digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

sábado, junho 24, 2006

Questão cardíaca

O que fazer com um amor antigo? Esta não é apenas uma questão retórica. Aliás, o que se faz a um amor que não serve? Para que serve um amor que não funciona?... presente ou pretérito, tanto faz.
Resposta simples:
- Recicla-se em amizade!
- Bingo! Mas, como é que isso se faz?
A história dum homem de sucesso: o reciclador ideal. Todas as ex-namoradas transformaram-se em amigas, sem dores de cabeça nem mal-entendidos, tesões espotâneos, bebedeiras infelizes, apetites vorazes e justificações para instintos. Este homem faz isto porque quer e nem precisa de se controlar, a coisa sai-lhe com fluência. Para os que não perceberam, os desafortunados neste dom e os outros: basta querer! (Livros de auto-ajuda por escrever e publicar)
Agora o insucesso do homem: um dia chegou em que uma namorada deixou de o ser e não quis ou não soube ou não pôde amigar-se, donde resultou confusão.
Os muitos anos que estiveram juntos somam-se e cortam-se numa linha de subtrair, porque um caso episódico é, absolutamente, mais importante. O fenómeno é estranho, quase um triângulo num círculo. Triangular porque tem três vértices. Redondo, porque não tem ponta por onde se lhe pegue.
Ela escreve cartas aos Pés e até jura que a primeira vez que foi além do Tejo foi com com os Pés. O Carro que a lá levou esconde-se numa garagem, quase envergonhado de lhe ter mostrado o Alentejo. Ela escreve cartas aos Pés, como se tivessem sido os Pés a mostrarem-lhe o mundo durante tantos anos... esqueceu-se de tudo o resto. Os Pés são os Pés, normalmente estão no fim do corpo e têm a importância de estar em baixo, mas para ela são os parceiros, os amigos, os fixolas, os Pés é que a compreendem. Os Pés merecem todas as atenções: eles vão à calista, à pedicure, à música, têm direito a cartas, dedicatórias, glosas e floreados.
O Carro que a levou por muitos e longos anos, que passou com ela por todo o lado, é velho e traste... Ela hoje até desmente o Carro, quando diz tê-la levado ao Alentejo...
- O que fazer com um amor antigo?
- Não sei? Se fôr um traste, deita-o fora.
- Mas há corações que são tóxicos... E de toda a forma tenho muito amor a este coração!
- Então guarda, pode ser que um dia o possas reciclar.

Sem comentários: