
Se eu soubesse o que dizer, escreveria silêncio.
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Não sei o que fazer ao grande amor, em que armário o arrumar. De que armário o retirar. Se deixá-lo desarrumar-me a vida para me arrumar a vida. Se o conter para que não me estouvar os dias para me arrumar os dias.
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Bebo copos de água, como magia para engolir o problema e deixar o corpo o reciclar. Mas quem digere o amor não é o estômago.
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Não há magia que falte ao amor. Nem teimosia louca. Nem sofrimento, consentido ou não.
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Arrependo-me. Se pudesse voltar, mudaria quase tudo. Provavelmente teria o mesmo resultado.
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O destino existe, mas podemos mudá-lo. É como se não existisse.
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A dor é uma seda fina e resistente que sobrevoa a ferida. O sangue seca e encrosta-se, cicatriza… e a dor pode ficar.
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Assim está o meu grande amor: já foi, não se vê, não se sente, mas ficou a dor.
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Escrevo-lhe gratidão. Escrevo-lhe incompreensão. Escrevo-lhe tristeza e alegria. Escrevo-lhe certezas e aspirações. Oro por ela.
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Recebo o amor que a boca não me diz. Encontramo-nos quase todas as noites.
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Se amputasse onde está a dor, deixaria de ver a cicatriz que a suporta. Mas teria a do couto, que me lembraria a parte amputada.
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Se fosse sábio, guardaria para mim as infelicidades, as dúvidas e as intimidades.
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Mas nasci ou fiz-me ou quero ser poeta. Tenho de dizer tudo. Para que não me doa, para que me doa, para que finja, para que diga a verdade, para agradar, para assustar…
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Se eu soubesse o que fazer à vida… já aprendi a ter o coração longe da alma e do pensamento. Se eu soubesse o que fazer à vida, deixava-o voltar.
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Para tristeza, nasci ou fiz-me ou quero ser poeta. Na melhor das hipóteses ainda poderei um dia ser sábio.
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Se um dia souber o que dizer, escreverei um poema de silêncio.
1 comentário:
obrigada por ler o e-book João.
Já agora, fiquei feliz por teres voltado ao infotocopiável com mais frequência, bom te ler.
bjs!
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