digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quarta-feira, abril 29, 2015

Por que sou do Belenenses? Porque escolhi!

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Há perguntas irritantes e persistências idiotas. Compreendo e não respondo torto, porque a realidade portuguesa convida a esses raciocínios. Volta e meia perguntam-me qual é o meu clube.
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– Sou do Clube de Futebol «Os Belenenses».
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– Sim, mas de que clube?
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– Do Clube de Futebol «Os Belenenses», já disse.
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– Quem é que queres que ganhe o campeonato, o Sport Lisboa e Benfica, o Sporting Clube de Portugal ou o Futebol Clube do Porto?
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– O Clube de Futebol «Os Belenenses».
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– Não tens um segundo clube? Não acredito!
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– Tenho, pois.
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– Ah! Vês?! E qual é?
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– O Clube Oriental de Lisboa.
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Obviamente que não tenho uma segunda equipa. Nem o Oriental merece ser a segunda equipa de ninguém. É o clube de quem o ama acima de qualquer preferência alternativa. É o que fica mais perto de minha casa e isso dá-me algum conforto.
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A pergunta é recorrente, porque neste país, de batotas com décadas, está convencionado que só três clubes podem ganhar campeonatos. E já agora, uma das conquistas do 25 de Abril de 1974 foi o Futebol Clube do Porto começar a vencer competições.
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Embora Américo Thomaz, derradeiro presidente da República do Estado Novo, ser adepto do Clube de Futebol «Os Belenenses», tendo sido seu presidente, em nada a instituição foi privilegiado. Não nego que o Sport Lisboa e Benfica e o Sporting Clube de Portugal têm, tiveram sempre, mais adeptos. Os clubes não eram do regime, o poder político é que apanhava a boleia para ter créditos populares. Ajudas que nunca foram recusadas, cumplicidades.
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Quem espreitar a história verá que, nos primeiros anos das competições, havia mais equipas a ganhar. O Marítimo, por exemplo, foi um caso de claro castigo, penalizado por causa da insularidade.
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Claro que sendo do Clube de Futebol «Os Belenenses» quero que a minha equipa vença todos os jogos e ganhe todas as provas e todos os anos.
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Quero e não quero. Só não quero porque – perdoar-me-ão os companheiros azuis – faltam contendores. O futebol é Portugal costuma ser um secador exactamente porque o resultado está «viciado» à partida. Que bom seria ter seis, sete, oito, nove, doze, quinze equipas que, alternando-se, pudessem ganhar.
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Não quero falar das batotas, dos prolongamentos, dos fora-de-jogo, dos penáltis, que são evidentes e batidos. A maior trapaça é a dos empréstimos, que um modo antidesportivo. Se ainda ocorressem entre clubes de diferentes campeonatos… Os atletas são cedidos, mas não jogam contra o «seu» clube.
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As equipas B são outra batota. Os três suspeitos do costume insistem que a Primeira Liga ganharia se tivesse menos clubes. É mentira! Eles ganhariam, com poupanças em deslocações e sem as maçadas de mais jogos, que podem, eventualmente, comprometer as carreiras europeias.
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No entanto, têm equipas na Liga de Honra, onde despejam reservas, dão rodagem e abastecem a equipa principal. É batota! São dois campeonatos e uma equipa, pois a outra é virtual. Além de que não os incomodaria ter trezentas equipas na segunda liga, aí já não há racionalidade financeira.
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O Clube de Futebol «Os Belenenses» nasceu em 1919. À data, a minha família vivia em Belém, nela respirava-se e transpirava-se e suava-se de emoção pelos azuis. O meu tio António e o meu pai foram sócios à nascença, em 1921 e 1924.
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Por fartos das batotas – que são antigas, como o roubo das Salésias, uma ajudinha aos clubes do regime – aborreceram-se do futebol, mas nunca deixaram de ser Clube de Futebol «Os Belenenses». Sofriam menos e distraiam-se da porcaria à tona das competições.
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Um dia – não há tantos anos assim – os filhos do meu tio António organizaram um almoço em Belém. Um dia de Sol que exigiu esplanada. Sentado de frente para um prédio, um dos octogenários levantou o olhar e reparou na placa da antiga sede do Clube de Futebol «Os Belenenses». Deu uma cotovelada ao irmão e ficaram os dois em silêncio com os olhos molhados.
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Vim ao mundo em 1970. Chegado à escola primária, lembro-me, como se fosse hoje, de ser rodeado pelos colegas:
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– És do Benfica ou do Sporting?
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– Sou do Belenenses.
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– És do quê? Do BENFIIIIICAAA ou do Sporting?
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Percebi que tinha de ser do Sport Lisboa e Benfica. Na década de setenta os encarnados ganhavam quase sempre. Neste país de piranguices e arranjinhos, o natural é os miúdos, fascinados com as vitórias, se deslumbrarem com os vencedores – daí a razão de haver tantos jovens portistas em Lisboa, o que não me faz sentido.
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Criança, ingénuo, um bocado desalinhado, frágil e com outras intimidades que me abstenho de contar, tornei-me num benfiquista pouco interessado. A equipa da turna vestia-se à Sport Lisboa e Benfica e lá tive de comprar o equipamento completo, com emblema, número e chuteiras. Aselha, não pude escolher. Como ninguém queria, só sobrava o Bastos Lopes, defesa direito, eficaz e discreto, incontestado número dois.
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Esforçava-me para ser do Sport Lisboa e Benfica. Toda a família do lado do meu pai era e é do Clube de Futebol «Os Belenenses». Do lado materno, são do Sporting Clube de Portugal. A minha mãe adoptou os azuis. Manuel Jorge respeitou a «minha escolha» e, com sentido democrático e de cavalheiro, disse-me:
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– Vais ver o Museu do Sport Lisboa e Benfica e o Estádio da Luz, mas vais também aos do Sporting Clube de Portugal, do Clube de Futebol «Os Belenenses», do Atlético Clube de Portugal e do Clube Oriental de Lisboa.
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Na verdade, verdadinha, não era do Sport Lisboa e Benfica, era do Nené. Adorava ver aquele cavalheiro – e o melhor jogador que vi – que não se sujava. No final da carreira ficava no banco. Com a equipa em padecimentos, sem vencer e a precisava, entrava em campo, já a segunda parte ia adiantada. O relato omitia-o, como se lá não estivesse. Quando o jornalista dizia o seu nome era sinónimo de golo.
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Sim, ouvia os relatos do Sport Lisboa e Benfica, mas era do Nené.
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As palavras «tudo», «nada», «sempre», «nunca», «todos» ou «nenhuns» são perigosas, batem-nos sempre à porta desmentindo-nos. Recuso aquela «verdade» de que uma pessoa pode mudar de casa, mudar de cidade, mudar de mulher, mudar de amigos, mas não muda nem de família nem de clube.
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Abomino esse primado. Prefiro a parábola do filho pródigo, o tresmalhado que regressa à casa de Deus – com as devidas ressalvas.
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Sou do Clube de Futebol «Os Belenenses» não porque «nasci Clube de Futebol “Os Belenenses”» ou porque me obrigaram ou determinaram ou influenciaram de modo, mais ou menos, autoritário. Sou do Clube de Futebol «Os Belenenses», porque o amo, porque o escolhi, como se encontra um amigo.
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Contudo, falta a explicação de por que me tornei Clube de Futebol «Os Belenenses». Hoje sei que sempre o fui, ainda que tenha vibrado com o Sport Lisboa e Benfica… com o Nené.
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Na época de 1981/82 o Clube de Futebol «Os Belenenses»» desceu, pela primeira vez, de divisão. A tristeza foi tão grande, tão grande, tão grande, tão maior do que qualquer alegria que alguma vez me dera o Sport Lisboa e Benfica – e eu apanhei anos áureos dos encarnados – que percebi que era (sou) do Clube de Futebol «Os Belenenses».
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No ano anterior, o Sport Lisboa e Benfica tinha vencido o campeonato e naquele fora o Sporting Clube de Portugal e no seguinte o Sport Lisboa e Benfica. Nada a fazer! Clube de Futebol «Os Belenenses». Obviamente Clube de Futebol «Os Belenenses».
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Acerca desta minha opção adapto uma anedota:
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– Casaste por amor ou por interesse?
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– Casei por amor! [porque interesse não tem nenhum].
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O resto da anedota não faz parte da explicação, a segunda parte. Não tanto por de mau-gosto, mas porque quando me assumi azul já a equipa estava na sua fase complicada, sem o tal «interesse».
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Olhando para o passado, desculpo-me pela pressão que me obrigou «a ser» doutro clube e pelo prazer de ver jogar o Nené. Que pena tenho que esse craque nunca tenha vestido a camisola azul.
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Há uma «coisa» que me infecta o bom-humor, que é a do «quarto grande». Há uma hierarquia? Como se estabelece? Pelos ganhos ou pelo amor que ultrapassa o sofrimento? Pela resistência? Persistência? Pelo inexplicável?
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–  O Clube de Futebol «Os Belenenses» é o quarto grande?
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– Não há quatro grandes! Essa ideia agonia-me.
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– Porquê?
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– Porque traduz a viciação e o desgosto futebolístico em Portugal.
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Há centenas ou milhares de clubes em Portugal e todos merecem o mesmo respeito. Reportando-me apenas aos que jogaram nas principais competições, o que é ser-se grande? Ter muitos adeptos? Ter muitas taças? Ter um grande passado? Ter um grande presente? Ter muitas esperanças? Jogar sempre para ganhar? Ter privilégios das estruturas organizativas?... secretarias, ajustes, ajudinhas, batotinhas, batotas e batatinhas.
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Como os miúdos no primeiro dia de aulas:
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– Qual é o maior clube de Portugal?
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– É o Clube de Futebol «Os Belenenses»!
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Não é o quarto grande, nem o terceiro, nem o segundo nem o primeiro nem o quinto nem o vigésimo. É um grande por tudo o que é, por todos os que foram e pelos que são. Como grandes são as equipas que merecem um apoio que não se partilha com qualquer outro, cujos adeptos têm uma só preferência e querem lá saber da vitória doutras equipas.
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Nota: Infelizmente para o futebol em Portugal, só há cinco equipas que ganharam o campeonato da Primeira Divisão e há apenas nove equipas que jogaram mais de metade dos oitenta campeonatos (o actual é o octogésimo primeiro) da primeira divisão:
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– Sport Lisboa e Benfica: 80.
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– Futebol Clube do Porto: 80.
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– Sporting Clube de Portugal: 80
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– Clube de Futebol «Os Belenenses»: 73.
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– Vitória Sport Clube: 69.
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– Vitória Futebol Clube: 66.
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– Associação Académica de Coimbra: 62.
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– Sporting Clube de Braga: 58.
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– Boavista Futebol Clube: 51. 
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Seria tão mais interessante se fosse como em Inglaterra!

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