digo e o oposto, constantemente volúvel, às vezes verdade. juro pela minha alma, mais do que vinho amo a água e só me desenseda e lava, a cara, o corpo e a vergonha de ser quem não quero. os sonhos antigos são sonhos e antigos e os novos de esperar, é esta a vida a mim agarrada, se esperança existe.

quinta-feira, junho 30, 2016

Arcanjo

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Disse o que disse e disse o que quis e só isso é digno de ser dito.
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Não te enganei nem me enganaste mas enganei-me e fiz com que te enganasses.
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O que seria nós se a luz viesse e se perdurasse onde estaríamos e enganos.
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Disse ainda ouviste-calaste em segredo quiseste e morri.
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O que seria nós se a luz viesse.
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Do desencontro viria o encontro com a luz só menos bela que a angelical.

Dissipação

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Desafio sem comparecer nem opositor. As armas são de fogo mudas de espírito. Céu sem importância e o vento e as folhas soam e soubesse de aves saberia. Não se apagam dias nem se matam vergonhas nem amores ressuscitam – ainda bem.
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Sonho muitas vezes que ando a cavalo que rapto e devolvo no segredo de ausência e campos planos, pântanos de receio. É enoitecer é madrugada é escuro mas não noite. Como pode sem estrebuchar, bater cascos, relinchar? Não posso com as costas, monto sem dor.
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O prazer da transgressão termina no desalento de cá dentro revirando-se. Acaba assim. Repito e vergonho-me e arrependo-me e prometo e transgrido. Vezes repetidas – pecado e penitência e castigo.
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Farto da angústia e da vida perdida das desilusões dos desencontros das infantilidades das canalhices. Farto da angústia da grande praça vazia do rio irrelevante. Se o vento se a coragem se a desistência.
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Antes de tudo de tudo-tudo antes de acontecer antes da mãe antes da morte antes da vida para trás sempre para trás ao instante primordial. Se soubesse do futuro. Angústia-tédio só angústia só tédio que nada leva e duvido se existo ou apenas dor.

quarta-feira, junho 29, 2016

Neo-realismo

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Não te apaixones por mim. É como conhecer os prazeres do Inferno ou lá ter de morar.

Antes de tudo o mais

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Bala na câmara, uma vida nova. Um lugar para ir que não seja de inmomentos. Que não repita enganos para a consciência não cortar como lâmina romba e cega e a vergonha.
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Há muitos anos, décadas. Longe e frio, corpo e mente, sangue escuro e para nada, no erro. Não aprendi nada e tudo dói. Não só por esse tempo, tanto por estes dias.
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Pudesse voltar ao ventre, daí para cedo, vida após vida, num vórtice onde leve chegasse ao instante primeiro. A Deus que não.

sábado, junho 25, 2016

Irlanda unida – Ireland united

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Irlanda
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Connaught
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Leinster
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Munster
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Ulster
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Escócia livre – Scotland free

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E outras lembranças do meu coração

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Por que me pedem diferença se escolhem igual? Podia enraivecer-me mas sou manso. Poderia puerilmente rir, sentidamente choro.
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Na frustração desistente ainda em incoragem ainda em lembrança ainda consciente. Bala remédio comboio lâmina rio.
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Que bem faço, quando olho há uma derrota. Desisto porque sou manso. Estendo a mão e afogo-me. Rio, bala remédio comboio lâmina.
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Escuridão sem sombra. Sangue sem derrame. Cabeça inválida. Lâmina rio bala remédio comboio.
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Não vou nem regresso. Fico aqui esperando Godot, esperando Deus. Uma luz passasse e saltando a segurasse indo. Comboio lâmina rio bala remédio.
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Nervo raiva silêncio. Traído desgraçado manso. Cego surdo ou nada para ver nem ouvir. Seja tanto-faz. Se não for por doença será sem vida. Remédio comboio lâmina rio bala.
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Podia uma corda se existisse árvore forte para a tristeza.
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Quando era pequenino queria ser calceteiro ou bombeiro ou soldado ou mendigo. Sou manso. Palhaço agradando – o rico, o patético.
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Nesta luz

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Deveria existir um lugar onde se não existisse.
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Não aqui nem Olimpo nem Valhalla nem Paraíso nem Inferno nem Limbo nem Puragtório.
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Ou onde não houvesse memórias e por isso sem consciência.
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Ou fosse um sítio em que se não soubesse do amor, porque seria lugar de apenas amor e ainda riso sem moléstia.
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Aqui morrendo-me em aborrecimento em tédio em angústia em ansiedade em tristeza em negrume em fogo.
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Horas perdidas e dias infinitos nesta luz que cansa.

As memórias todas

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Alto! Pára o mundo! Respiro, pauso, expiro, penso, inspiro, reflelicto, solto o ar lentamente… vagarosamente inalo, medito, solto, a cabeça tão-cheia-vazia. Tento morrer, porque o mundo.

Sandes de pepino e jardim de rosas

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Assim sou

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Chamam mas esquecem-me. Lembro mas não têm. Chamam e esquecem-me. Lembro mas não têm. Amargurado de cristal. Partido e colado. Caído na dor. Invisível e irrelevante. Mentido, perdido, traído, esquecido, falado, recusado, quiçá gozado com desprezo. Numa afoiteza de fantasias, numa ilusão. Sem coragem de partir ou falta de amor-próprio e patético. Falta de amor-próprio e órfão de coragem.

sexta-feira, junho 24, 2016

Brexit! Breshit!

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As lições moralistas da Alemanha e o amor canino de França. A Itália perdida.  A frieza a Norte e o desgoverno a Sul. A Leste uma ameaça. A Ocidente na loucura.
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Ir

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Agora já sem olhar, os amantes desavindos cansados nas certezas. Apolo traiu-se e a Eurídice e ela o mesmo. Sem se olharem no caminho de subir que afinal é de descer até Hades e Perséfone calados incomovíveis. Sem nada para dizerem por tudo sabido. Nem beijo nem um número de telefone para ligar, sem nada por dizer por tudo sabido, até na memória se sustém a respiração. Sem olharem e as vistas baças, encharcadas e vermelhas de soluços. Foi-se o amor, ficaram lembranças assassinas para matar.
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Para memória futura: Realizou-se ontem, 23 de Junho de 2016, o referendo no Reino Unido que decidiu a saída do país da União Europeia – Brexit.

Valha-nos Santo Humor

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Que uma réstia de inteligência na tragédia estúpida. Abriram a janela e voaram os papéis. Depois abriram a porta e quase tudo se perdeu. Se lenços houvesse para este choro, da incansável de morte, secando os olhos em amparo. Se as palavras retornassem em gestos de mudar os dias. É tudo se nesta incerteza de certezas. Trágica e fatal morte. Haja riso, porque há loucuras tristes.
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Para memória futura: Realizou-se ontem, 23 de Junho de 2016, o referendo no Reino Unido que decidiu a saída do país da União Europeia – Brexit.

Feliz ano novo

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Entretanto são quase seis horas da tarde. Seria feliz que à meia-noite houvesse espumante e a bebedeira para a coragem. É Junho e os demónios estão à solta. O Verão arde sempre e a luz não é mais do que fogo. Como fugir e porquê ficar se o ano pode começar?

Rebentaria pólvora

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Tivesse pólvora e bala e pistola deixaria a tristeza. Em mim, fogo-de-artifício de festejo. Quanto ar se respira numa grande queda? Quais os venenos que curam? Tantas perguntas para uma dúvida. Se soubesse que a morte existe.

Fogo-de-artifício

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Fechar os olhos e respirar devagar até ao momento. Apagar o fogo. Cair porque o caminho é de descer. Ser terra.

segunda-feira, junho 20, 2016

Solstício

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Solstício de lua-cheia. Triste na escassa escuridão. Verão, minha melancolia.
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Os passos mudos numa época antiga. Silêncio por remorsos antigos.
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Lobisomem na curta noite espojado para esquecimento da dor.
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O triste na escassa escuridão. Remorsos antigos.
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Se luz que ilumina matasse a fera.

Flor de mar

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Se os beijos fossem flores quais seriam os que daria?
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A rosa tem rubor, seria de engano.
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Margaridas, malmequerem. Açucenas, ciúme.
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Tulipas como os lábios beijando-se.
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Se a cama fosse mar? Em vidência digo:
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Nós dois revoltos amando como se encrespado.
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Salgados e náufragos, por fim saciados.

De amor dorido

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O mar bate.
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A pedra morrendo de gasta por falso amor.
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Nota: Não consegui identificar o autor desta fotografia. Quem souber que me diga.

terça-feira, junho 14, 2016

Encadeados

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Telepaticamente, diante de mim. Está calor e vestes uma camisolita de algodão e mostras pele. Sonhando, Deus ordena à gravidade que te desça uma alça, vislumbro a curva do seio e sustenho o ar: talvez veja o mamilo.
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Custo a engolir e duvido de mim. Não sei se só desejo ou se pressinto. Não sei se sonho ou perante uma visão. Oiço-te em eco como estando num meio caminho. Acho que suo das mãos e levito.
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A pele tem o tom da tremura, do desejo impossível, da tarde infinita, do suor e dos beijos. Se nos perdêssemos até exauridos e nos reencontrássemos lado a lado e famintos pelo outro.
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Prometi mas transgrido, deitarei as cartas de tarot: a grande roda. Alguma magia tem de ser possível. Uma força terá de te acordar para que te deites comigo.
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Sonhando, um pavilhão aberto com cortinas brancas voando, a conversa de água, os aromas das frutas do Verão, sem horas, sem mundo. À noite, a abóbada é plena de estrelas – o maior espectáculo do mundo!
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Os olhos encadeados pelos estrelares, por vezes olhando-se. Neles vemos o que fizemos e as promessas. Ao amanhecer, as bocas voltarão ao sexo e antes do dia sentenciar completamente a noite morreremos nos braços.

Foram tardes

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Tarde de calor e só nós. Os pais a trabalhar e o Verão sem fim. A nudez que quase vi na praia pode ser tocada, não sei se perfumas a pele, se os mamilos beijam ou onde fica o limite e a hora de ir embora.

segunda-feira, junho 13, 2016

Carta

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Estou a morrer. Não o digo apenas porque um dia nasci, cada momento que passa é um a menos para o do passamento. Não digo para alarmar e muito menos para enganar. Estou a morrer, estou mesmo a morrer.
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A morte é banal. Não há nada mais natural do que esse dia. Podemos usar máquinas para substituírem o coração, os pulmões, o fígado, os rins e o cérebro, haverá sempre o momento em que o corpo se esgota.
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Mesmo inteligindo a morte ou só a percebendo, a dor da partida é uma possibilidade. Seja-se crente, agnóstico, ateu, descomprometido, distraído ou preguiçoso, a partida guarda sempre, pelo menos, uma dúvida. Se pensar já aleija frequentemente, saber da existência, da passagem ou das duas combinadas de forma diversa, chega a ser pungente.
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Há gente a quem a morte não assusta. Seja por leviandade, por certeza em algo maior, por certeza apenas que isto é só mesmo isto, algumas pessoas não tremem se pensarem que um dia irão para. Há, nestas situações, as que têm esperança, serão as felizes.
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Mas há as que não têm esperança. Há aquelas para quem a esperança é a esperança de não haver mais nada depois do corpo parar.
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Acredita-se em Deus de muitas maneiras e por variadas razões e as relações constroem-se individualmente – essas pessoas têm as suas conversas com ele, se as tiverem. Desacredita-se porque não se acredita ou porque a literatura é inconvincente ou o clero não se comporta convenientemente.
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Não sei bem em que sou igual ou diferente. Não sinto Deus, mas acredito porque me faz lógica. Como tantos que lhe impõem negócios ou ultimatos também apresento exigências. Serei surdo? Será surdo, não está para me aturar, não sabe que existo. Não tenho resposta sua, nem crítica, aplauso ou consolo.
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Em contrapartida, oiço-me e sinto-me, aturo-me vinte e quatro horas por dia. Nem mesmo dormindo tenho pousio. Se optar pela esquerda irei criticar-me se falhar, assim como se escolher a outra mão. Se acertar? Não poupo reprimendas ao lado que me poderia conduzir ao falhanço.
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O problema não é o debate, mas a dor. O desgaste vem de mim porque há dor, razão primeira do desacerto de quereres e responsabilizações íntimas. Respirar magoa quando a vontade é não existir.
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Repito que estou a morrer. O ar chega pesado. A luz e a escuridão são medonhas. O tempo é pastoso. Tudo é tédio e escravatura. A vida é incompreensão, insatisfação e castigo.
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Uma dor maior do que eu. É antes e depois de mim.
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É a dor de morrer existindo. É dela que vou morrendo.
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Por que não cessa? Por que não a travo? Tivesse a certeza que depois do corpo finar também eu me finarei, fazia já. Matava a morte para que não me matasse nesta lentidão amarga.
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Pedir a Deus? Peço. Peço-lhe para desexistir. Alguma coisa que não seja morrer.

domingo, junho 05, 2016

Desviar do túnel

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Hoje, a morte cumprimentou-me, encarnada de automóvel azul acelerando quando deveria abrandar. Eu, estupidamente, fiz que não a reconheci e desviei-me.

sexta-feira, junho 03, 2016

Marçagão

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Feio. Sou feio. Sou mesmo feio. Mesmo muito feio. Mesmo muito. Mesmo. Mesmo feio.
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Março, marçagão, de manhã gente e à tarde cão.
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Olha os olhos. Os olhos de mergulhar, areia movediça dos enganos. À volta está o medo, a rudeza, as rugas, o passado que não se esconde, as lembranças odiosas, as vergonhas de carácter, as canalhices adolescentes, as senvergonhices adultas, as filhadaputices sem perdão, aquela noite em que cheirei e vi que era verdade o que dizia sobre a negritude da branca.
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Não importa se fora zetário se a consciência era adulta e apenas ensurdeci por facilidade. Porque não importa quando a dor. Não, não foi sem querer nem sem saber. Não importa, sou culpado.
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Perdoaste? Fizeste mal! Porque sou feio. Bem te disseram, bem lhe disseram que eu – mentirosos, videntes e verdadeiros.
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A imundice, asquerosidade, vampirismo, vómito e insónias não se escondem nem Basil Hallward me pintou.
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Antes fosse amoral. Antes inconsciente. Antes amnésico.
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Mas o mal que não fiz, não fiz! Desse não me posso arrepender nem acusar.
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Como marçagão, cara de cão.

quarta-feira, junho 01, 2016

Florbela resolveu

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A imperfeição da perfeição é ser perfeita, mas porque do homem, sempre frágil e mutável, porque a verdade só a divina. A nós resta a contemplação perante o supremo e a inveja diante do que outros.
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Pensei e prometi refazer. Não melhor, mas mudado. Contudo, diante do cubo não se quer o paralelepípedo e a esfera só a Deus. Olhei e li depressa e vagarosamente, displicente e medroso, e animado e derrotado.
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Não serei assim nem diferente, porque Florbela e João. Roubou-me antes de eu ter. Não acrescento e não retiro, os dedos estão sujos e as letras são flor da laranjeira.
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Escreveu Florbela Espanca:
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SER POETA
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Ser Poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos os esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma e sangue e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!

Assunto infindável

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Hoje só a terra seria leve ao corpo. Se o sono fosse compacto ou se não dormisse nem estivesse acordado. Se Deus deixasse que a vida acabasse e nunca desse a eternidade.
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Morrer faria a vida tão simples e haveria um sorriso no final.

Sabor de incerteza

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A morte não é a morte. A que falo é um bocado de coisa densa, compacta donde não se escapa.  Nem a luz invade, nem a luz se evade. Tenho essa morte dentro e tenho-a em redor, como se fosse a caixa que me guardará o corpo. Nem a tristeza é triste, só desesperança. Que alívio se houvesse um fim, mas desexistir não se pode. O vento compõe a paisagem, despenteia e seca as lágrimas, mas não leva a morte, que me corrompe vorazamente. Qual a dor de bater com a testa na calçada ou como será pendular com o sopro ou a que saberá o vómito infrutífero e incompetente contra o veneno? Matava-me já se soubesse que a morte existe. Mas morte só a que me consome.