É uma tarde inteira de tempo todo, de tempo vago, de tempo suspenso. É uma tarde de inteira de solidão anestesiada pela luz franca do Verão. Luz curva, que se curva nas horas do dia, de batimento nas janelas e orifícios de claridade nas paredes. Luz que se curva nas horas do dia, que nasce, cresce e envelhece no ano, que renasce a cada ano, todos os anos, como em todas as vidas.
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É um dia inteiro, esta tarde vaga e de silêncios. Um dia inteiro de solidão para que se possa levitar, ter esperança de voar. Ninguém vê. Ninguém se lembra. Ninguém sente. Só. Solidão no silêncio e deserto da casa.
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Lembro disso. Era miúdo e o casarão estava quase vazio de gente, só a minha prima velhota. Nos corredores entrava a luz possível, filtrada pelos vidros martelados e esgueirada pelo espaço deixado pelas portadas dos postigos. Brincava a uma espécie de macaca, uma espécie de pé-coxinho, sozinho, já se vê, sobre os ladrilhos com padrões do chão.
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Era o ar das manhãs prometedoras. Das tardes quentes. Das noites escuras. Era aquele tempo todo, entre a infância e a maioridade imaginada. Tinha tantos sonhos, que sonhava um dia não ter sonho nenhum. E realizou-se o sonho.
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Restam as tardes como esta. Todos os dias, meses a fio. Nem amores nem desamores. Só na vida, como no sono, como no sonambulismo. Um fantasma com corpo, com pouco para dizer e nada para ouvir. As tardes são longas e a vida curta. Uma tarde inteira de meia vida, de pouca vida. Um dia haverá. Um dia. Um dia.
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É um dia inteiro, esta tarde vaga e de silêncios. Um dia inteiro de solidão para que se possa levitar, ter esperança de voar. Ninguém vê. Ninguém se lembra. Ninguém sente. Só. Solidão no silêncio e deserto da casa.
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Lembro disso. Era miúdo e o casarão estava quase vazio de gente, só a minha prima velhota. Nos corredores entrava a luz possível, filtrada pelos vidros martelados e esgueirada pelo espaço deixado pelas portadas dos postigos. Brincava a uma espécie de macaca, uma espécie de pé-coxinho, sozinho, já se vê, sobre os ladrilhos com padrões do chão.
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Era o ar das manhãs prometedoras. Das tardes quentes. Das noites escuras. Era aquele tempo todo, entre a infância e a maioridade imaginada. Tinha tantos sonhos, que sonhava um dia não ter sonho nenhum. E realizou-se o sonho.
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Restam as tardes como esta. Todos os dias, meses a fio. Nem amores nem desamores. Só na vida, como no sono, como no sonambulismo. Um fantasma com corpo, com pouco para dizer e nada para ouvir. As tardes são longas e a vida curta. Uma tarde inteira de meia vida, de pouca vida. Um dia haverá. Um dia. Um dia.
7 comentários:
Uma vez fui ver uma exposição ao museu do Chiado sobre surrealismo. Fiquei fascinada com os desenhos feitos "a duas mãos às cegas". A folha dividida ao meio, tu desenhas deste lado, eu desenho deste, depois desdobramos a folha e contemplamos a simetria concêntrica que criámos às apalpadelas. Deviam ser os surrealistas a fazer os testes Rochard.
ah, esqueci-me de acrescentar, isto tudo porque ao ler o teu texto de hoje me pareceu que ele surgia do outro lado da folha de papel do meu...
essas obras designam-se de cadáveres esquisitos. também se fizeram em literatura. quando andava na escola fazíamos essa brincadeira; um escrevia uma frase numa linha e deixava uma palavra na seguinte. tapava a sua frase e o outro escrevia uma frase a partir da palavra deixada, e assim por diante.
lembro-me disso, fazia com o meu colega de carteira, o Zé. Lembro-me que às tantas, era uma história sobre um koala vindo do espaço. Depois ele começou a fumar ganzas e fartou-se. Muito antes disso, nas aulas de português do 11º ano, ele costumava-me dizer (sempre que as aulas eram sobre Garret), "olha, já agora, lembra-me de cortar as unhas dos pés... não, nenhum de nós queria saber sobretudo não de Garrett
dizia eu para a setôra: arret, arrete, oh Garrett
e diria que essa das unhas dos pés era um convite desastrado para um estado de maior intimidade. devia tê-lo beijado ;-)
Nunca me passou pela cabeça beijar o Zé e acho que o Zé também nunca me quis beijar. Ele era sobretudo, já nessa época, um provocador...
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