quarta-feira, novembro 04, 2009

Folias bordalesas

Há uns anos comi uma carne à bordalesa que ainda hoje a tenho na memória. Foi no restaurante Petite Folie, na avenida António Augusto de Aguiar, em Lisboa. Não me lembro do vinho que acompanhou o repasto, mas apreciei bem o almoço e bastante a tábua de queijos que fechou a aboboda da catedral luminosa que tanto pode ser a boca como a refeição.
.
Não sei por que disparates da vida, mas não mais retornei àquele rincão, pois ainda existe e tenho notícia próxima que serve tão belamente quanto naquele dia me serviu. Ando constantemente, há anos, a repetir a frase: tenho de lá ir.
.
O Petite Folie é um lugar de comida francesa e veio-me à memória hoje, porque tenho andado com apetites afrancesados. Ainda não tenho idade para escrever memórias, apenas para ter apetites. E nas últimas semanas o paladar anda a embater na liberdade, fraternidade e igualdade. Como posso explicar isto? Adolescências...
.
Adolescência? Ai! Vêm à memória – ainda é muitíssimo cedo para a escrever – um Verão em França... ou dois Verões... Os olhos azuis e os cabelos loiros. Na altura os corpos não se preocupavam com o vinho!... Ai! Saudades!
.
A propósito de francesices, anda por aí um vinho feito na Bairrada à moda de Bordéus: o Calda Bordalesa, cujo nome evoca a região e cria um trocadilho com o produto que se jogava às vides. Este tinto faz-se de três castas de boa nomeada: cabernet sauvignon, merlot e petit verdot. O cabernet sauvignon domina, manda mais, com maior percentagem. Porém, está bem tratado, sem aquela sensação a pimento ou a pimentão que tantas vezes implica na boca. As uvas da merlot dão muito de si, em boa e franca quantidade. O petit verdot vem em menor quantidade, mas em maior abundância do que na região do Médoc. Em cada ano, o lote do Calda Bordalesa faz-se com diferente proporção destas três uvas, o que é natural.
.
O Calda Bordalesa de 2004 tem um embate um pouco químico no nariz, mas na boca todo ele é elegância. Não é um típico vinho da Bairrada. Não é um bordalês. É um desafiador tinto, que se pode beber já ou esperar por ele mais uns anos.
.
Por enquanto, fico a tecer apetites e a concretizar alguns... para que um dia possa ter memórias. Já que ano com apetites afrancesados, acho que hoje vou abrir outra garrafa desta ou, então, jantar uma carne à bordalesa ao restaurante há tanto adiado.

Sem comentários:

Enviar um comentário