Apresenta-me esse sono que cai como morte se a morte
existisse. Que um sonho desentedie a noite e acorde aliviado.
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Apresenta-me uma memória, lembra-me um sentimento. Um concerto,
um charro, uma noite, uma bebedeira, um momento tine.
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No relvado a dançar. No relvado deitado. No concerto a
curtir. A namorada e um cigarro, e não fumando. Ah, o charro...
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Deitado sob as estrelas diluídas pela cidade. Deitado encaixado
na namorada. Ela fumando e ouvendo o concerto e eu ouvindo e vendo-a,
apaixonado e com uma tesão descarada, suspensa pelo momento e sentimento
pré-consciente da poesia e fragilidade do momento. Sim, sabia que me haveria
sempre lembrar. Sim, sabia que me haveria de esquecer. Sim, sabia que um dia,
muito mais velhos, numa conversa tranquila, despida de nostalgia, me haverias
de lembrar.
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Onde foi pouco importa.
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É uma memória rescrita, não inventada. Um tapete de momentos
e virgindades. Foi tudo há muito tempo e no muito tempo cabe muita gente e no
muito tempo cabem muitos eus e muitas noites e dias, dos alvoreceres às
madrugadas.
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Pode ter sido num lado qualquer contigo, sejas tu quem
fores.
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Sejas tu quem fores, amei-te. Com a brevidade e intenção dos
zetários. Tanta borbulha na alma e por dentro da cabeça. Tanta certeza de tanta
ignorância.
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Ainda hoje me apaixono. Infelizmente, a virgindade passou e
quase nada deslumbra.
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Os teus olhos castanhos, escuros pela noite, brilhavam e
tinhas a boca tranquila. Estavas a ouver o concerto e eu estava apenas contigo
e queria beijar-te, para perceber que não gostava do sabor dos cigarros.
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Nesse tempo difícil, o da borbulha, estavas lá. De lá
ninguém te tira. Nem da memória que não me lembrava e que me recordaste.
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Sejas tu quem fores, quando penso para trás percebo por que
amava. Se penso, era capaz de te amar outra vez, quisesse Deus que me
renascessem borbulhas no pensamento.
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