digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quarta-feira, abril 23, 2014

Não há maçãs no centro do mundo

Uma obsessão é uma dor, um torpor, é a ansiedade do submarinista durante a guerra.
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Sofreguidão é sorver esparguete, ainda que doa de calor. (Basta!)
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O que é que há que lembre esses males?
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Um inverso, a promessa do deleite, do desejo concedido duma sombra numa tarde (de Verão).
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No Paraíso, pode ser, desde que não sagrado. No centro do mundo.
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Lá fora pode haver o caos e o desconserto das vidas. Dentro das muralhas do alcazar que se ergueu, por si, para satisfação dos corpos que obedecem às mentes eufóricas de adolescência tudo é paciência e eternidade. Foi por vontade de Deus.
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O centro do mundo é o que for, de apetites de apetecer, de esconder e mostrar os desejos que os odores e cores não conseguem mentir. Podem as palavras omitir, iludir, distrair, desdizer, a cor dos lábios conta tudo e as mãos tremem, levemente suadas do anseio.
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O centro do mundo. É um jardim de laranjeiras, onde o aroma dos figos disfarça os das ervas de cheiro, hortelã-pimenta, coentros, cidreira, funcho, manjericão, tomilho, alecrim, esteva, orégãos, carqueja e verdes de fruta rasteira.
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Dentro de muros, antes de chegar ao centro do mundo passa-se por alfarrobeiras e delas se colhem vagens doces para trincar, mascar, cuspir, rir, sorrir, rir. As últimas vergonhas descansam aqui e ficam até à certeza do abraço satisfeito do final.
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Depois, figueiras-da-índia e seus frutos difíceis de descascar. Espaço... espaço... espaço... grande, relativo, de chão verde de ervas verdes, passe o pleonasmo. Ciprestes, árvores de eternidade, consolo e lembrança, de calor e pores-do-sol quentes, desimpedidos de nuvens.
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Que bela será uma ilha com um ou dois ciprestes, vazia de tudo o mais. Essa é lenda. Fica para depois. Se um dia inventar, contarei.
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Dentro do jardim do centro do mundo, antes do centro do mundo... um quadro de oliveiras espalhadas, centenárias e milenares, retorcidas e com fruto. Não existirá árvore mais nobre. A árvore de Deus.
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Um jardim árabe – imagino-o assim, nem que seja num sonho, sonhado ao mesmo tempo, por um califa e a odalisca, a que ama e soma todo o harém e que o ama a ele também.
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No centro do mundo, que é o lugar mais próximo do Paraíso, não há macieiras aborrecidas. Árvores de fruto... uvas? Sim, também as há, mas não é o tempo de as querer (estão doces, como é perfeito o centro do mundo).
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Os dois caem, ajoelhados, com olhos de ternura e destemor. Vontade maior que a vontade. Tempo de acertar o tempo. Certeza da curiosidade e muito para saber.
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A brisa sugere melancia, que cria nascentes que beijos tentarão secar. Certo será as correntes de sumo levarem a boca nas enxurradas, entre beijos afogada. Cursos e caminhos regueiros, felizes e ingénuos, desaguando no mesmo mar, interior de água tépida.
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No centro do mundo, a água corre em ribeiros, caneiros de tijoleira, cruzando a sala sem paredes, arejada toda à volta, como um coreto, e continuando até à queda, que algures será rio. Azulejos, e abstractos de brincar, com as cores.
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A abóbada azul e ladrilhos brilhantes, asas de borboleta de cerâmica, surgindo e escondendo-se, tons de cores, iludindo os olhos e suspirantes. Música da água e da folhagem.
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Sem movimento, som ou sombra, um templo grego, redondo, de colunas dóricas maravilha em aparição, o pavilhão árabe, ainda que sagrado, faz-se pagão. Não há culpa que ameace Vénus ou empreguice Príapo. Existem, assim quer o Deus.
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Mas o resto está como se quer e é. Almofadas, cortinas como fantasmas, véus brancos translúcidos que intermitam as árvores.
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Molhados pelos rios de melancia, despem-se até que o calor arrefeça. Sem roupa; os pássaros entretidos nos afazeres do pomar e as árvores sendo árvores, sem fugirem e sacrificando-se.
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A floresta de cultivares mais próxima faz-se de laranjeiras, limoeiros, e loureiros? Palmas, tamareiras e figueiras. Mais umas que não sei.
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Nua, linda. Beijando de viva carne.
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Numa luta. Onde as mãos oram.
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A boca delicia-se no sexo e o sexo deliciado pede à boca que delicie o outro sexo.
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O yin e yang do pensamento feito droga, é a hesitação do já e do já agora e do espera um pouco e do faz tudo ao mesmo tempo e repete e continua. Respira, continua. Ou da vez única.
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Indo atrás: Entrar... suavidade. Calor e segredo, abraço aprofundante. Abraço de ficar, beijo de alívio. Volta-se ao mesmo. Volta-se ao mesmo. Mesmo que o mesmo seja um único.
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O rosa encarniça-se e dilui-se como o sumo da melancia. Não há boca que não queira refrescar-se nos suores do prazer da mulher. Não está mais o que antes, mas mais bonito, amado e saciante.
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E voltam-se as vontades. Voltam-se os corpos. Voltando-se e conhecendo-se, desejando o fim e querendo que seja longe. Esta vez como a anterior e a antes dessa e a antes dessa e se a houve a antes dessa e todas as que se desejaram e por alguma razão se guardaram ou adiaram. Ou que seja só uma.
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No final... limonada ou chá de erva-luísa frio... que se guarde o espumante a refrescar, para que a refeição comida à romana, na noite de cansar os corpos e aliviar as almas, seja toda riso. Falar e não falar, em silêncios que dizem e vozes de nada.
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Cansaço de bem, de pensamento branco, sem amanhã nem ontem. Estar e vagarosamente beijar. Se a sensualidade deixar, o Paraíso acolhe por mais. Se a vontade não se fartar.
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Todas as juras são mentiras, rebuçados. Dão-se e desfazem-se, ficam-se na memória. Fotografia de alma. O que se diz na cama fica na cama, e as juras são mentiras e os poemas de leito também. O que se diz à mesa é verdade.
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O tempo que o tempo tem e o prazer dos corpos invisíveis ficam guardados até que desbotem. Mesmo que lembrados, retoquem ou repitam.
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Invisíveis saem do centro do mundo. Rumores, os pomares guardam segredos, escondem os açúcares sensuais no doce da fruta. Os pássaros só cantam amor, ninguém os leva a sério.
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