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Porque tenho de escrever algo de piroso. Talvez seja mau
escritor, talvez apenas medíocre. Agora quero ser mesmo de palavra fácil, de
balão soprado – não voa, mas rabeia no ar como uma bicha tresloucada. Alinhavar
uma coisinha – coisinha, alinhavo – vazia, de cor berrante duma fancaria de plástico e
inutilidade. Posso não ter talento e alguma ilusão e agora esforço-me para um
aforismo gravado a esferográfica na madeira da porta da casa-de-banho duma taberna,
sem essa humildade, próxima da estação de Santa Apolónia ou de Campanhã, onde o
café custa os mesmos sessenta cêntimos da regra e que mais custa tragar, por rasca,
queimado e mal tirado, acomodado no odor dos fritos agarrados aos azulejos disfarçando imundice com
cores e baixo-relevos com formas infernais – ao olhar de quem um dia comeu, nem que fosse numa só
ocasião, com talheres de christofle –, porque o exaustor é dormente e o óleo fica
para que dele não se venham a sentir saudades. Um lugar-comum de filosofia
arguta de pensador esporádico, filósofo inspirado pela iliteracia que tanto disserta macroeconomia, geoestratégia,
engenharia civil, honradez compatível com chico-espertice, sabedura da
universalidade da desonestidade dos políticos e teorias da conspiração enquanto
conduz um táxi. Antes de banalizar a escrita, mesmo quando inspirado, há o
lamento dos lingrinhas desdentados e dos obesos, de gula morta à paulada com
batatas fritas de pacote, pastelaria artificial e chocolates de cacau imitado;
todos são uma colecção dos «E» qualquer coisa, que os ingestíveis trazem pintados
nos plásticos, para disfarçar impensáveis deglutíveis, assustando incrédulos
preguiçosos, certos de que causam cancro ou perda de líbido ou queda do órgão
sexual. Sem este lamento, toda a mediocridade é medíocre.
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Proclamo o aforismo:
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– Se não há dinheiro, não há palhaços! Se não há dor, não há
poema!
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Já está! Só falta puxar o autoclismo.
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Nota: Detesto palhaços. Este quadro...
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