digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quarta-feira, março 22, 2017

Chovendo luz

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Sou sala de velório em noite de vigília, fogo que não se apaga e fogo sem começar, odor grave das flores e as fitas roxas com letras de ouro.
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Na solidão de ser-se só, recluso e melancólico, traído e sem vingança, na vida desmoronada, nem o sono é mãe.
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Vejo um piano que toca, sem ninguém, mãos de me apertar sem segurar, a angústia. Na casa de negrum espesso não há portadas para rasgar nem gatos.
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O tocar de valsa lenta, esmorecida de texto viúvo declamado em tino insensato, esse pairar dos olhos fechados, inebria como o vinho em jejum.
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Indiferente é mentira. Seria saciado, desencarnado por desejo, se obedecesse à transgressão, não me faltasse o instante e já o tempo é demorado.
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Disseram-me da tepidez do céu azul e do frio que enrijece o carácter. Uns silabaram e outros mansamente, se fosse vontade a melancolia e a angústia, o pulsar para o fim, se cobiçasse açoitar com a aflição.
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Se eu fosse mentira e não isto. Em felicidade leviana disseram-me que chove luz. O coração-cérebro-fígado é um calabouço.