digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quarta-feira, junho 25, 2014

Elogio à clínica Dentária de São Paulo – não é publicidade mas seja o que quiserem

Não tenho a certeza se valorizamos a boca, sobretudo por dentro. Desconfio que a boca é como as mães, só nos lembramos quando nos faz falta, por vezes já no outro lado da vida. Tal como uma mãe, a boca alimenta-nos.
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Dentro da boca cabem o doce, o salgado, o amargo, o ácido e o umami, e o prazer que deles se consegue. Mesmo quem não tem prazer ou grande prazer com a mesa tem preferências.
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Supostamente todos os dias lavamos os dentes, pelo menos de manhã e ao deitar. É uma obrigação de higiene e mesmo que não fosse seria de respeito por causa do hálito. Claro que há campeões como o alho ou a cebola, que se guardam e agarram tão bem que nem a pasta mais voraz os consegue retirar completamente.
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Bem, há a obrigação da lavagem, mas lembramo-nos deles quando nos doem e temos de correr para o dentista. Ou quando a velhice nos tira e a mastigação se torna difícil. Há as próteses, pontes, implantes, coroas, aparelhos, a cerâmica, o titânio, o ouro – alguns estarão repetidos, mas de material de boca percebo pouco.
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Por vezes os dentes zangam-se com os alimentos frios e quentes. Dão coices que lançam dores até aos ouvidos.
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Há a língua, que é uma chatice na cadeira do dentista, porque se mexe e dificulta o trabalho ao doutor. Quando a trincamos... ui! Dor tão incomodativa quanto a de morder as paredes da boca.
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A mesa – a boca por arrasto – é uma secretária para negócios vários, seja ela mesmo de tabuleiro e pernas ou seja no chão com os convivas à volta. Julgo que em todos os povos o momento da comida tem alguma solenidade. Do nascimento, ao simbolismo da procriação, que é o casamento, ao falecer.
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Reis e presidentes de república dão recepções em seus palácios em que o banquete é obrigatório quando o convidado é importante e se vai demorar uns dias. Há as chatérrimas conversações para comprar a porcaria dum tapete, supostamente exótico, nos países árabes. As boas-vindas nas tribos de toda a parte. Por aí, por aí e adiante.
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Há o protocolo da mesa, que se divide entre a habilidade de maneio dos apetrechos e o modo de manifestar satisfação ou falta de educação. Mastigar de boca aberta, causando sons pastelados e visões evitáveis, é comum nos portugueses – penso que nem se apercebem ou são procedimentos que estão de tal modo enraizados que não se liga – eu ligo. Há os arrotos que condenamos e outros aplaudem. Há o educado e respeitoso sorver ruidoso e o desagradável sorver ruidoso.
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A boca – se pensarmos bem nela – gosta que as comidas empratadas tenham uma ordem. Não por ritual, mas porque as determinações, convencionadas após experiência, mas porque os sabores vão-se completando e sobem nas intensidades.
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Há bocas que não gostam de vinho e outras que ganham tanto prazer. Alguns bebem de tudo e outros dispensam os aromas e sabores de cartão molhado ou os que lembram estribarias. Quem diz prazer enófilo pode considerar outra bebida.
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Quanto ao álcool existem pessoas que, por segregarem qualquer químico ou não segregarem – não sei – podem beber sem tino, porque o sopro não acusa penalidades nos testes do balão que as polícias efectuam nos auto-stopes ou nos acidentes.
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Quando me nasceram os sisos, os do primeiro andar doeram-me tanto que desejei ser uma ave ou enviar-me para o mundo dos espíritos. Doeram para não dormir uma semana inteira e para chumbar num exame de condução, por ter adormecido ao volante. Não fosse o examinador ter travado e um automóvel bem estacionado teria sido abalroado. Simpático, o senhor engenheiro, como eram conhecidos à época, compreendeu a situação e em vez de me chumbar escreveu que não tinha comparecido ao exame – é que uma reprovação podia (pode) mandar o candidato de volta para as aulas de código da estrada.
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Nessa semana, a do Natal ou do Ano Novo, consegui falar com o meu dentista. Não havia telemóveis nem emails e a clínica estava fechada. Ainda assim dei com ele, que prontamente deixou o descanso para me aliviar. Deu-me uma pirula mágica e a dor desapareceu... até às quatro da manhã, de madrugada, e fiquei em claro. Bem me aconselhou, o doutor, a não fazer exame de condução...
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Foi o meu dentista durante quase trinta anos, mas agora retirou-se. Disse-me, nessa vez, e lembrou-se noutras, que nunca vira sisos tão grandes. Até afirmou que pareciam dentes de burro. Ah pois que doíam como #*£@+$&!
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Desde então que não sei o que é uma dor de dentes. Tenho, por vezes, uns incómodos, umas coceguinhas irritantes... Como dizia, num inquérito televisivo de rua acerca do frio – uma vaga de frio polar, diz-se agora, dantes chamava-se Inverno – um ucraniano:
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– Frio? Frio é na minha terra, na Ucrânia. Isto é talvez fresquinho.
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Assim são as minhas dores de dentes. Doem? Doer foram os nascimentos dos sisos! Apanharam-me a boca, os ouvidos, os olhos, a testa, o humor. Porra! Os de baixo não incomodaram, o que me leva a crer que sou menos burro em baixo do que em cima – não sei se é bom se é mau, mas com a esperteza dos asininos penso que ainda bem, seja o significado o que tiver de ser.
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Bom, não vivo do vinho nem da comida, embora muita gente pense que sim. Ganho a vida a escrever sobre economia e agricultura. Por isso, a boca é-me muito útil. O olfacto também, mas escreverei acerca do nariz quando tiver de ser – só digo que o cheiro a pescado é cicuta e arsénico para nariz e entranhas gástricas.
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O sorriso! O das mães, oh! O das avós, oh oh! O do pai, sem oh! O dos avôs, leve oh! O dos amigos, qual oh?! O do ser amado, oh que dor tão boa! O da sedução, ai! O da auto-estima, hum! O da vaidade, qualquer coisa oh!
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Não me lembrei de escrever sobre a boca porque me olhei ao espelho e conclui o quão belo sou. Tal como os olhos, a boca fala e não me refiro à articulação dos sons, mas ao estado de ânimo.
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Lembrei-me de escrever, há já umas semanas, porque o meu dentista se retirou e eu estava com uma comichão num molar. Segui a sugestão da amiga Sissi e apanhei o metro até ao Cais do Sodré. Atravessei a avenida 24 de Julho, onde a Câmara Municipal de Lisboa se esqueceu de mandar pintar passadeiras para peões e de pôr semáforos, ladeei, pela estrada, a esplanada do Mercado da Ribeira que abusa de todo o espaço, virei à direita e cheguei à Praça ou Largo de São Paulo – acho que é largo, mas na realidade é uma praça e bem simpática, exceptuando o quiosque, onde os empregados são duma antipatia que roça a falta de educação.
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O Largo de São Paulo que, em tempos, frequentei à hora do almoço. Ia porque encontrei paz na Igreja para rezar. Sou cristão não católico e penso que se pode conversar, pedir e agradecer a Deus ou a entidades de superior moral e espiritualidade, mas ali tinha paz e o coração enchia-se.
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A Igreja de São Paulo, de suave barroco, estava a ser restaurada e já conhecia de vista as restauradoras, acho que eram só mulheres. Uma era bem gira, mas não reparava em mim, que estava tão solteiro e carente... ai! Ai, o #*£@+$&! Não gosto de intimidades postas a público e muito menos destas, cruas e verdadeiras.
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De regresso ao passado próximo; estava adiantado na hora e sentei-me nas cadeiras da esplanada do quiosque a beber uma Água das Pedras. Olhava para o número 19 e pensava: que saudades vou ter do meu dentista!... os dentistas são como os mecânicos de automóveis, quando encontramos um que nos satisfaz, mais ninguém nos mete os dedos na boca.
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Chegou a hora, subi ao primeiro andar, puxei a porta no sentido contrário e, como sou burro – confira-se no que disse o meu anterior dentista acerca dos meus sisos – insisti. O material tem sempre razão e cedi à realidade. Entrei e sorriram-me.
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Na mesa de vidro estão dois papéis. Um diz que tem livro de reclamações e outro que tem livro de elogios – tenho de escrever neste.
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Fui intervencionado e voltei. Voltarei até ter uma boca nova.
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Como bem sabeis, nestas crónicas gosto de pôr uma imagem ou um vídeo no blogue joaoamesa.blogspot.com e no infotocopiavel.blogspot.com é obrigatório.
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Não colocarei a imagem referente à clínica, pois seria publicidade e este é um texto de agradecimento aos doutores e à amiga Sissi, que tem um miúdo que conheci desde o berço e hoje é homem feito e alto como o #*£@+$&!
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Não é publicidade, mas devo colocar o linque para o sítio nainternet. É este. Ide, ide quando tiverdes dores ou quando as quereis prevenir.
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Nota: Pintura Bizantina de São Paulo, Escutura de Bernardí Roig, Pintura de Carlo Dolci de Santa Apolónia (padroeira dos dentistas», Vídeo do anúncio à pasta medicinal Couto.

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