digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

sábado, dezembro 31, 2011

Voto de ano novo


O Sol caído na tarde ilumina-te, num sono tardio e precoce. É como se fosse Verão, a praia e a brisa. Os olhos, cor de mar profundo, têm a ternura das mães e a alegria das namoradas. As mãos são abraços pequenos. Dois mil e doze abre-se, como o mar de Moisés, sem as esperanças de todos os anos e as dúvidas de sempre. Dia um é para se ficar abraçado em beijos, passear no frio, ver o mar e fazer amor. Não me fujas pela manhã.

Ser quem não é


Quando olho para a piscina vazia percebo que não ganhei o Euromilhões; nem piscina nem água nem dinheiro. Tenho saudade de quando era o que nunca fui.

sexta-feira, dezembro 30, 2011

O ano do fim do mundo


Dois mil e doze vai ser um ano complicado! É melhor parar antes de nele entrar. Se não for agora, a vinte e um de Dezembro, será ele a arrumar-se e a guardar-nos num jazigo de anonimato.

quinta-feira, dezembro 29, 2011

Perguntas com sentido


Se houver mais luz fora das estrelas o universo será mais infinito? De que cor será a noite e qual o calor do Sol? Deixa-me ser pequenino para te fazer perguntas com sentido. A banalidade dos dias é uma triste banalidade.
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Nota: Dedicado ao M... ou direi antes: m.

Por essa estrada fora


Dá-me o caminho finito e a infinita esperança de o fazer. Dá-me o abraço na noite, ainda que suemos. Dá-me o abraço na noite, para que te beije entre sonos. Dorme comigo, para que não te sinta a falta nos sonos. Que a noite seja de chuva, para que se deseje mais corpo. Que a noite seja escaldante, para que os corpos a façam mais. Daqui até aí, na saudade, é mais longe do que os anos-luz até Alfa de Centauro. Daqui para aí, juntos, o tempo é infinitamente pouco para tudo. Esta noite vou sonhar contigo, ainda que acordada, e estarás comigo, nesta ou numa Via Láctea qualquer.

terça-feira, dezembro 27, 2011

sábado, dezembro 24, 2011

Confusão dos conceitos de bem e de mal


























Há ditaduras e há ditamoles. Das segundas espera-se mais clemência, das primeiras espera-se tudo. Do comunismo sabe-se o que se espera. Do PCP sabe-se que se tem de abanar a cabeça e encolher os ombros, sorrindo tristemente, pela desfaçatez do que apregoa, do que faz, do que mente. Este Dezembro morreu um homem bom com defeitos. Václav Havel mostrou o caminho da democracia à Checoslováquia, em festa, em tolerância, em abraço de vida, em multidões libertadas. De boca cheia da palavra de democracia, os comunistas (portugueses, todos) aldrabam, evocam lutas que travaram, com outros propósitos que não da liberdade. Em Portugal, o PCP lamentou a morte dum criminoso, Kim Jong-il. Funeral de praças cheias, de lágrimas de propaganda, de medo de desalinhar, de previdente histeria. O PCP nunca aceitou a chegada da democracia aos países onde se sofreu o comunismo, não alinha no pesar de Václav Havel. O PCP acredita nos amanhãs que cantam na Coreia do Norte, país de estranha monarquia hereditária e absolutista. O PCP revela-se, não é gato escondido de rabo de fora, é lobo com pele de cordeiro… e só engana quem não conhece ou não repara no fedor totalitário que emana. De cordeiro só a lã, que nem lhe consegue tapar metade do corpo.

Flor de sal


Não quero um anel de compromisso nem colar de lágrimas. Que o teu amor não me sangre os dias, nem o meu me faça dono. A posse que se quer como posse é a posse que não marca a posse. O amor que prende, é o amor que deixa largo. Mas os olhos que prendem olhos, são os olhos que prendem olhos. E os lábios que prendem lábios, são os lábios que prendem lábios. E os abraços que prendem troncos, são os abraços que passam além do corpo. Amor à flor dos olhos.

Ai o amor


Com quantas letras se escreve amor? Não pense antes de responder. Diga apenas um número, antes de evocar a pessoa.
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O primeiro amor pode não ser o amor primeiro, nem o último ser o derradeiro.
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Estamos com quem amamos ou com o que resta, com quem mais ninguém quis, com quem nos aceitou como sobra? Até ao fim da vida, até ao novo amor, até à ilusão de um novo amor, até à ilusão do amor?
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Será que amamos ou amamos quem nos ama, que, julgando que a amamos, nos ama?
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Amar numa sopa de letras. Amar na razão do sudoku. Amar na ponderação do xadrez. Amar na leitura do poker. Amar por não saber o que fazer. Amar porque não há nada a fazer.
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Onde entra o beijo no amor? Lábios são lábios, de homem ou de mulher. Mas Pedro ama Rosa. Mas Teresa ama Miguel. Mas José ama Paulo. Mas Susana ama Cristina. Lábios são lábios e apenas nos deitamos com quem queremos num momento. Acreditamos, com quem amamos. Com quem amamos num momento. Com quem entesamos, quando entesamos.
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O que é o amor? O que é o tesão? O que é o sexo? O que é a amizade? Lábios são lábios. Cu não tem sexo. Boca é boca, pila é pila e rata é rata. Boca na pila, boca na rata. Pila na rata. Pila no cu. Boca no cu. Dedos em toda a parte. Águas de desejo.
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O superlativo de amor não é nada disto! O superlativo de amor é amor. É como dizer infinito! À falta de melhor palavra, dizemos amor a uma coisa que, sendo definível, não tem palavra que a defina.
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Diga um número. A matemática sintetiza tudo. Sem química não há física. Sem a matemática, o amor é abstracto, a música é abstracta, não há universo. Nem Deus permitiria. E além da matemática só Deus. Deus é amor e a matemática resume tudo.
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Pense na quantidade de letras para escrever amor. Responda antes de pensar.

sexta-feira, dezembro 23, 2011

Eu podia amar toda a minha inocência


Queria que toda a gente gostasse de mim. Ainda que não seja santo, gostava. Gostava que me perdoassem os defeitos, os enganos e os fracassos. Gostava que gostassem como gosto de pensar que gosto de toda a gente. Quando era criança gostava de toda a gente, sentia ternura. Gostava que não tivesse mudado, o mundo ou eu. Continuo a querer abraçar todos e que todos me retribuam. Perdoo, esqueço, tropeço e volto a cair, perdoo. Sou ingénuo, quiçá néscio. Quando me recusam, sinto. Quando rejeitam o amor, precipito-me no fim dos dias. Arraso-me com o desgosto da desilusão de não me quererem. A recusa é um desprezo. O desprezo é dor de morte, punhal de lágrimas. Quase morro. Quero todos e a todos amo, mesmo quem não amo. Contudo não sou santo, nem no amar nem na ausência de imperfeições. Gostava apenas que todos gostassem de mim, como abro as portas de casa a todos e lhes sirvo de comer.

quinta-feira, dezembro 22, 2011

Vida pastilha-elástica


Uma árvore larga para abraçar, no jardim que terei. Uma tarde de preguiça, na casa vazia. Sol ou trovoada, com a janela aberta por esquecimento. Dois cães, vários gatos… para lá dos muros, todo o mundo, o que não me interessa.

Vergonha


Sono de todos os dias. Silêncio de todas as horas. Desamor e despeito. Vergonha de ter sido e ter amado. Vergonha da desmemória. Vergonha da afronta levada para casa. Vergonha das esperanças. Vergonha dos meus erros. Vergonha por acreditar na verdade e admitir projecções. Vergonha por pensar. Vergonha por não ter amor-próprio. Vergonha de não ser rico, para mandar foder esta merda toda e esquecer-me.

O Natal tem muitos dias


Jantar para um, à luz das velas. Vinho e bacalhau quadrado, tirado do congelador para o micro-ondas. Mais uma noite de tédio frente ao televisor, em voltas na cama até desarrumar os lençóis. Não há presépio nem árvore de Natal. Não há presentes nem vontade. O Natal dura demasiados dias e todos os telefonemas são tristes. A comida é triste. Depois do Natal há pouca imaginação: o ano novo. Pouca imaginação: bebedeira. Tristeza em forma de festa. Se sobrevive o aborrecido bom-senso, dieta e análises tristes. A luz amarela e frágil duma lâmpada incandescente, amarela como a da infância, no quarto da avó, amarela como a nostalgia. Duches frios pela manhã, para acordar e fingir viver. Depois de seco, a mesma casa vazia e o silêncio das ressacas da noite gorda. Tristeza na contemplação de todos os dias desnecessários. Mais uma semana, mais um ano sem acrescentar à humanidade. Algumas palavras, poucas lembranças e o tédio de sempre.

quarta-feira, dezembro 21, 2011

Amor solene



Tenho raiva de mim, pela culpa que não tenho e sinto. O mal que me ataca é o mal que faço. Fazer é só um pormenor do pensar, para a alma pouca diferença faz.
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Serve amar quando se odeia amar por não ser amado? Que ciúme é esse que consome quando não há cadáver nem cheiro?
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Há uma festa atrás das cortinas pesadas de veludo carmim. Onde quase não há luz, mas velas, música e máscaras. Talvez uma droga, para que quem esteja mergulhe no escuro vicioso e saia quando for quase dia.
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Há muitos anos numa pista de dança… os seios descobrindo-se de roupa e nas mãos. Olhos nos olhos e qualquer coisa que mexeu no medo e na perda.
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Muitas mortes depois, resta morrer na saudade. Na memória, aquelas noites não se apagam antes.
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Ciúme esse? Pouca diferença faz, foi há muitos anos. A festa fantasmagórica continua, e eu por morrer, amando.
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Há qualquer coisa de sagrado. Um amor em transcendência, quase religioso. Fantasma de várias vidas, apaixonados, em desatino, desencontrados, prometidos e frustrados.
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O frio branco duma igreja. A luz amarela das velas e o silêncio. Os passos nas pedras e o frio, não uma corrente de ar, dum fantasma de muito saber.
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As vidas num altar sacrificial. Esta como outras antes. Esperando pelas promessas de muitas vidas…
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Qualquer coisa de solene, uma crónica de reis, uma criança prometida.
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Nada, tudo é quase nada. De tudo fica o ciúme e a falta dum cadáver para velar.

sábado, dezembro 17, 2011

Vigília estúpida


Bato-te à porta, na ausência. Espio-te nas horas de sono. Não estás, nem em casa nem acordada. Espero-te com a determinação dos parvos. Amo-te com a obsessão dos estúpidos. De quarto em quarto de hora, a meta. De dois em três em três minutos olho para o relógio, a noite toda, os dias todos. Na esquina, frente à porta, na varanda da casa da frente, no Google Maps, no rastreio do telemóvel, no equipamento de detective… o desejo de saber, a certeza de ser melhor nem saber, não querer saber, não querer existir. Ainda assim, espero-te. Nas insónias, no frio da gripe, na fome, no desconsolo. Caso-me sempre que me lembro. Na miséria e na abastança. Até que a morte nos separe… só a morte nos reunirá.

quinta-feira, dezembro 15, 2011

Às malvas, devia mandar eu... às malvas, mandar-me



Estou sem paciência para a paciência. Quero o mundo e já. E o mundo é o que quero. Não querendo tudo, quero o que quero, e o que quero é o mundo. Como uma criança quer o gelado, que se derrete na mão, que sobra e não come a mãe, porque cai no chão.
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Ainda que saiba que a má vontade é própria dos imbecis, que os tacanhos são pouco inteligentes e que a minha mediana luz de espírito está a anos-luz da clareza e conhecimento deles… irrito-me, porque, apesar de tudo, acho-os humanos. Com direito à vida, ainda que menos inteligentes que as minhas gatas. E irrito-me porque os acho humanos. E irrito-me porque me irrito… duas vezes.
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O mau gosto cheira mal, como cheirava a ribeira do Jamor. Mau gosto de vestir mal está no vestir mal. A mulher veste mal, é saloia. A artista, que se veste igual, é artista. É alternativa, é muito à frente, é iluminada, tem o génio e a cultura.
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Se uma coisa se chama assim, por que dizem que é assado? E se alguém diz que é assado, caem-lhe os iluminados idiotas, que diziam que era assado, a dizer que sempre disseram assim, e que quem disse que o assim era assim só estava a implicar, que o faria sempre, fosse assim ou assado.
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Dói-me a alma pela imbecilidade dos outros. Não! Dói-me a alma em solidariedade com os imbecis a quem devia doer a alma. Não por ser cristão…
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Pergunto-me muitas vezes acerca do que Cristo sentiria quando confrontado com um parvo, ou, pior, com um estúpido, ou, pior, com um mal-criado, ou, pior, com um cretino, ou, pior, com um imbecil, ou, pior… que sentiria ele? Pena? Raiva, não. Chorava? Dava-lhe por certo a mão para o ajudar… para quê, se iria recusar?
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Eu que não sou nem Cristo nem bom, e que só tento quando atento, preocupo-me com a aridez da parvoíce, da alarvidade e adjectivos adjacentes.
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Basicamente, estou sem paciência para mim. Porque mais parvo é aquele que se preocupa com a parvoíce alheia. Prova de orgulho ou sobranceria. Sim, parvo sou eu! Raios, que estou sem paciência.

quarta-feira, dezembro 14, 2011

Mulheres, o que eu gosto



Enjoado de carne. Enjoado do sexo. Enjoado de pós-adolescentes. Enjoado de mães tesudas. Enojado de kinkies, plural de kinky, diria quinquies. Vomitando velhas de mamas enrugadas a pender sobre o umbigo. Enojado com o ar falso-cândido de jovenzitas, de vintes e a fingirem-se de dezoito, insinuando virgindade. Enojado das gajas com ar de vacas… de cabras, de porcas. Sem paciência para galinhas e outras estúpidas. Insuficiente, mas desprezando peruas, pavoas e aves de arribação. Farto da badalhoquice do porno. Farto do ar gasto das gajas que se fazem de boas, mas que não são. Sem tesão para freiras. Sem interesse em deslavadas mães de família, que só fodem um domingo por mês, se tanto. Farto da trintonas e quarentinhas vestidas em tons pastel.
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Foda-se! O que eu gosto mesmo é de mulheres. Como são, sem molho bechamel nem fritura. Mulheres! Gosto mesmo de mulheres!

segunda-feira, dezembro 12, 2011

sexta-feira, dezembro 09, 2011

Ninguém atende



Brilho da língua, contraluz, contrassol e água fresca. Viagem? Certamente. Dúvida? Sim. Ciúme? Também.
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Hoje beijava uma pedra. Cinzenta, um seixo. Primeiro seca. Depois molhada pela corrente fresca. Onde estaria?
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Mando cartas sem respostas. Do outro lado do telefone ninguém atende. Será que fuma? Em que lençóis se acoita? Morada desconhecida, pessoa incerta ou transparente.
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Estou? Sim? É do zoo? Conversas cruzadas, linhas trocadas, palavras de enganos. O coração ao pé da boca.
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Um pontapé na boca.
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Pesadelo com uma actriz, que sei não ser a virginal amante, de muitos desfloramentos. A actriz é de muitas camas, mas não da minha. Na dúvida acordo. Sufocado como se fosse a verdadeira.
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Se não esqueço é porque se esqueceram. Gostaria de estar nesse sítio, de água fria e Sol. Na falta, uma pedra.
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Outro pontapé na boca.
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Brilho de sangue na boca. Água tingida, de sangue e de dúvidas. Viagem? Sim. Ciúme? Também.
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Nem uma conversa de linhas trocadas. Ninguém atende do outro lado. Será que fuma?

segunda-feira, dezembro 05, 2011

Entre a preguiça e a vontade de não fazer


Entre a preguiça e a vontade de não fazer. Desmaiado acordado, derreto-me numa cadeira fofa, enquanto o corpo espera o calor inanimado que se forma no deixar ficar.
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Do outro lado da janela há um dia sem interesse. Faltam muitas horas para o prazer duma obrigação maior e, até lá, duvido que chegue vivo do tempo com a cabeça em chumbo.
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Cabeça em chumbo, sim. Pelo peso dos pensamentos, da vida e de suas memórias, dos desejos frustrados, da descontracção da desistência, da fraqueza contra o tempo. De chumbo, sim.
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Não são apenas as pálpebras, mas todo o corpo. Vergado pelo tédio e pelo horizonte fechado. Nem numa praia deserta, como a folha branca e imaculada da vida, com o horizonte inalcançável, tenho esperança. Nem na fé tenho esperança.
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Deus não se terá esquecido de mim, mas esqueci-me dele, no desalento das contrariedades, no tédio e na autocomiseração.
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Deito-me esperando a passagem das horas, dos dias e dos anos. Tento esquecer-me da vida aborrecida e vazia, do tédio insistente. Durmo e tento dormir quando acordo, para que me habitue à posição final do meu corpo.
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A esperança restante é essa. Escrevo mensagens a quem gosto, declarando-me em amor e gratidão, até da que lamento sentir. É a esperança estancada, crosta de sangue vertido, prova de rio seco. Quando optimista, espero que alguém entre e abra tudo, para que o vento higiénico leve toda a chatice.
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Os amores vêm e vão. Os amores ficam sempre. Como as dores que deram, os prazeres cedidos. Saudades dos amigos traidores. Vergonha das minhas traições.
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Sonho sempre que estou noutra terra. Longe, dum outro lado do mar. Esquecido de casa, em descoberta e vontade de não voltar. Sempre além da água, onde chego de barco, avião ou balão… até de zepelim. Por cima da água, chegar e descobrir, sem memória de voltar.
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Ainda que dorido, senão nem sairia, tenho nessas partidas o prazer e a dúvida das descobertas, a liberdade de deixar tudo e todos donde fugi. Ainda que dorido, há nessas viagens um atenuar do tédio.
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Acordo estranho. Habituei-me a acordar. Habituei-me ao desgosto de serem apenas sonhos. Acordo no tédio dos dias e na incerteza de amar o Deus. Partir é o desejo e esperança restante. De ir para o além, de ir para qualquer lado com saudades ou ir sonhando, por cima da água, para um terra onde descubro sem dor.
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Entre a preguiça e a vontade de não fazer, resigno-me à derrota na vida. A dormir estou morto, assim me convenço a viver.

terça-feira, novembro 29, 2011

A primeira vez


















Olha-me como se fosse a primeira vez. Olha-me não como a nossa primeira vez, mas como a primeira de todas. Olha-me como quando deixaste de ser menina e quiseste ser mulher. Olha-me pedindo um beijo. Olha-me desejando a cama de que tens medo. Deixa-me que te desflore pela segunda primeira vez. Enleva-te, eleva-te, inebria-te e despe-te renitente e duvidosa. Despe-te querendo mais e querendo menos. Leva a mão onde há dias só sonhavas e há tempos negavas. Fecha os olhos, deixa-te ir, bêbeda e ciente. Tens a experiência da inexperiência. Sabes que um dia saberás. Despe-te e olha-me como se fosse a segunda primeira vez.

sábado, novembro 26, 2011

O puto e a rapariga desejada


Ela era a rapariga mais bonita lá do sítio. Não me ligava e imaginava-a a olhar, despindo-se e beijando-me. Brincava jogos de menina, saltava à corda e ao eixo. Só queria ver a rapariga nua, mas não tinha idade para mais do que para jogar ao pião. Nela já se notavam os seios e o rosto deixava a infância. Ela era uma rapariga e eu ainda puto. Deixámo-nos de nos ver. A rapariga tornou-se mulher e eu de puto passei a rapaz, de rapaz a homem inconsciente, a presumível respeitável, a maduro. Os homens demoram sempre mais tempo a serem adultos. Talvez por isso as mulheres envelheçam e os homens ganhem charme. Volta e meia sonho com essa rapariga de pernas delgadas que quando saltava, deixando ver um pouco mais acima, me fazia deixar de ser puto e querer ser qualquer coisa que julgava ser graúdo. Em sonhos a rapariga e eu não crescemos e penso o que teria sido de nós se tivéssemos a mesma idade.

sexta-feira, novembro 25, 2011

Documentário


A vida lá fora é um documentário sem narrador. Um aborrecimento, com espectador participante. Do quarto andar penso em palavras densas para mandar para a rua. No alto contemplo o ar das águias e quero o vento.
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Lá fora há gente com preocupações. Aqui vive-se um tédio burguês. As janelas duplas fechadas fecham a vida ainda mais dentro dum televisor.
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Voar, voar, voar, voar, voar, voar… um salto! Da sala para o ecrã, da janela para a rua. Documentário sem narrador, espectador participante. Uma notícia breve num jornal gratuito e talvez uma notícia na mediocridade dum telejornal.

Se houvesse um rio



Se fosse só um nó na barriga… é um novelo, que roda, se enleia, desceu pela goela e agonia.
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Está frio, suficiente. De tronco nu, destapado, estendido na cama, os ombros queixam-se.
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A cabeça pesa, como que com febre. As pálpebras pesam, como que com febre. As pernas fraquejam, como que com febre.
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Sei que vivo, porque sinto nos pulsos o pulsar. O sangue que quer sair, cavalgante.
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Vencido pela vida, espero ganhar o direito à morte.
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Tivesse fé, a que anima e ressuscita… tivesse fé, mas só tenho verdade concreta. Coração em cofre de betão-armado.
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Ansiedade de cobre electrificado. Cabeça em fusão. Coração com vontade de se livrar.
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Tudo em convulsão. Em desagregação, por dentro e por fora. As estruturas têm fissuras e a cúpula não levita. Os vitrais quebram-se. Eu, que sou eu, sou isso tudo, estou dentro deste cofre… desabando sobre mim.
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Se chovesse, podia criar-se um rio e eu ir com ele. Tomara que chova.
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No momento seguinte a escrever as seguintes palavras, desmaio desejando que seja amanhã, vinte anos depois…
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Engulo em seco o fio do novelo, rezo para que o cofre em betão ceda e que a razão me deixe ter um Deus.

quarta-feira, novembro 16, 2011

Sangue



















Cortei-me para ver a cor do sangue. Suguei. Há quem desmaie.
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Sentei-me etéreo pensando na Lua, nas noites longas e claras do Verão e no vento fresco do Outono.
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Sentei-me frente ao rio, senti-me na música e pedi uma bebida. Distraído, beijei o dedo cortado e provei o sangue estancado.
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Pensei em ti. Não pensei em nada. Pensei na cor dos teus olhos. Vi só os teus olhos. Pensei no teu nome. Só no teu nome. As letras colocadas em ordem, como se um nome fosse uma coisa concreta.
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Não perdi sangue suficiente para desmaiar. Nem a cor escorrendo me impressiona. Senti-me desfalecer, no sono pela ausência.
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Não sei se és Verão, Outono, Inverno ou Primavera. És uma outra coisa. Ainda não sei o quê, mas tem odor de cama e profundidade de abraço nocturno.
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O que é o amor? Umas palavras que tentam dizer alguma coisa de indefinível aplicada a coisas concretas.
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Enquanto aprovo o pôr-do-sol, distraidamente enrolado em mim por causa da aragem fresca e húmida, sugo o sangue, que corre novamente por puxado.
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Puxo sangue como se os meus lábios mordessem os teus. Em inconsciência fecho os olhos e, diante do desejo, leio o teu nome.

terça-feira, novembro 15, 2011

Remorso de pecado inacontecido



Rio de palavras traídas por amores tardios. O corpo sobre o corpo, lançados e caídos. O sono depois da euforia, os remorsos dos orgasmos. As quedas nos braços, abraços de profunda vontade. As lágrimas por cair precipitadas como cascata. As juras falsas que se fizeram na cama, desmascaradas na agonia do tempo passado.
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A roupa caída pelo quarto é espólio de desconforto. Prova de que num espaço quadrado houve viagem no ar, em rodopio ébrio de sexo e curiosidade. Por falar, falou-se. Bocas disseram de mais. Bocas disseram mentiras. Bocas beijaram. Bocas beijaram por engano. Bocas beijaram em sexo. Bocas bocejaram arrependimento.
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Há tanto tempo e ainda hoje esse fantasma, ressuscitado pela chuva que tardou em chegar. A dor do arrependimento como a dos velhos. Um dia de desejo com dezenas de anos, ou milhares de dias, para sublinhar o pesadelo da hora de agonia e tristeza.
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Milhares de dias de desejo e dum arrependimento por uma tarde que nunca existiu. Devia estar a chover nesse momento. Em mim, chove e, todavia, não há água que possa cair do meu céu, castigo sem pecado.

sábado, novembro 12, 2011

Embaciamento


Perco sangue como quem adormece. Vida indo-se sem que me vá. E não parto. Não é por alguém que me diluo no ar ou escorrego como a chuva-lágrima. Mesmo que recolhesse todo o que perco e pudesse de alguma forma readquiri-lo não me tornaria mais vivo. E não morro.
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Por vezes sinto-me num expositor de museu. Por vezes sinto que me vêem como uma peça de museu de curiosidades. Cabeça morta à vista, com alma agoniada presa.
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O decepado sente o membro perdido. Sinto o sangue que perco. Sinto a vida que vai, e sem que morra.
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Tenho pensado muito na minha velhice. Ainda estarei vivo quando morrer? E a vontade? Desejarei algum dia a luz do Sol?
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Quando me demolho na banheira, embalado no vapor, magico no que aconteceria se ali perdesse todo o sangue. Afogamento, não, porque sei nadar e respiro debaixo de água, essa morte já nem em sonhos.
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Quente, molhado até aos pulmões pela humidade do vapor penso no tempo que levariam a encontrar-me. Penso em quem me encontraria. Em quem sentiria a minha falta. O que diriam de mim. Penso no tempo que levariam a sentir a minha falta e em quem mais faria diferença para me procurar.
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Quando acordo tenho as mãos embaciadas. Velhas ao deitar-me. Os olhos pedem sempre o que pede o corpo… já ouvi dizer que são as janelas da alma… tem lógica.
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Acordo sempre com voz. Posso gritar, boa garganta e bons pulmões. Mas quando perco sangue só quero o silêncio da partida discreta. Esse silêncio que chama o anjo auxiliador, que me sustém no precipício e beija as dores.
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Se a alma não fosse etérea e já perdera todo o sangue.
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Mergulho uma vez mais o corpo no colchão, a cabeça nas almofadas, para entrar num comboio que me leva ao outro lado. Aqui sou turista e tenho saudades de casa.

quarta-feira, novembro 09, 2011

Útil como um navio encalhado



Lembro-me da tristeza do Tollan, que Lisboa adoptou como seu defunto com o nome de Tolan. Lembro-me da tristeza do Tollan abandonado às correntes do Tejo. Um dos seus poisos foi à vista lá de casa…
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O que se pode dizer dum navio encalhado? Tombado de borco, sem respirar, sem socorro. Depois de falecido, ali esteve no Tejo, à vista para que se não esquecessem, deprimido sem sair do leito, sem ter ninguém.
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Morreu ali, como uma baleia na praia. Inútil e de cara anónima. Abusado por quem lhe pintou palavras, de reivindicação e de política.
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Um dia foi-se sem aplauso, como um mero bandido acorrentado. Nunca perguntaram por ele e as palavras do dorso saíram com a chuva, o mar ou o maçarico.
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Quando o telefone não toca e as janelas não se abrem… quando a escuridão cai sobre a luz e o sufoco sobre o ar… caio de borco, encalhado… chorando as feridas e rezando para que…
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Tanto faz! Se o telefone não toca é porque não tenho o que dizer.
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Sairei de borco, mas depois de bem engordado com gelados de caramelo. Sairei do lodo dos dias e do sono prolongado das noites.

terça-feira, novembro 08, 2011

Eterna dúvida e sua certeza


















Olhos abertos no negrume, dentro do cilindro que conduz ao futuro, para ver que não há nada para ver.
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Um torcicolo irritante impossibilita o regresso aonde se foi feliz ou onde se perdeu a ilusão de o ter sido.
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À frente, um sacrifício, um abismo, um grifo, uma esfinge, um buraco…
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O salto, o eterno desejo. A vertigem. Na incerteza, ficar ou largar? A vontade na vertigem… acto consequente na vertigem da vontade.
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Valerá a pena viver desconhecendo o futuro? O futuro é invisível, desconhecimento imposto pelo tempo. Olhos abertos? Bem abertos, e continuar a não ver porra nenhuma.
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Pode estar uma besta à frente: dragão de sete cabeças. Pode estar o Paraíso: as tantas felicidades indescritíveis.
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Pode tudo e, na maioria das vezes, não está nada. Uma agonia e enjoo pela mediocridade da ausência e do vazio.
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O futuro é invisível, caminho escuro. Vale andar sem ver? Deduzir com base na ignorância.
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Vale a pena em toda a desesperança?
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A vida é uma grande merda!

sexta-feira, outubro 28, 2011

Verbo esperar














Espero que me esperes, como a primeira vez. Coroada de flores, como virgem, e de olhos brilhantes. Espero a esperança suficiente até esse dia.
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Quero-te emergindo dum lago, orlada de flores e dos pássaros pirosos que há no Paraíso. Quero esquecer a árvore do conhecimento e deitar-me contigo à sombra da dos prazeres.
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Quero cumprir promessas de vidas. Quero meter-te a Lua no ventre, para que te faças Sol.
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Dias soalheiros de amena luz. Mergulhos tépidos em mar de transparência e ondas de brincar. As frutas do mundo e o vinho de Deus.
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A solidão feliz de dois amantes, alimentados de boca-a-boca e mão-a-mão e corpo-a-corpo e jura-a-jura. A feliz solidão sem tempo nem horizonte.
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Amar além das vidas. Entre elas, o caminho do Paraíso para lugar nenhum, um abismo de perda de tempo.

segunda-feira, outubro 24, 2011

quarta-feira, outubro 19, 2011

Espreguiça-te



Espreguiça-te em mim. Antes de cair no sono caímos no desejo, até à satisfação plena. Espreguiça-te em mim. Grande como uma sequóia e tu frágil, enrolas-me como as lianas. O teu respirar dá-me vida e o calor tira-me água. Abraçados toda a noite, atiro-te pedrinhas ao sono, com promessas de amor, que não te abrem as vidraças em delícia nem ouves atrás do sonho. Acordamos em beijos e conto-te o que disse ensonado. Ris e faço-te cócegas, como as que te fiz antes de deitar. Despejo-te água, como o fiz antes que adormecêssemos. Só a fome nos tira da cama. O dia fica para depois.

domingo, outubro 16, 2011

Síndrome e transparência















Não são páginas em branco, mas de insuportável transparência. As letras escorregam ou desfazem-se em intersecções desajeitadas… quase suicidárias, se tivessem vista, meditação e coragem e vontade.
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A transparência das páginas não fixa ideias. Mais concreta do que a ideia e fugaz na escrita.
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As palavras são, por natureza, negras. As de tinta são negras e no ecrã vêem-se negras. Esqueçamos as de outras cores, subprodutos alfabéticos. As palavras, as letras, a pontuação são negras. Como desmaiam na transparência das folhas!...
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Como uma vidraça… límpida, baça ou translúcida… folhas sem espessura, sem dimensão, sem cor. É mais doloroso escrever assim: sem ver, forçando a vista, de incerteza crescente, de tempo prolongado no travo que de intenso passa a enjoativo e a vómito… a dúvida chega e volta ao princípio. Folha transparente.
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As ideias são livres e agora… Um descalabro, uma incerteza, angústia, desilusão e loucura.
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Que fazer com esta ausência? Que poderei escrever? Deito-me esperando estar já a sonhar. Que esteja a sonhar com o pesadelo e que amanhã acorde com a síndrome da folha em branco. Espaço suficiente para algumas palavras. Negras, certamente.

sexta-feira, outubro 07, 2011

Lápide da imortalidade



















Depois do seu sonhado sucesso, coisa de amador de poucas ambições, coisa menos que a mínima que uma mãe quer ver, regressa à insignificância.
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Memória deixa pouca e é apenas um tracejado ténue junto dos próximos. Nem os gozos de quem o vê palerma durarão mais do que as vidas que o conhecem e desprezam.
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Ainda sem a noção de que as palavras se escreveram com letras quase invisíveis. Caído e estatelado, na dormência da dor nem descobre que morreu, de corpo ainda respirando.
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Estar quase não é chegar. É perder o que não se chega a ter. O ridículo duma vida é tê-la vivido enganado.
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A beleza está no apanhar da fruta e nas árvores de grande porte e considerável cabeleira. Não há como a natureza. A terra come o resto e dá o que recebe. Do respirar, nem bafo nem vento.
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Uma vida virá que valha a pena.

domingo, setembro 25, 2011

Requerimento



















Venha a Morte, com sua gadanha, ceifar os tristes e deixe os reis e vencedores do mundo. Que o seu manto negro em farrapos sirva de abrigo, resguardo e consolo aos que se cansaram de existir, aos desistentes, aos derrotados. Que o hálito da vida dos fracassados alimente os fortes e os gloriosos. Que partam os desmerecedores, pela sua fraqueza.
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Que o peso do universo esmague os iludidos e estes, em sufoco, tenham um regalo, o de morrer instantaneamente e sem dor. Suspiro menor ao segundo. Uma graça de justiça.
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Que a minha vida seja uma veloz passagem, sem rasto nem saudade. Que a Morte, com seu manto escuro, limpe a sombra e consuma o corpo. Que a morte, com seu mando desmentível e incontestável, queira ceifar cedo quem lho pede.
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Não há, para quem perde, melhor consolo do que a lâmina fria da gadanha. Que a Morte tenha clemência e higiene. Que deixe os vencedores brilharem em eternidade e permita o célere eclipse aos desistentes.
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Não seja suicídio, mas graça. Não se pede mercê, porque os perdedores não merecem reconhecimento nem laudas. Faça a Morte justiça. Que com sua gadanha leve para onde não há universo para guardar almas, os perdedores.

sábado, setembro 24, 2011

Tédio
















Alívio maior. Alívio adiado. Dentro tenho algo maior do que eu. Não é por isso que estou disformemente inchado.
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Como a maçã de Magritte esmaga a respiração de quem olha, algo em mim transborda dentro, querendo rebentar.
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Mil arrepios, dezenas de bocejos, noites e dias dormindo. Um sono muito grande, sem ter cansaço nenhum. Um cansaço muito grande, sem ter cansaço nenhum.
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Pergunto-me se acabar, sabendo que não acaba, é acabar. Se acabar cedo por vontade é deixar a meio. Se acabar por vontade dá direito a acabar mesmo.
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A maçã de Magritte e o pão a crescer no meu forno. Fermento a mais para tão pequena caixa. 

quarta-feira, setembro 21, 2011

Verbo amar conjugado no tempo merecer












Um coração grande em corpo pequenino é ainda maior. Por isso, o abraço é a obrigação desobrigada. A gratidão de ser, além de estar ao lado. Um sorriso é justo, dois, mais justo será. Um mais, pelo menos, não irá sobrar.
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Um amor numa alma sofrida é ainda maior. De tanto abandono vem a vontade de dar. Quem sabe se ainda mais. Pela bondade dos olhos, menos não será. Gratidão? Não, justiça. Se todos merecem ser amados, os que sofreram justificam uma eternidade beijada.
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A presença após a grande ausência é ainda mais cheia. Não há sombra que resista a tanta luz. Vinda de frente, dos lados, de cima e de baixo, das diagonais, de todos os ângulos, de todas as dimensões, de todos os lados. O amor enche de luz as multidões. Ainda que traga o desejo, paixão da terra e da carne, a vontade despertada ilumina o que o mundano retira dando penumbra.
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As ternuras depois dos gritos são ainda mais doces. Agora, gritos só os do prazer. A tesão há tanto tempo contida… do calor à carência… da carência ao calor. Que se dêem as mãos e os olhos se encandeiem em qualquer sítio, os beijos que nunca fiquem por dar. Todos os abraços e o que mais apetecer, desde que seja por amor.
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Não sei o que é amar. Não diferencio, em perspectiva, o prazer de estar com a eternidade de ser. Numa dimensão bidimensional, só se distinguem as cores, que um cartógrafo pintou. Um sítio, num sítio qualquer, tem sítio para mim, para ti e para todos. Chamemos-lhe amor merecido, amor devido, amor desejado.
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Marimbo-me para as duas dimensões das letras, sei que, em concreto, há um sítio de amar e quem se possa amar. Quem mais deu e mais perdeu tem mais a quem amar.

domingo, setembro 18, 2011

Olhos de água















Há anos que não me revia no espelho de olhos tão límpidos. E há quanto tempo não via chuva nuns. Em ternura dão tudo e as promessas saem verdadeiras pelos lábios. Coração bom e toda a culpa do mundo, a que não tem direito. Voz doce e sorriso de enlevo. Generosa nos abraços, quente nos beijos e sensualmente discreta. As mãos servem para se darem em toda a parte, da cama à rua. Um beijo é um beijo, em qualquer lugar. Escrevo-te estas palavras como um beijo. 

sábado, setembro 10, 2011

Dizer-te o quê?



















Dizer-te o quê? Que me ouvirás, com esses lábios vermelhos? Toda a beleza recatada atrás duma pintura, que mais não faz do que sugerir a beleza que lá está.
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Sim, a curva do pescoço. Sim, os olhos revirando-se. Sim, a sabida pose inocente. A indecorosa postura que convida à alcova.
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Qual fragilidade, quando tem o mundo? Que importa o corpo, quando é mais forte a alma?
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Joguete ajoelhado. Dizer-te o quê? Desarmado pelo desamor… desarmado pelo amor… desarmado nessa luta contigo, em que a frágil sensualidade é mais forte que a força viril.
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Dizer-te o quê? Desarmado por esses lábios vermelhos, armadilha de delícias.
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Esses lábios sugerem beleza e, na verdade, timidamente descarados, disfarçam-na. Caio sempre… criado de mim mesmo, servo de minha senhora e escravo do amor. Dizer-te o quê?

terça-feira, setembro 06, 2011

Bom dia mundo
















Olha, lá fora, o Sol brilha e algo de si é teu. Uma parte de luz e outra de calor. Para que te não veja nem te pense acordada, querendo desassossegar-te, baixo-te a persiana. Dorme como uma menina, que o amor será mais tarde.
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Ao abrires os olhos, espreguiça-te bem, acenando ao astro amigo. Abre bem a janela para que para o quarto não fique migalha de vento por entrar. Deixa-te quieta, para que lentamente a luz faça amor contigo.
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Levita dormitando, até não saber se sonhas. O Sol, já refeito das saudades da noite, irá pegar-te ao colo e a água espera-te na banheira. Lava bem os olhos e as orelhas, para que nada do mundo te escape.

sexta-feira, setembro 02, 2011

Em todas as mulheres, tu



















Jogar contigo jogos de cama. Jogos de sorte, sem azar. Nos lençóis da cama, na bombazina dos sofás, na flanela das cadeiras, na pedra da bancada, na madeira da mesa, no esmalte da banheira, à janela, na varanda.
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Pela fresta da porta, a Juliana nua. Pelo vidro da bandeira, a Gisele nua. Pela cama afora, a Adriana nua. Juro amor à Cláudia. Prometo-me à Daniela. Todos os nomes de mulher te assentam na perfeição quando fazemos amor. Sejas ou não sejas a Juliana Paes nua, a Gisele Bündchen desnuda, a Adriana Lima despida, a Cláudia Vieira sem roupa, a Daniela Ruah mostrando-se natural… sejam portuguesas, brasileiras, espanholas, francesas… todas gritando por mim… serás sempre tu.
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Todas cabem em ti, porque, quando em ti estou, nada há além de ti. Nem mundo, nem outra nudez. Só os nossos beijos. Jogos de cama pela casa fora.
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No Facebook estão todos os nomes de mulher, fotografias de lindas e feias. Das que gostam e das que não. No Orkut guardam-se as mesmas e outras. No Youtube há de tudo. Muito do amor de mulher neles cabem. Mas em mim só tu.
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Nas palavras que me dás em desejo estão as vozes da Paris Hilton mostrando-se, da Justine Joli revelando-se, da Sandra Shine avançando-me… se as desejo na ausência, quando juntos, tu e eu, todas estão em ti e sobra espaço.
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De burca, de lábios vermelhos, de cabelo solto, de pelo curto, de pele quente, de boca molhada. Toda molhada. Nua em amor.
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A nudez de todas as mulheres define-se em ti. Podes ser todos os nomes, serás sempre a mesma mulher. Nua, vestida, abraçada, em amor, na luz, na escuridão, na sombra e na contra-luz.

quinta-feira, setembro 01, 2011

O sabor do leite de Bhopal





















Mãe mata filho, com muito amor e carinho. Com leite de Bhopal e afagos de Chernobyl. Amigo dispara sobre amigo, com palavras de amizade. Com olhos tristes e poucas palavras, na voz cinzenta. Como na guerra de blindados e canhões, ninguém ganha. A amizade está e fica, à espera de quem a abandonou a venha buscar.

domingo, agosto 28, 2011

Viagem com o nome de arcanjo














Um dia feliz, em que os pés de praia não foram à areia. O mar bravo esteve manso e, ainda assim, o menino ficou agarrado ao corpo do amigo, para que não fosse o breve pensamento duma brisa, ridícula e impossível, atirá-lo abaixo para a Boca do Inferno.
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O vento do cimo da terra apresentou-se, enquanto a casa de luz permaneceu quieta à espera da noite. Pedra sobre a pedra, em escadas, em escadas imaginárias, em escalada, em ideias. Um, dois e três… hop!
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Um mapa pequeno e outro grande, a mesma coisa, do tesouro escondido e guardado, ainda que se não diga. O caminho até e o que haveria. Lisboa, perguntada, talvez ansiada… a casa, essa sim.
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No caminho o sono dos pequeninos. Entre um ponto e outro, a magia das viagens sem trajecto. Entre Lisboa e Lisboa, tanta coisa para contar e algumas para lembrar.
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Colher, garfo, faca, copo… comida e toda. Uma corrida, às vezes vitória… quase sempre e em tudo. Sempre bem, como um lorde.
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Não há noite sem sono. Tantas quanto os dias e em todas brincadeiras. É faze-lo enquanto se pode.
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Tenho tanta pena de já não ser pequenino.

sexta-feira, agosto 26, 2011

A volta do pai, a volta da volta do pai



















O pai ri-se. Interroga, afirma, delira, flutua, entre este mundo e um outro. Da lucidez à fantasia real das suas horas, minutos. O pai ri-se e brinca. O pai grita, a mãe desespera. O oceano manso alevanta-se, e o pai amaina-se sem aceitar nem compreender. O pai ri-se. O pai fala. O pai diz com voz de se ouvir. Há quanto tempo não o sentia assim. O pai grita, há quanto tempo, com voz de todo o corpo. O pai grita e a mãe desespera. O pai ri-se, flutuando entre a realidade e um outro mundo.

domingo, agosto 21, 2011

Março em Agosto


















Hoje houve Sol. O calor abraçou o pai e o pai sorriu. Lembrei-me do pai, lembra-se o pai. Sorriu, como há tempo não sorria. Sorriu com a confusão do riso, sem rir e na tristeza. Sorriu num dia de Março que chegou em Agosto. Feio e prometendo luz. Ventoso e anunciando a Primavera, sorrindo. Que o sorrir seja em Março e não de São Martinho, Verão de engano, de Outono profundo, certo do fim da luz e do Inverno. Será um dia, mas não hoje. Hoje, não. Hoje sorriu.

Outubro em Agosto


















Há sempre um abraço que fica por dar. As despedidas tristes escondem minutos felizes. O vento apaga as velas, a luz perdura na memória. Há abraços que têm de ficar por dar, para que as despedidas tristes não sejam mais tristes e possam prometer alegrias. O vento leva as lágrimas e os olhos molhados reluzem amizade devida.

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Nota 1: Repararam na luz bela e triste, outonal, que caiu no final da tarde em Lisboa? Outubro. Tempo permitido à tristeza.
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Nota 2: Dedicado à Janis Joplin da Inês.