digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

segunda-feira, novembro 25, 2013

Está frio lá fora

Queridas Flores, lembrei-me de vos escrever para, através das cartas,  que é só uma, conhecerem a mais exótica Flor. Sem maldade nem ingenuidade. Podia tê-lo feito antes, mas não me lembrei. O Natal aproxima-se e talvez a Lua na quinta casa dum signo me tenha criado a necessidade.
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Não podia esperar. Pensei deixar tudo para amanhã, mas tinha de ser agora; passa das quatro da madrugada e o assunto desarrumou-me a alma, e uma alma desarrumada não dá descanso ao corpo.
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Ocorreu-me que o Natal não tarda. É quase Natal, uma data solene, profunda e complexa, e íntima, e a nossa intimidade morreu, e a que temos é tão nossa que está incerta, como um relógio avariado e coberto de pó.
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Começo por ti, Flor Amarela, a primeira que desabrochou. Vesti a camisola de erva e servindo, olhando-me, não me vi nela. Não me pertence e nada farei para ta entregar. Não a deitarei fora, por respeito à dignidade duma peça em perfeito uso. Não a darei, porque não é minha. Desde 2006 que estava por vestir, talvez por causa destas razões, mas de forma inconsciente. Ainda bem que a usei. Agora vai para lavar para ser arrumada e aí ficar até qualquer coisa.
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Percebi que tinha de te escrever porque te quero contar a tua diferença face à Acima-de-Lírio, já que o lírio parece-me ser a mais nobre das flores; não é fatal como a rosa, nem singela como a margarida, nem fidalga como a tulipa nem pirosa como a orquídea, é simples como uma rainha. Não perdeste nem perdi. Hoje, por estes dias, sei que nem perdemos os dois num conjunto. Só perdemos tempo.
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Querias o que queria e dizias o que não querias, acreditando que era isso que querias. Compreendo que a minha incompreensão conduziu ao extremar dos dias do temperamento, aos dias e noites em que dois comboios numa mecha embatiam frontalmente. Não te culpo nem me culpo nem nos absolvo, porque, não me interessa. Todavia sem rancor ou mágoa.
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Ao contrário, a Flor de Luz quer o que quero e di-lo. Tão simples.
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Quanto a ti, Flor Vermelha, a situação é muito mais complexa. Houve momentos bons, razão da longevidade dos beijos.
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Mas foram anos de sobressaltos. Injustos, sei. As feridas a arder. Queimou-se o amor e vivemos com as queimaduras. Estão cá, e nem me lembro. Tenho-te sincera amizade, e chega.
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Ao contrário, a Flor de Luz dá-me tranquilidade. Cada beijo é aconchego. Só isso já me bastava.
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Minha querida Flor Verde, não querendo ser cruel, foste irrelevante. O quase que falta pertence à P.
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A Flor de Luz dá-me... tanto e ainda o Mais.
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Simpática Flor Azul, ninguém te tirará teres sido a primeira. E mais não há para dizer sobre esse século, além dum grande amor e do primeiro desgosto. Enganei-me, mas acreditei que foi bom. Amiga distante, mas amiga.
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Já a Flor de Luz dá-me o que nunca soubeste dar: sentimento de amor.
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Doce Flor Lilás, talvez a segunda Flor que mais adore. E tu tão quente que me queimavas a cada abraço, carta ou palavra, sem mal. Tantas vezes canalha, que digo, para me absolver, que foi a adolescência. Quero-te tanto e também ao M. Há uma amizade que os quilómetros não deixam.
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Por seu turno, a Flor de Luz tem uma leveza que respira.
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A Flor de Luz é mais do que isto. E jamais será mais do que a soma de todos os istos. As pessoas não se amontoam nos sentimentos e memórias, quando têm, porque terão sempre, uma gravura guardada algures numa cavidade do coração.
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O que é, digo-lhe. E tudo não sei. Quero toda a vida para saber e poder recordar enquanto souber amar e for deixado viver.
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Dos olhos nasceu a luz. A Flor de Luz.

1 comentário:

Anónimo disse...

Ora, finalmente, já não te queixas do calor!