Algumas pessoas sabem voar. Há quem faça até vida disso: os trapezistas circenses. Uns voam com rede e outros ousam voar despidos de protecção. Mas os que mais aprecio são os amadores, aqueles lançados voluntariamente para o céu. Não sei se se querem apanhar uma estrela da nebulosa de Orion ou apenas sentir o ar a passar-lhes pela pele e carne.
Por mim, se tivesse coragem, também voava sem trapézio. Faço-o quando digo que amo a mulher das minhas insatisfações; caio muito depois de lho dizer e sinto bem quando acabo de mergulhar. Insisto sempre em recuperar, em subir, em lançar-me de novo na frase de amor. Ainda e sempre o mesmo sentimento e a perdição descontrolada, o beijo desamparado. Só esse é o meu vôo sem trapézio.
Se pudesse e tivesse coragem voava mesmo dum penhasco e pelo caminho apanhava uma estrela; faria umas cabriolas no vazio, a meio caminho, se a mulher das minhas insónias estivesse a ver, porque assim de mim se enamoraria e se me aquietariam os sentimentos. Depois voaria com ela sem trapézio e sem rede, porque o amor só o é quando livre e sem condições. Por enquanto vou sonhando com nebulosas de Orion.
2 comentários:
Que bom que é poder voar sem trapézio e sem rede, deve ser a melhor sensação de liberdade do mundo. Hoje aliás sinto-me exactamente assim livre, como um passarinho, só espero que não abra a época da caça, porque ai meu amigo, começa o meu terror...
Eu sou dessa raça, eu sou das voadoras amadoras e gosto de ser assim. As vezes em que sofro por assim ser é só por solidão em extremo mas logo vem um pensamento, um quadro, uma melodia, uma voz, ou um texto como o teu a mostrar-me que não sou eu que tenho que mudar. Voar, voar e voar...cair e cair e cair
"pra me levantar, pra te puxar, te fazer sorrir, não voltar a cair..."
é assim que sonho. É assim que vivo.
Obrigada João.
Enviar um comentário