Roubaram-me o Natal na segunda classe, se não estou em erro. A turma estava divertidíssima na sala de aula, em balbúrdia discutia a existência do Pai Natal. Alguém, mais do que um, desvirginou-me o imaginário e fodeu-me as ilusões: não há Pai Natal. Fiquei a saber que os presentes eram dados pelos pais, avós, irmãos, padrinhos, amigos. Não passei a gostar mais deles por isso, mas fiquei órfão de Pai Natal. Malditos comunas e sua educação materialista!
Alguém me ofereceu, um dia, um disco chamado o Natal das Crianças ou dos Artistas ou dos Operários. Não sei bem. Era uma coisa com poetas e cantores ligados ao PCP e que, cheios de boa vontade, me irritavam o Natal: era a nobreza Natal dos trabalhadores, o pouco valor do Pai Natal... enfim, uma série de juízos de valor que queimavam a poesia e a magia da época. Sempre detestei o disco. Só nunca o parti, porque achei que era melhor guardá-lo para o partir em melhor ocasião.
Bem que podia ter acreditado mais uns anos. Mesmo assim, continuei a escrever cartas ao Pai Natal até aos dez anos, ou assim, não sei. Chegou a adolescência e partiu a criança e suas magias, partiu-se o encanto do Natal, a família desistiu da quadra. Anos mais tarde, já adulto, conheci a Rita, que me deu novo significado à festa. Houve um dia em que a Rita se foi e voltei a ficar sem Natal.
Mas neste tempo todo aconteceu o Sérgio e família que me acolheram, normalmente não na consoada, mas na noite de 25... ou nas duas. Grande amigo de infância, este companheiro. Hoje, este ano calhou a 24, lá vou eu jantar (bem) e apreciar a sua amizade. E não posso esquecer de referir os manos Vasco e Paulo, que muitas vezes me incluiram na consoada.
Amanhã, como sempre, almoço com os meus pais. Nunca se fez consoada lá em casa, mesmo quando eu era miúdo. Nunca me disseram porquê, nunca me interessou e nem quero saber. A refeição da época é a do almoço de 25. Mesmo quando era miúdo, era na manhã de 25 que eu abria os presentes. Adorava abri-los e correr com eles para me enfiar na cama da minha avó, que, coitadinha com o frio, gostava de ficar até mais tarde em repouso; fazia bem.
Não ligo ao Natal, mas não tenho nada contra. Não obrigo ninguém a acompanhar-me nesta minha preferência. Simplesmente, não ligo. Uma vez até fui entrevistado para a Sábado acerca disso. Mas a coisa não correu muito bem, quero dizer, o que disse foi interpretado e escrito de forma diferente. O jornalista tanto queria que assumisse uma posição anti-Natal como me perguntava se eu não tinha uma árvore de Natal em casa ou um presépio. Devia fazer-lhe confusão ou não sabia o que queria. Depois, a minha indiferença face à quadra tornou-me numa espécie vítima da subentendida aleivosa Rita que me obrigava a padecer os castigos natalícios. Para terminar, tinha-lhe contado que houve um ano em que saíra para os copos na noite de Natal e que encontrara um bar com mais gente como eu, que não ligava à festa. Pois o cromo, colocou-me a experiência no futuro e garantiu que eu até iria pagar um copo aos amigos, pois, afinal de contas, era Natal. Burro!... ou manipulador!
Bem, se hoje o Natal me é indiferente é, por certo, graças ao materialismo dos comunas, que pensam que isto do Natal é ópio do povo, conversas para entreter velhinhas e sei lá que mais. Lixaram-me o Natal e agora não há nada a fazer. Tenho neuras enormes nesta quadra.
Enfim, isto tudo para chegar onde vou chegar agora. Não ligo ao Natal, mas não quero que me tomem por mal educado. Por isso, aqui ficam os votos de feliz Natal. Alegrem-se.
Nota: Peço desculpa por não ter nada de bonito para vos oferecer além deste texto. Nada de bem escrito ou de interessante, mas o blogue é meu e apeteceu-me partilhar estas intimidades.
1 comentário:
Feliz Natal João.
Virgínia
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