– O que fui fazer?
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Questão salva-vidas, faço-a antes de mergulhar e oiço-a antes de partir como se tivesse chegado.
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Fico pairando vendo-me indeciso e, às vezes, choro e, às vezes, apático-me.
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Não importa, porque o que a cabeça sente já a boca disse.
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Ainda assim, ninguém me vê despido na rua. Sinto vergonha como se reparassem.
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Porque a boca já disse, recair é mais triste.
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Saberem-me é um corte da desgraça. O infortúnio é uma humilhação.
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Perguntei, esperando uma resposta de bom conselho:
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– E agora, o que fazer?
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Ter-me-ão respondido ou alguma centelha minha recitou?
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Andarei pardo, mais do que andei. Serei uma janela fingindo uma luz. Calar-me-ei como não é devido.
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Que ninguém saiba.
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– O que fui fazer?
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Questão salva-vidas, aproximada dos 400 miligramas azuis, mas sem o sorriso da ilusão.
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O bicho vive e morde e nem sempre as azuis, balas-de-prata ou a estaca, o acalmam e lhe dão sono.
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Abri as janelas antes das paredes me fecharem sem elas nem portas nem lâmpada. Faço a pergunta.
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Fui para a chuva – agora chove – levando nos olhos todas as maldições e promessas que carrego.
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Sob a água caminho rezando a salvação, crendo diluir os feitiços e desdizer os juramentos.
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Quando morde, mordo-o com azul, brado-lhe a devolução dos enguiços e o desatar dos votos.
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Hoje, não. Estou cinzento entalado entre as lágrimas e a letargia.
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Faço a questão e desminto, o mais teimosamente destemido, toda a ditadura que me deseja.
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Hoje é difícil e amanhã não precisarei de perguntar.
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Não vou passar essa vergonha!