digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quinta-feira, maio 04, 2006

Lembro-me de 1989

Lembro-me duma grande molha em Wexford. Naqueles tempos chovia muito. Naquele ano as ervas dos campos não estavam muito verdes, apesar de estarem mais absolutamente verdes do que alguma vez vira. Aquele ano, na ilha, o Verão durou todo o mês de Junho e Maio fôra solarengo. As ervas estavam queimadas pelo Sol e tão completamente verdes.
Havia cerveja quase fria e morna para secar a roupa molhada. Não era chuva. Naquele ano, a chuva não era coisa que importasse. Aos irlandeses era apenas humidade, toda aquela água era apenas água e não molhava. Só ensopava forasteiros. Havia cerveja quase fria e morna, às vezes whiskey, para secar a roupa molhada.
Nesse anos os caminhos foram longos e muitos feitos de ferro e diferença. Tudo tão pequeno e rural, mesmo a maior das cidades depois de Dublim. Lembro-me duma grande molha em Wexford, doutra em Tralee, doutra em Der Spidal, doutra em Cork e doutras que afinal não me lembro, mas sei que houve, porque havia sempre chuva, quando não fazia Sol fraquinho. Naquele ano as ervas estavam pouco verdes, embora luminosas na sua verdura aos olhos de forasteiros.
Lembro-me duma grande molha em Wexford e das cantigas que aí se cantaram para forasteiros. Lembro-me da ameaça de chuva a caminho do Brazen Head em Dublim e das cantorias roucas que não se viram e dos gozos aí tidos. Lembro-me dalguns flirts de irlandesas algures. Lembro-me de ter sido português. Lembro-me de caminhos e canseiras. Lembro-me das grandes molhas. Lembro-me de gares ferroviárias, estações e apeadeiros. Lembro-me do Patrick e dos hambúrgueres. Lembro-me de ter fome. Lembro-me de não querer saber. Lembro-me de não ter dinheiro e comprar postais. Lembro-me de tirar muitas fotografias. Lembro-me da cerveja quase fria ou morna, às vezes whiskey. Lembro-me do arroz consistente e das postas de fimbre incomestíveis e assustadoras à vista. Lembro-me de ter comido tudo. Lembro-me principalmente da amizade... de enormes amizades.
Lembro-me duma grande molha em Wexford. Naqueles tempos chovia muito e andava-se muito. As ervas eram mesmo verdes e os amigos mesmo amigos... e ainda são.

1 comentário:

João Barbosa disse...

por mim ia já amanhã e ia contigo outra vez