
Negas-me como se eu fosse defunto, fazes-me um fantasma, mas não estou longe de ti. E ainda que o fosse estaria perto a velar como um anjo da guarda.
Na verdade nunca estou muito longe, porque vives em mim, como vivem todos aqueles amados, até os partidos. Na verdade vives em mim e não há dia que não te lembre e julgo que não há noite em que não nos encontremos, levados por mestres, para aprendermos mais da vida e de nós.
A vida passa por minutos rápidos e segundos longos. A vida passa e tudo na vida passa. Só eu em ti não passo. Nem tu em mim. Estás viúva de mim, e eu ainda vivo. Negas-me a vida e tudo o que a ela está agarrado.
Estás viúva de mim e não serás livre enquanto fores viúva. Não te darás enquanto a castidade e o pudor te enclausurarem a cabeça em virgindade. Estás viúva e não enterraste o morto, mas tens vivo o defunto marido. À noite encontramo-nos, levados por mestres, e aprendemos as letras e fazemos contas às vidas.
De dia voltas a ser viúva e eu fantasma. Porém, sem saberes estás grávida duma amizade e nem vês a barriga grande e o sorriso a fazer-se. Um dia acordarás, viva ou morta, e terás diante dos olhos o que agora escrevo. Serás, então, mais livre e feliz.
2 comentários:
Incrivelmente verdadeiro!!!
conheço casos assim...
a descrição é magnifica.
n te vou elogiar em rel à qualidade do texto pq ainda ficas vaidoso...
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