Não
te quero perder nem tampouco ver-te voar sozinha num balão de ar quente com o
rosto iluminado, numa viagem curta para tanta saudade.
.
Não
te quero perder e quero um jardim, onde te possa encontrar nas brincadeiras infantis
de quem ama muito.
.
Uma
casa muito grande para no Inverno jogar às escondidas.
.
O
jardim desenho-o e nele árvores de nós. Não vão crescer, nascerão crescidas,
para que dêem logo sombra e perfume.
.
A água
e o seu palrar refrescante. Aos mouros copio os com regatos falsos em tijoleira
e azulejos ricos de azuis, verdes e brancos.
.
Como
um sultão, tu como a única odalisca do harém.
.
Melhor
do que regatos, um dédalo a indicar caminhos para todas as partes.
.
Relvado
bravio e suas flores. Para os dias melancólicos um prado de muitas pétalas de
cultivo.
.
Uma
ilha cercada largo. Será que um rio cabe num jardim? Cabe neste meu sonhar.
Nela ciprestes e uma casa aberta à volta, onde os corpos se deitam para fazerem
amor e depois suspirar comendo frutas do pomar.
.
Sem mais
ninguém, apenas nós. Recantos de bosques e neles esconderijos onde os corpos se
deitam para fazer amor e depois suspirar comendo frutas do pomar.
.
Ainda
que plano e levemente ondulado, o jardim terá fontes e numa brotará de água
quente para lembrar termas. Todas limpas e brilhantes, como os teus olhos
verdes.
.
Um
pavilhão grande, cruzado pelos caneiros mansos de água a cantar ladainhas.
Paredes de cortinas brancas, ondulando para que luz e penumbra enfeitem água e
azulejos. Nele, deitados faremos amor e depois suspiraremos comendo frutas do
pomar.
.
Que
árvores na floresta? Tem mesmo de passar um rio, doutra forma os salgueiros
viveriam tristes, provavelmente raquíticos de sede.
.
Na
ilha só ciprestes, com suas sombras finas e verde heráldico. Ciprestes só na
ilha, para que outras possam ter espaço para graçar.
.
Uma
floresta misturada onde árvores e ervas têm sítio certo.
.
Vou
cansar-me de dizer... não direi, são muitas. Acho que não falta nenhum que na
nossa terra viva, assim como as ervas.
.
Trevos
e neles os da sorte. Erva-moura, claro. Heras para estragarem as paredes da
casa. Umbigos-de-vénus, claro. Erva-abelha, claro.
.
Parece
o Paraíso e com amor tão grande até cabem urtigas, erva-da-inveja, viperina,
erva-mosca, erva-vespa e os perigosos medronheiros. Sem medo, que haja
figueiras-do-demónio, que aqui ninguém acredita que o estramónio sirva o triste
Diabo.
.
Figueiras-da-índia
para picar os dedos, figueiras de toda a espécie – convencido que possa ter
sido uma figueira a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal.
.
No
pomar, as amigas macieiras e pereiras. As pecaminosas ginjeiras e cerejeiras. Marmeleiros
para doces de Inverno. Romaneiras que para fazerem filhos às laranjeiras, e
ainda limoeiros e muitos citrinos.
.
Videiras
de bago grande. Videiras de vinho, claro – alguém há-de apanhar a fruta e fazer
o vinho que se beberá à sombra nos calores e no resguardo do tempo do frio. As
videiras se fossem árvores seriam a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal.
.
Um
olival antigo e secular, árvores tão mais largas do que um abraço. As oliveiras
da paz. Algumas até viram Cristo.
.
Uma
árvore de Natal.
.
Pássaros
a fugir de gatos que fogem de cães. Cantam e outros não mordem, só brincam.
.
Não é
muito para alegria, redes de balanço e preguiça.
.
Jardim
de florestas onde os corpos se deitam para fazer amor e depois suspirar comendo
frutas do pomar.
.
Floresta
de fruteiras onde os corpos colhem a saciação que o amor pedir.
.
Quero
por lá perder-te para te poder encontrar. Para nos deitarmos a fazer amor e
suspirar.
.
.
.
Nota:
Este trabalho anónimo faz parte da Colecção Real de Pinturas de Jodhpur, do
Museu de Mehrangarh – Índia. Trata-se dum conjunto de obras executadas entre os
séculos XVII e XIX, estando esta datada de 1830. A imagem que encabeça o poema
é um pormenor da obra em que Jallandharnath e a princesa Padmini voam sobre o
palácio do rei Padam.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário