Irei sempre lembrar-me dos meus mestres. Escrevo o que pretende ser um agradecimento aos três que partiram do mundo material.
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O Eduardo Guerra Carneiro deu-me, numa generosidade que ele próprio talvez não soubesse, transfusões de conhecimento e de sensibilidade. Sabedoria de poeta, mesmo quando não estava a poemar. Confesso que li pouco do que escreveu, mas o que me passou pelos olhos é grande.
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Não me tornei jornalista por causa do Eduardo. Contudo, a visita guiada ao Diário Popular é, ainda hoje, maravilhosa e a memória tem uma distância de quarenta anos. O jornal tinha uma dimensão enorme, da vida dos telefonemas e do teclar nas máquinas-de-escrever à vida dumas máquinas muito maiores que ruidosamente coloriam o papel com as palavras que seriam lidas pelo público.
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Fui parar ao jornalismo por causa dum desgosto de amor. Não sei se o consolo não deu em castigo… a desgraça original já não me dói e a moça ficou sempre amiga. A outra? Enfim. Assunto terminado.
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Em meados da década de noventa achava-me maduro, consciente que aprendera com bons mestres e amigos: o Goulart Machado, o Maurício de Carvalho e o Mário Rosendo. Os dois primeiros foram muito pragmáticos: diziam o que pretendiam, liam a minha escritura, explicavam e mandavam-me alterar o entendiam. Além do Eduardo, que foi mestre sem nunca ter trabalhado com ele.
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O Mário quase me dava reguadas. Eram castigos e gargalhadas. Não foi com bê-à-bá, ensinou-me com o riso e o açoite, desde o picar-o-ponto até ao apanhar o táxi após uma noite de copos.
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O Eduardo, o meu primeiro mestre, não era dado a graças, embora se risse sempre com as minhas anedotas e disparates, mesmo quando não gostava. Nessa vezes comentava curta e amistosamente:
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– Oh Barbosa!...
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Penso ter sido humilde, no início… possivelmente até mais uns aninhos. A realidade pode ser parede ou almofada, ou pedra almofadada. Volto atrás: em meados da década de noventa achava-me maduro, consciente que aprendera com bons mestres.
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Estava no Diário Económico e um dia sentou-se à secretária à frente da minha um homem de meia-idade com um bigode anacrónico. Pareceu-me seco, quase sisudo, e aborrecidamente chefe. Essa impressão durou «cinco minutos».
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O João Paulo Guerra ensinou-me que nunca se sabe escrever, vai-se aprendendo, permanentemente, a grafar e a pontuar o que se vai pensando, exigindo cogitar melhor. Não me disse como bê-à-bá, bastou-me despachar trabalho com ele e receber transfusões de humor.
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Portanto, deu-me com uma pedra almofadada. Ainda hoje me dói essa felicidade.
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Um dia o João apareceu sem bigode. Pareceu-me bem, mas esquisito. A impressão durou «cinco minutos». Comentei, a depilação, com o Eduardo, que usava barba. Uns tempos depois, num jantar, disse-me que se tinham cruzado.
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– Tens razão, ficou esquisito.
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A impressão deve ter-lhe durado os mesmos «cinco minutos».
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Só para memória futura: o Mário, igualmente amigo do Eduardo, também usava bigode. Era um aristocrático à moda de Eça de Queiroz. Aliás, tinham parecenças fisionómicas. Porém, essa cabeleira facial, esteticamente mais antiga, parecia-me menos anacrónica do que a do João… sei lá... que mais tarde deixou crescer a barba.
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O Eduardo tem razão: isto anda tudo ligado.
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O Mário partiu há trinta anos e o Eduardo há vinte. O João foi, há dias, ter com eles. Porque acredito que a morte não existe, suspeito que estejam os três à conversa.
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Na lista dos meus defeitos não consta a ingratidão. Estou grato ao Mário, ao Eduardo e ao João, não pelo que me ensinaram, mas pelas suas amizades. Apesar da amizade não se agradecer.
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Como não acredito na morte, reafirmo que, provavelmente, estão os três à conversa.
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Nota: Guardo, obviamente, gratidão ao Goulart e ao Maurício. Espero encontrar-me com eles, sempre para um curto prazo. Mas a recente partida do João obrigou-me a elogiar os que fecharam a edição na Terra.
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