e, por vontade de Hitler, na mesma carruagem em que, a 11 de Novembro de 1918, se assinara a capitulação germânica. Com o aproximar do fim da Segunda Guerra Mundial e queda do nazismo, o carro ferroviário foi mandado destruir, para que outro contrato ali não pudesse ser assinado.
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Salazar foi conveniente com os dois lados do conflito, lucrando com a desgraça. Portugal era um país rural, pobre, miserável em alguns aspectos, e a abundância de volfrâmio permitiu que muito povo da Beira ganhasse a vida. Os alemães pagavam bem e os ingleses, muitas vezes, cobriam a parada. De Londres vinham telegramas de protesto, mas Salazar na casa de São Bento, em Lisboa, não lhes dava importância.
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Não se pense que por haver paz se vivia à larga. Havia racionamento alimentar e um temor que a guerra cá chegasse. A minha mãe, hoje com 85 anos, contou-me que nas janelas se colavam fitas adesivas para evitar o lançamento de estilhaços de vidro, caso acontecesse um bombardeamento aéreo.
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Faltava comida por várias razões, desde a venda por parte do Estado ao açambarcamento, que servia para negócio de exportação para os territórios em guerra. Não importava o comprador, desde que pagasse. Em Lisboa, com o seu porto de mar, estivadores e fornecedores tratavam do contrabando, que antes de embarcarem se armazenavam nas casas destes comerciantes de oportunismo. A minha avó paterna  que não conheci – que um senhor conhecido morrera de ataque cardíaco quando o informaram do fim do conflito – a árvore das patacas secara.
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O meu pai, com 90 anos, mentiu na idade e nos estudos para fugir de casa... à mãe-galinha e castradora – diz o meu progenitor. Alistou-se na Armada e foi conhecer o mundo. Diz-me que havia um genuíno receio de entrada na guerra.
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A sociedade portuguesa dividia-se entre germanófilos e anglófilos. Era transversal, não conhecia estatuto social ou económico. Na Marinha sabia-se que radiotelegrafistas informavam, ambas as facções, do movimento de navios e vasos de guerra nos portos portugueses.
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A bordo, no alto-mar, receava-se que a actividade bífida dos radiotelegrafistas e do regime transformasse os navios em alvos das bombas dos dois lados da guerra. Para mais, havia a bizarria de não esconder os vasos de guerra, mas assinala-los, com letras garrafais a formarem a palavra «PORTUGAL» a tinta branca sobre o cinzento dos costados. Há noite «PORTUGAL» era em letreiro luminoso.
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– Se nos atacassem era quase como tiro aos patos, diz Manuel Jorge Barbosa.
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Contudo... Portugal era um país calmo e sereno. Pelo menos na imprensa. Sussurravam-se ideias e ouvia-se, baixinho, Fernando Peça na BBC, dando conta duma versão da guerra diferente da filtrada pelo regime de Salazar.
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Não sei, porque não li jornais desses dias, mas o incidente certamente foi ocultado pelo serviço de censura: o ataque terrorista ao paquete Pátria, fundeado junto ao porto de Haifa, na Palestina – hoje parte integrante do Estado de Israel.
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O Pátria ia seguir para a colónia britânica da Maurícia levando cerca de 1.800 judeus europeus, fugidos ao terror nazi. O atentado foi perpetrado pela Irgun Zvai Leumi, um organização terrorista judaica de direita, que estava em oposição à Haganah – que pretendia que todos ficassem na Palestina. Os relatos dão conta da morte de 267 pessoas, ficando feridas 172.
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A este rectângulo de paz acorreram muitos refugiados e exilados, desde crianças entregues a famílias anónimas, comuns cidadãos privados de rendimento que lhes permitisse embarcar para os Estados Unidos da América e ricos e famosos.
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O Estoril deu guarida a escritores, artista, actores, intelectuais, governantes, espiões, aventureiros. Naquela estância balnear hospedaram-se, em 1940, o milionário e amante das artes Charles Guggenheim, Indira Nehru, que viria a governar a Índia, Thomas Mann, Jean Renoir e Antoine de Saint-Exupéry...
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Mas o que tornou célebre esta povoação suburbana de Lisboa foi a concentração de cabeças coroadas ali exiladas... o Rei Humberto II de Itália, o Arquiduque Otão de Habsburgo (herdeiro da Áustria), João Carlos de Bourbon y Battemberg (herdeiro de Espanha), o Rei Semião II da Bulgária, Henrique de Orleães (conde de Paris e herdeiro de França), o Rei Carol da Roménia, Helena Karageorgevitch da Sérvia (irmã do Rei da Jugoslávia) e irmãos, a princesa Margarida da Dinamarca e a Grã-Duquesa Carlota do Luxemburgo.
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Em 1942, o milionário arménio Calouste Gulbenkian, conhecido pela alcunha de «senhor 5%», devido à participação no capital da Turkish Petroleum. Eram 5% que valiam muito mais, pois os quatro restantes accionistas (franceses, holandeses, britânicos e norte-americanos) detinham 23,75% cada. Gulbenkian desempatava e amealhava. Gostou de Lisboa e não embarcou para os Estados Unidos – a cidade deve-lhe dois magníficos museus, um de arte antiga e artes decorativas, e o Centro de Arte Moderna, e o planetário. A Fundação Calouste Gulbenkian fomenta trabalho de investigação científica, apoio a artistas, acções culturais, educativas e humanitárias, em Portugal e em todo o mundo, sobretudo nas antigas colónias africanas e Timor-Leste. Hospedou-se no Hotel Aviz e aí viveu até à sua morte, foi muitos anos o único hóspede e o último.
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No Estoril estava a elite exilada. Nas ruas de Lisboa, sobretudo, refugiados faziam pela vida. Judeus e não judeus, nacionalidades várias... eram vendedores de camisas e de gravatas, batendo de porta em porta.
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Na pacata Lisboa surgiu, por via de refugiadas judias alemãs, um bolo que está hoje presente em qualquer pastelaria, em todo o país. Os portugueses apaixonaram-se pelas bolas de Berlim – e que bem que sabem na praia. As berliner pfannkuchen foram adaptadas, com o tempo, ao gosto português. As originais são recheadas com doces de morango ou de amoras ou framboesas, mas aportuguesadas enchem-se com creme de pasteleiro.
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Por Portugal entraram pessoas com a cabeça mais desempoeirada, mulheres mais livres e de hábitos cosmopolitas. Arranjavam-se bem e algumas até fumavam.
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A propaganda do regime não se cansou, posteriormente, de enaltecer o génio de Salazar, que conseguira manter o país fora da desgraça da guerra. Todavia, foi por um triz!... Lembrando aqueles minorcas galifões armados em grandes campeões de luta, Salazar quis enviar para Timor uma força expedicionária. A colónia fora ocupada por tropas australianas e holandesas (livres), antecipando-se à entrada de forças japonesas. Franklin Roosevelt conseguiu demover António Oliveira Salazar...
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O ano de 1940 – a década de 30 e até pouco depois do fim da Segunda Guerra Mundial – teve as suas encenações e por isso evoco acontecimentos passados antes e depois do Tinto Velho de 1940. A 28 de Abril de 1940, a União Nacional – partido único – organizou uma grande manifestação no Terreiro do Paço, em Lisboa, para comemorar os 52 anos do ditador.
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Porque Portugal era pacato e se estendia do Minho a Timor. Porque tivera sob o seu direito metade do mundo. Porque são grandes os seus heróis...
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Porque 40 é um número mágico:
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– Em 1140 Dom Afonso Henrique proclama-se Rei e ele próprio se investe coroando-se.
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– Em 1640 o duque de Bragança liderou a sublevação que pôs fim a 60 anos de domínio de Espanha, tornando o primeiro Rei da quarta dinastia, empossado com o nome de João IV.
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– Em 1940 para dar uma sensação de normalidade, que transmitia serenidade e certeza de que a guerra não chegaria a território português, realizou-se uma grande festa patriótica.
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Quanto à normalidade pacata de 1940... o regime exaltou as glórias na Exposição do Mundo Português (23 de Junho a 2 de Dezembro). Ainda hoje permanecem algumas peças... zonas ajardinadas – que um vereador do ambiente quer destruir, por não compreender o contexto dos momentos históricos – o Padrão dos Descobrimentos, inicialmente construído em gesso e posteriormente reerguido em pedra, e o tristemente abandonado Museu de Arte Popular, que é uma fotografia da época e do conceito que o regime tinha do povo – um amigo antropólogo defende que este museu se devia preservar num museu. Os pressupostos e princípios dos conceitos são tão datados e comprometidos que tornam o conjunto numa peça de museológica. Até sugere que se guarde numa (enorme) vitrina, semelhante a tantas que há nos museus, e com uma legenda de enquadramento à porta. Depois entra-se e vê-se o que há para ver. Gosto!
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Mas é o Padrão dos Descobrimentos a melhor herança. Serviu a propaganda imperialista e serve hoje como retrato de conjunto da família dos exploradores portugueses e é cenário fotográfico dos turistas. O edifício tem a assinatura do arquitecto Cottinelli Telmo, que foi também cineasta, e as esculturas são de Leopoldo de Almeida.
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Outro ponto de grande significado, nessa glorificação da pátria, foi a nau Portugal, construída na Gafanha da Nazaré e lançada na ria de Aveiro. Um vento causou um acidente, adornou de quilha, quase se deu a nave como perdida para o festival.
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António Oliveira Salazar desejava um povo humilde, trabalhador e honrado. Sob o lema:
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– Deus, Pátria e Família.
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Portugal devia ser auto-suficiente em alimentos, nomeadamente em cereais e lançou uma campanha de produção de trigo – irracional em vários aspectos.
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O vinho era também glorificado:
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– Beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses.
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O cinema servia os propósitos do regime: popular, fácil, com mensagens políticas óbvias. Hoje são clássicos, com um humor ingénuo que lhes prolonga a vida. O vinho fazia parte do elenco.
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No filme «O Pátio das cantigas», de 1942, recriou-se a vida num bairro popular lisboeta. Realizado por Francisco Ribeiro (conhecido por Ribeirinho), que entra como actor, há uma parede que jorra vinho.
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Para final uma leveza. Os campeonatos de futebol são como os anos agrícolas, não começam em Janeiro e terminam em Dezembro. Assim, tenho o dilema acerca de qual o campeonato que devo citar na evocação.
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Deve ser o de 1939-1940 – findo antes das vindimas – ou o 1940-1941, começado no tempo de vindimar? Não sei, decida o leitor.
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O campeonato de 1939-1940 foi disputado por dez clubes. O campeão foi o Futebol Clube do Porto, seguido pelo Sporting Clube de Portugal, Clube de Futebol «Os Belenenses», Sport Lisboa e Benfica (que levou 8 a 3 do Belém), Futebol Clube Barreirense, Associação Académica de Coimbra, Carcavelinhos Football Club (em 1942 juntou-se ao União Foot-Ball Lisboa, dando origem ao Atlético Clube de Portugal), Académico Futebol Clube (Académico do Porto), Leixões Sport Club e Vitória Futebol Clube (Vitória de Setúbal).
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Nessa prova houve dois jogadores a liderar a tabela de goleadores, com 29 tentos; o português Fernando Peyroteo, do Sporting Clube de Portugal, e jugoslavo (croata) Slavko Kodrnja, do Futebol Clube do Porto.
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A Taça de Portugal foi disputada entre o Sporting Clube de Portugal e o Clube de Futebol «Os Belenenses»... os azuis (os meus) perderam por 4 a 1. Não gosto do Sportém!
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Na Taça de Portugal de 1940-1941 o meu Belenenses voltou a chegar à final, mas perdeu por 3 a 1 contra o Sport Lisboa e Benfica. Não gosto do Benfas!
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O campeonato nacional foi disputado por oito clubes. O campeão foi o Sporting Clube de Portugal, seguido pelo Futebol Clube do Porto, Clube de Futebol «Os Belenenses», Sport Lisboa e Benfica, Associação Académica de Coimbra, Futebol Clube Barreirense, Unidos de Lisboa e Boavista Futebol Clube.
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O melhor artilheiro foi Fernando Peyroteo, com 29 golos.
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Pronto, assim bebi novamente (mentalmente) o José de Sousa Tinto Velho 1940 – que grande vinho.
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Nota 1: A fotografia de entrada mostra a sala das talhas da adega de Reguengos de Monsaraz, onde se fez o Tinto Velho de 1940.
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Nota 2: Infelizmente não consegui identificar os autores das fotografias, sendo que a maior parte faz parte do espólio da Fundação Calouste Gulbenkian.
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Nota 3: Notícia publicana no «Diário de Lisboa», a 7 de Junho de 1944.
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Nota 4: «A Nau Portugal», realizado por Leitão de Barros.
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Nota 5: «O Pátio das Cantigas», realizado por Francisco Ribeiro.
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Nota 6: António Oliveira Salazar servindo um copo de vinho a um camponês.


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