Apetece-me coisa nenhuma. Um dia de tédio. Não de tristeza
de lamber feridas e aiar. Nem música, nem Sol nem cama, nem televisão nem gatas
e nem cão, nem solidão nem multidão, nem vinho nem combustão, nem viver nem
morrer.
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Dia de eclipse, de viagem sideral mas sem procurar Deus, sem
querer chegar ao fim do universo nem aterrar.
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O tédio é uma dor como a dos dentes, ora em lume brando ora
carbonizando. Os ais aliviam, mas já disse que aiar hoje não resolve nem
apetece.
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É Verão sem praia, Outono sem chuva, Inverno sem frio nem
Primavera sem chatice. Só me falta o acne para espremer.
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Este tédio é bom para sala de espera num hospital central
quando o mal é tão fraco que nos põem uma bracelete verde, para nos fazer
compreender que estamos ali a mais.
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De que mal me irei queixar ao Hospital de São José? Que
direi para justificar o meu empate no trabalho de quem está a tratar gente com
problemas?
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Este tédio, este tédio... vou de táxi para não me preocupar
com estacionamento. Podia ir a pé, caminhar faz bem e o ar limpa os
pensamentos, mas e o tédio que dá só de pensar nisso?
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Sei! Na recepção vou queixar-me de tédio e vão pôr-me na
sala de espera dos maluquinhos. É muito mais pequena e silenciosa. O tédio é
treino para aguentar e talvez consiga passar o tempo aiando. Se tiver sorte
terei bracelete verde.
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Será verde? No outro dia deram-me uma amarela por estar
perigosamente agitado. Agora que estou perigosamente enfadado... espero que
seja verde.
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Deve haver um comprimido mágico para o tédio.
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Enapá! Um suspiro. Fraquito. Vou sair já para apanhar o táxi
para o Hospital de São José antes que o tédio se amenize.
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